sexta-feira, 11 de março de 2022

Claudia Safatle: Governo quer conter impacto da guerra sobre o diesel

Valor Econômico

Redução a zero da alíquota de PIS e Cofins sobre o combustível custará ao país R$ 13,5 bilhões

Uma decisão está tomada: assim que o projeto de lei complementar nº 11, aprovado ontem no Senado, for submetido à Câmara e sancionado pelo presidente Bolsonaro, o governo anunciará a redução a zero do PIS e da Cofins cobrado sobre o diesel. A medida valerá até o fim do ano e custará aos cofres públicos cerca de R$ 13,5 bilhões. São arrecadados com esse tributo cerca de R$ 18 bilhões por ano. Se tudo der certo, a redução dos impostos sobre o diesel valerá por nove meses e terá um impacto sobre o preço final do produto de algo entre R$ 0,30 e R$ 0,50 por litro.

Essa medida não afeta a lei do teto do gasto público e é, por enquanto, a única inciativa pronta do governo para enfrentar a substancial elevação de preços do óleo no mercado internacional, em decorrência da guerra da Ucrânia, país invadido pela Rússia no dia 24 de fevereiro.

A decisão da Petrobras de anunciar, ontem, o reajuste de 18,7% nos preços da gasolina e de 24,9% nos do diesel, aguçou o senso de urgência tanto no Senado quanto no Executivo. Passou-se da conversa para votação de duas propostas. Ambas foram aprovadas.

O projeto de lei complementar (PLP) nº 11 trata de uniformizar o ICMS, que hoje tem alíquotas diversas conforme o Estado. Caberia aos governos estaduais chegar a uma alíquota comum - que hoje varia de 25% (no Acre) sobre a gasolina a 34% (no Rio de Janeiro). A decisão seria avalizada até o fim deste ano pelo Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), órgão que reúne os secretários de Fazenda estaduais. As alíquotas vão poder variar conforme o produto e, hoje, ela é menor para o diesel e mais elevada para a gasolina e para o etanol.

O ICMS passaria a ser um valor (“ad rem”) cobrado sobre o litro do combustível, e não mais um percentual sobre o valor final da compra (“ad valorem”). Além disso, o cálculo do imposto seria feito uma única vez, na refinaria ou na importação do combustível, eliminando-se o efeito cascata que existe hoje, quando o tributo é cobrado ao fim da cadeia de distribuição.

O governo quer ver o PLP aprovado, ao contrário de uma outra proposta que também é parte “do pacote dos combustíveis”, o projeto de lei 1.472/2021, que altera a política de preço da Petrobras e cria uma conta de estabilização de preços dos derivados de petróleo.

Este, cujo relator é o mesmo para ambos os projetos, o senador Jean Paul Prates (PT-RN), deverá voltar para a Câmara já com o destino certo: a gaveta do presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL). A rigor, Lira pode simplesmente enviar o PL 1.472 para as comissões, onde ele ficará parado.

Outras ideias estavam sendo consideradas pela área econômica do governo e, dentre elas, conta uma que mereceria ser melhor avaliada. Trata-se de usar as receitas que o governo federal recebe em tempos de aumento dos preços do óleo no mercado internacional - tais como os royalties, participações especiais, tributação do lucro da Petrobras e dividendos - na redução do preço do diesel, que tem um impacto pior, indiretamente, do que a variação dos preços da gasolina na inflação.

O governo federal captura cerca de um terço dessas receitas. Elas correspondem a valores suficientes para financiar uma expressiva suavização do impacto do aumento do preço do petróleo no mercado externo sobre o diesel, sustentam técnicos que estão debruçados sobre contas para checar se a medida fica em pé.

Para financiar esse subsídio será preciso abrir um crédito extraordinário e fazer, ao mesmo tempo, um trabalho de ourivesaria orçamentária e, talvez, desvincular o excesso de receitas ou, ainda, contingenciar o recurso vinculado para liberar outras receitas. Um exemplo de dinheiro vinculado é uma parcela dos royalties que é destinada à Marinha.

Há quem defenda o uso de um decreto de calamidade para livrar o governo de ter que cumprir a lei do teto do gasto público sob o argumento de que nada é mais calamitoso do que uma guerra.

Há ferramentas institucionais disponíveis que permitem que se amorteça, como país produtor de petróleo, o impacto dos preços internacionais sobre o diesel no mercado doméstico.

Afinal o petróleo é brasileiro.

Número equivocado

Um leitor chamou a atenção para um equívoco do ex-ministro da Fazenda e atual secretário de Fazenda e do Planejamento do Estado de São Paulo, Henrique Meirelles. Na coluna publicada no último dia 4, o ex-ministro contou que quando assumiu a presidência do Banco Central, em 2003, encontrou o Brasil quebrado. O país tinha uma dívida de US$ 30 bilhões com o Fundo Monetário Internacional (FMI) e reservas cambiais de apenas US$ 15 bilhões, segundo ele.

Os números corretos são: as reservas cambiais somavam US$ 38 bilhões no fim da gestão do então presidente Fernando Henrique Cardoso, cifra superior, portanto, ao empréstimo do FMI, de US$ 30 bilhões, dos quais o Banco Central havia sacado duas parcelas de US$ 6 bilhões. A primeira parcela foi sacada no segundo trimestre de 2002, e a segunda, no fim do mesmo ano. O restante da linha de crédito do Fundo Monetário ficou à disposição do governo do então presidente Lula, que assumiu no dia 1º de janeiro de 2003.

Aliás, o acordo com o FMI foi renovado pela equipe de FHC exatamente para dar um conforto ao governo que estava chegando, que teria como pagar parcelas vincendas da dívida externa, no início do mandato, com o empréstimo do Fundo. É importante que se diga que aquela foi uma transição civilizada de um governo do PSDB para um governo do PT.

 

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