O Globo
A guinada no discurso público de Jair
Bolsonaro sobre o preço dos combustíveis mostra a dificuldade, até aqui, de o
presidente conseguir equacionar este que é claramente o assunto que mais lhe
tira o sono hoje, pelo potencial de estrago eleitoral que tem.
Nos últimos dias, as conversas
interministeriais, com o mercado e com a direção da Petrobras tinham sobre a
mesa algumas alternativas, todas heterodoxas e fora do receituário liberal
clássico, para conter a alta da gasolina, do diesel e do gás de cozinha.
Enquanto isso, esses preços vinham sendo represados sem anúncio formal, desde janeiro no caso dos combustíveis, há 152 dias no do gás. Até que a Petrobras acabou abrindo as comportas, e as reações a uma alta significativa dos três itens foram de espanto e corre-corre em busca, de novo, de uma solução pretensamente simples para um problema cada vez mais complexo, em virtude da imprevisibilidade da guerra na Ucrânia.
Bolsonaro se mostrou atordoado com a
impossibilidade de fazer o que gostaria: uma canetada que baixasse os preços
por decreto. Amuado, passou a adotar o discurso oposto àquele em tom de “eu
faço, eu aconteço” que vinha empregando: agora diz que não define preço, não
decide “nada, não”.
O Bolsonaro humilde, resignado, contrasta
com aquele que, ainda na segunda-feira, dizia que a política que estabeleceu a
paridade com a variação internacional dos preços do petróleo foi errada e
deveria mudar.
Não que a versão “eu mando e acabou” não
possa estar de volta amanhã no cercadinho do Alvorada. Como não tem
profundidade técnica para compreender todas as implicações da composição de
preços dos combustíveis, o mercado igualmente complexo e globalmente interligado
em que a Petrobras está inserida, e as consequências que soluções artificiais e
não sustentáveis do ponto de vista fiscal podem ter no futuro, ele pode
facilmente voltar ao desespero de resolver esse pepino eleitoral, ainda mais
diante das imagens, que proliferarão, de pessoas indo encher o tanque e
encontrando os preços ainda mais nas alturas.
O bazar das saídas da manga do colete para
os preços certamente não se esgotou com a votação, pelo Senado, do projeto que
unifica o critério de cobrança do ICMS pelos estados e o transforma numa
parcela fixa, e com o outro que cria uma conta de estabilização dos preços.
Integrantes do governo dizem que a ideia de
congelar os preços até o fim da guerra está descartada — como, aliás, o
superaumento mostra. Mesmo alguma forma de subsídio perdeu força, mas se deixou
uma janela aberta caso a guerra perdure e escale em gravidade ou extensão para
outros países.
A caixa de ferramentas parece vazia,
portanto, e o incentivo a usar as marretas e chaves de fenda disponíveis é
mínimo, embora a ansiedade de Bolsonaro em sair dando martelada em pregos seja
grande.
A Petrobras e sua política de preços virou
um dos temas de mais difícil equação na campanha. Enquanto Bolsonaro se
inquieta, com medo de que a justificada revolta dos consumidores caia no seu
colo na urna, os demais candidatos também não parecem seguros quanto ao que
propor para substituir a paridade internacional.
Lula e Ciro Gomes adotam um discurso muito
semelhante: criticar a privatização de subsidiárias da Petrobras, como a BR
Distribuidora, e os altos salários e a política de distribuição de dividendos
da empresa.
Sergio Moro pratica nesse campo aquilo que
tem sido a tônica de sua campanha: rivalizar com Lula. Ontem, em vez de focar
nos preços, questionou o petista nas redes sociais para dizer que, não fosse a
Lava-Jato, a empresa poderia ter sido engolida pela corrupção.
Ninguém apresentou até aqui uma alternativa
à atual política, cotejada com o impacto que teria sobre a empresa e as contas
públicas.
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