Folha de S. Paulo
Confiante no poder dos pastores, Bolsonaro
não liga para o azar nem para a Educação
A cara de espanto do mito foi qualquer
nota. Era março de 2020, quando a pandemia começava a mudar o mundo, e ele não
estava nem aí, negando a gravidade da situação em conversa com a seita em
frente ao Alvorada. Eis que um imigrante haitiano começou a falar: "Bolsonaro,
acabou. Você não é presidente mais. Precisa desistir. Você está espalhando
o vírus e vai matar os brasileiros".
Esta última era uma profecia fácil. Mas o jeito de Bolsonaro se comportar —incomodado, olhos baixos, mãos entrelaçadas na cintura— suscitou a esperança entre seus adversários de que aquele homem fosse o mensageiro de uma maldição às avessas, a qual impedisse o destino trágico do país: fome, inflação, desemprego, destruição ambiental, aparelhamento das instituições, orçamento secreto, corrupção. Sim, corrupção, cada vez mais escancarada.
Dois anos depois, ninguém sabe onde anda ou
que fim levou o haitiano, e o presidente pode se reeleger. Dono de uma
confiança suicida, Bolsonaro continua dando chance ao azar. Ao receber a Medalha
do Mérito Indigenista, vestiu
um cocar azul. O folclore político ensina que cocar dá azar, sobretudo se o
candidato desrespeita o índio. Se a ave que cedeu as penas tiver morrido, o
estrago é ainda maior. Na lista de quem usou o adorno e perdeu nas urnas estão
Juarez Távora e Mário Andreazza. Tancredo ganhou, mas não levou. Ulisses
Guimarães caiu em depressão. Sarney acatou a superstição, ao contrário de Lula
e Dilma.
Bolsonaro é reincidente. Por duas vezes, em
2021, tirou fotos com cocares na cabeça, e sempre defendendo o garimpo em
terras indígenas. Eu não me espantaria se ele desfilasse no meio da rapaziada
do Cacique de Ramos no Carnaval de abril.
Contra vodus e pajés, o presidente pede que
pastores lobistas orem pela graça da reeleição. São os mesmos que, sem cargo
público, mandam na liberação de recursos do MEC e, em troca, exigem um quilo de
ouro.
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