O Globo
A caravana dos artistas não comoveu os
profissionais do Congresso. Na quarta-feira, uma trupe liderada por Caetano
Veloso percorreu gabinetes e lotou a Esplanada num ato pela Amazônia. No
plenário, os deputados ignoraram os visitantes ilustres e avançaram com o
projeto que libera a mineração em terras indígenas.
O texto pró-garimpo passará a tramitar em
regime de urgência. Pelos planos de Arthur Lira, deve ir a votação definitiva
em abril, às vésperas do Dia do Índio. Parece provocação — e talvez seja mesmo.
O lobby da devastação perdeu o medo da
opinião pública. Com a vitória de Jair Bolsonaro, madeireiros, garimpeiros
ilegais e grileiros de terra já haviam conquistado as chaves do Planalto. Agora
eles também contam com a cumplicidade e o apoio do presidente da Câmara.
Fazendeiro em Alagoas, Lira já comandou a aprovação de ao menos quatro projetos que criam riscos graves ao meio ambiente. “Em todos os casos, atropelou-se o processo legislativo com regimes de urgência e votações sem debate, baseadas em mentiras”, critica o advogado Mauricio Guetta, professor de Direito Ambiental na PUC-Rio.
O truque foi usado para afrouxar as regras
de licenciamento. Os governistas alegaram que o texto geraria mais de R$ 300
bilhões em investimentos, embora dados do TCU mostrem que as exigências
ambientais são responsáveis por apenas 1% das obras paralisadas no país.
A Câmara também ignorou os fatos ao abrir
caminho para legalizar a grilagem de terras. Segundo a turma de Lira, o texto
ajudaria a identificar e punir infratores. Na prática, dá anistia a quem
invadiu e desmatou áreas públicas ilegalmente até o fim de 2014.
Agora a esperteza se repete no atropelo
para liberar o garimpo em terras indígenas. O governo tenta usar a escassez de
fertilizantes como pretexto, embora as maiores reservas de potássio estejam
fora das áreas demarcadas.
A proximidade das urnas aumentou a pressa
dos ruralistas. A ordem é aprovar tudo o que for possível em 2022, já que as
eleições podem mudar a balança de poder em Brasília. O clima de vai ou racha
espanta observadores experientes como Suely Vaz, do Observatório do Clima.
“Parece que estão no Baile da Ilha Fiscal, tentando aproveitar os últimos momentos
de festa”, resume.
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