Folha de S. Paulo
É contraintuitivo que Lula apresente-se
como candidato antirreforma
Já me referi aqui na coluna à crítica
implacável de Eça de Queiroz n’"As Farpas" ao reformista retórico.
Eça escarneceu de uma infinidade de subtipos: reformeiros, reforminhas,
reformecos, reformaricas, reformânticos, etc. Mas há um subtipo que Eça
apelidou de reformafóbico, que Lula está encarnando à perfeição: "Quem é que disse que o Brasil precisava das reformas?",
perguntou, referindo-se à reforma trabalhista, da Previdência e ao teto de
gasto.
Eça mirava no elemento retórico de reformas meramente discursivas,
ritualísticas. Elas servem, afirmou, para "um ministério fingir que
administra, iludir a nação ingênua, imitar a iniciativa fecunda dos
reformadores ‘lá de fora’ , aparentar zelo pelo bem da pátria, justificar a sua
permanência no poder, fornecer alimento à oratória constitucional".
Eça restringiu-se às reformas como discurso e demagogia. Lula a reformas
implementadas. Falar é barato. Credibilidade e reputação é o que importa.
Críticas a um programa de reformas podem
mirar dois aspectos: a) sua incompletude ou seu abandono. Este tem sido, por
exemplo, o tom da crítica a Paulo Guedes por analistas variados. Aqui a
contradição é o abandono de pautas (privatização) ou do compromisso fiscal
anunciado e sua conversão em populismo fiscal aberto (PEC dos precatórios,
orçamento secreto); b) o estelionato eleitoral: a contradição entre discurso e
prática desde o início do governo.
Lula e Dilma ilustram de forma distinta o problema. A Carta aos Brasileiros
(2002) é uma declaração ex ante de manutenção de políticas que eram objeto de
intensa crítica pelo PT antes das eleições. No entanto, as reformas que se
seguiram claramente são inconsistentes com o programa apresentado na campanha.
Dilma dobrou a aposta.
Em democracias maduras, o ‘ciclo político de negócios’ tem pouca
importância como concluíram Alesina e Roubini (1989). Mas na América
Latina, Stokes mostrou que há reversão de promessas de campanha em 1/3 das eleições que
examinou. Por que alguns candidatos não revelam ex ante seus programas
efetivos?
A crítica de Lula é contraintuitiva: afinal por que se apresenta como candidato
antirreforma, subscrevendo críticas controversas à esquerda do debate informado
sobre política econômica? Por que se desloca em críticas maximalistas e não se
move ao centro? Se não se tratar de estelionato eleitoral, estaremos nos
deparando com um cenário ainda mais controverso: a reversão de privatizações e
reformas críticas. Existe um precedente na Argentina, sob Cristina e Nestor
Kirchner, e que envolveu a estatal de Petróleo (YPF), os Correios e a
Previdência Social. Não é precedente auspicioso.
Um comentário:
O PT quer reformar do seu jeito,á esquerda.Apesar que a esquerda clássica gosta de revolução e não de reforma.
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