segunda-feira, 21 de fevereiro de 2022

Carlos Pereira: A fantasia do bom governante

O Estado de S. Paulo

Lula não soube lidar com o Legislativo no passado e dá sinais de que não aprendeu a lição

Ao contrário do que muitos acreditam, a boa relação com o Legislativo não é determinada por habilidades pessoais do presidente, mas por suas escolhas de como montar e gerenciar coalizões. Mesmo presidentes que desfrutam de maiorias não serão bem-sucedidos no Legislativo se tais coalizões forem incongruentes com as preferências do Congresso.

Quanto mais a coalizão do presidente espelhar as preferências dos legisladores, mais fácil e mais barato seria governar. Por outro lado, quanto maior a diferença de preferências entre a coalizão e o Congresso, mais difícil e cara seria a gestão da coalizão e maior a probabilidade de forças minoritárias do Legislativo obstaculizarem o governo. A distância de preferências entre a coalizão e o Congresso é, portanto, o fator-chave para explicar tanto o sucesso legislativo do presidente, como também o custo de governabilidade. Há uma narrativa de que Lula, quando presidente, soube negociar bem com os parlamentares; mas dados evidenciam o contrário.

Em pesquisa com Frederico Bertholini e Marcus Melo, mostramos que embora exista grande variação no grau de (in)congruência entre a coalizão governista e o Congresso, o presidente que montou coalizões mais distantes do Legislativo foi Lula. Como consequência, o custo de governabilidade de Lula (medido por um índice que agrega o número de ministérios, seus gastos orçamentários e execução das emendas parlamentares) foi duas vezes e meia superior ao de FHC e quase seis vezes maior do que o de Temer (média de 90,6 pontos). Além de incongruentes, as coalizões de Lula foram monopolistas, na medida em que o PT foi o principal destinatário desses recursos, com 70%, enquanto seus parceiros receberam apenas 30%.

No extremo oposto, FHC montou coalizões muito próximas do Congresso. Como resultado, teve um custo de governabilidade baixo, com média de 36 pontos (40% gastos com seu próprio partido e 60% com os partidos aliados). Temer, que também montou uma coalizão congruente com o Congresso, enfrentou custo de governabilidade ainda menor (média de 15.5 pontos), sendo 70% com aliados e apenas 30% com seu próprio partido.

A inflação nos custos de governabilidade de Lula decorreu, portanto, de suas más escolhas. Montou coalizões grandes, heterogêneas, desproporcionais e, acima de tudo, incongruentes em relação às preferências do Congresso. Pela forma hegemonista como ele vem negociando com o PSB uma federação partidária, impondo candidaturas próprias do PT a governos estaduais, parece que não houve aprendizado.

Um comentário:

ADEMAR AMANCIO disse...

Querendo ensinar o padre nosso ao vigário.