quarta-feira, 13 de abril de 2022

Nilson Teixeira: Janela partidária favoreceu Bolsonaro

Valor Econômico

Atenuação da pandemia e transferência de recursos para os pobres melhoram a imagem do presidente

O núcleo partidário da candidatura do presidente Bolsonaro à reeleição - PL, Progressistas, Republicanos, PSC e PTB -, com 187 deputados federais, tem uma representação na Câmara dos Deputados muito maior do que a da esquerda e da centro-esquerda - PV, Rede, PSB, PDT, PT, PC do B e PSOL, com 117 representantes. Ademais, Patriota, Novo, Avante, Podemos, PROS, União Brasil, PSD, Solidariedade, MDB, PSDB e Cidadania, com votações altas a favor das propostas do governo Bolsonaro, contam com 209 deputados.

A construção por Bolsonaro de uma ampla base de apoio no Congresso, mantidas as atuais representações, seria muito mais simples do que para Lula. Bastaria atrair o apoio integral dos partidos do seu núcleo de apoio, 85% dos deputados do Patriota, Novo, Avante, Podemos, PROS, União Brasil, PSD e Solidariedade e 65% dos representantes do MDB, PSDB e Cidadania para Bolsonaro obter uma maioria próxima a 350 votos, mais do que o suficiente para aprovar emendas à Constituição.

O forte crescimento dos partidos que mais suportam o presidente após a janela partidária contribuirá para que as intenções de voto de Bolsonaro aumentem e a sua rejeição diminua nos próximos meses. A atenuação da pandemia e a maior transferência de recursos para a população pobre e a classe média também serão importantes para essa melhoria.

O governo anunciou, por exemplo, a duplicação do Auxílio Brasil para R$ 400, a concessão do vale gás de R$ 52, o saque de até R$ 1 mil do FGTS, a antecipação do 13º salário para os aposentados e a redução de IPI e de tributos sobre combustíveis. Além disso, há diversas medidas em discussão no Congresso e no Executivo, como: gratuidade de transporte público para idosos, aumento do piso salarial para enfermagem, concessão de quinquênios para o Judiciário e reajustes salariais para servidores federais.

Apesar dessa tendência, a vitória de Bolsonaro nas eleições de 2022 não é o cenário mais realista no momento:

A manutenção após as eleições da favorável distribuição de partidos obtida com a janela partidária é improvável, ainda mais com a cláusula de barreira. Os partidos precisarão de mais de 2% dos votos válidos ou eleger ao menos 11 deputados federais em pelo menos nove estados nas eleições de 2022 para ter acesso, entre outros direitos, ao tempo de propaganda eleitoral, aos recursos do fundo partidário e às posições na mesa diretora e em comissões. A dificuldade de alcançar essas metas pode contribuir para o recuo do número de partidos com representação plena no Congresso para cerca de 10 agremiações a partir de 2023.

Mesmo diminuindo nos próximos meses frente aos atuais 46% (Datafolha - 7/4/ 2022), a avaliação ruim e péssima de Bolsonaro não diminuirá para os 25% ou menos de FHC, Lula ou Dilma quando da disputa pela reeleição. Do mesmo modo, apesar de ter melhorado frente aos 60% de dezembro (Datafolha - 16/12/2021), o percentual dos participantes que não confia nas declarações de Bolsonaro de 53% (Datafolha - 23/3/2022) não retornará para os 38% do início da pandemia (Datafolha - 27/4/2021).

Como dificilmente obterá uma votação próxima de 46% do 1º turno das eleições de 2018, Bolsonaro não terá o mesmo apoio na campanha eleitoral de senadores, deputados federais e governadores como naquela época. O afastamento em relação à campanha de Bolsonaro por parte de candidatos aos governos do Nordeste, como ACM Neto (BA), Miguel Coelho (PE), Rodrigo Cunha (AL) e Silvio Mendes (PI), por exemplo, atrapalha a recuperação das intenções de voto do presidente.

Os resultados econômicos permanecerão desfavoráveis até outubro - inflação próxima a 8%, taxa de desemprego acima de 10% e crescimento do PIB inferior a 1% em 2022, o que dificultará a melhoria da avaliação do presidente para próximo à da eleição de 2018.

Por outro lado, uma aliança da esquerda e da centro-esquerda com todos os representantes do Patriota, Novo, Avante, Podemos, PROS, União Brasil, PSD, Solidariedade, MDB, PSDB e Cidadania, o que é uma hipótese muito improvável, totalizaria 326 deputados. A aprovação de emendas à Constituição exigiria o impensável apoio de 95% de todos os deputados dessa aliança para não depender da oposição. Essa fragilidade será atenuada pelo provável aumento da representação do PT e de partidos de esquerda e de centro-esquerda em função de a candidatura presidencial do PT ser mais competitiva e a rejeição a Bolsonaro ser maior do que quatro anos atrás.

Na eventualidade de vitória de Lula, a formação de uma base de apoio de 400 deputados federais exigiria a atração de partidos de direita e de centro-direita, inclusive alguns que fazem parte do núcleo do atual governo. Não seria fácil, mas também não parece uma missão impossível. Muitos dos partidos que hoje apoiam Bolsonaro participariam sem constrangimento de um governo Lula.

É fácil desenhar esse governo no papel. A aliança defenderia um programa moderado sem extremos na pauta econômica e na de costumes, bem como sem as medidas controversas do seu grupo mais à esquerda. A apresentação de projetos de combate à pobreza e de melhoria das condições de vida dos mais pobres é bastante factível sem a ampliação dos desequilíbrios macroeconômicos. Uma forte expansão de programas sociais de forma sustentável exigiria, porém, que os congressistas fossem convencidos da necessidade de contrapartida, incluindo a redução de renúncias tributárias, para garantir a estabilidade ou mesmo o recuo da dívida pública.

Tirar esse arcabouço do papel, por outro lado, é mais complicado, pois exige que Lula seja convencido de que é preciso promover mudanças difíceis. Por ora, não parece que a maioria dos líderes partidários entendam essa necessidade. Apesar de haver filiados ao Partido dos Trabalhadores conscientes de que sinalizar um projeto que resulte em desequilíbrio fiscal por um período prolongado agrega riscos muito negativos, há grupos que julgam ser possível elevar os gastos e manter um elevado déficit primário por um longo período.

Apesar de não ser fácil convencer a maioria sobre o caminho certo a trilhar, é preciso tentar.

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