O Globo
Fachin, fisicamente o mais frágil dos
ministros do STF, mostrou que fardas, botas, tanques e fuzis não o amedrontam
A mensagem do ministro Edson Fachin não podia
ser mais clara e direta, “quem trata de eleições no Brasil são as forças
desarmadas”. A Justiça Eleitoral não abrirá mão de suas obrigações
constitucionais, disse o presidente do TSE. E para isso existe uma única e objetiva
razão. Tudo está sob controle: a máquina funciona, o eleitor se expressa, o
eleito assume, e a democracia se revigora. O resto é conversa de malucos e
golpistas. O discurso de Fachin será balizador das eleições deste ano. E a sua
imagem, no momento da fala, com seus cabelos brancos e seu sóbrio terno preto,
é a imagem civil. Ele representa as forças civis que vão administrar as
eleições e proclamar seus resultados em outubro.
Escrevi aqui na semana passada
que o golpe imaginado por Jair Bolsonaro vai ser derrotado pela sociedade civil
desarmada que irá às urnas em outubro eleger presidente, governadores,
senadores e deputados federais e estaduais. Sem armas, apenas com o voto, os
brasileiros terão o poder de despachar para a casa, e talvez para a cadeia, os
golpistas que se formam em torno do presidente. Barulho e bagunça devem ocorrer
de qualquer modo, mas não terão vigor nem apoio suficiente para sublevarem a
nação.
A hora é civil, expressou o
ministro Fachin, que logo foi secundado pelo presidente do Senado, Rodrigo
Pacheco. Num pronunciamento na Bahia, Pacheco disse que “é preciso fortalecer
as instituições e a democracia de atentados nocivos”. Falava diretamente ao
presidente Jair Bolsonaro e aos generais que o cercam e alimentam suas
alucinações no Palácio do Planalto. Segundo Gerson Camarotti, comentarista da
GloboNews, num jantar na noite de quinta com ministros do Supremo, Pacheco
disse que não deixará o STF isolado. O que isso significa? Significa que ele
vai se levantar sempre que o tribunal for ameaçado.
Mesmo o liso Arthur Lira deu declarações esta semana defendendo as urnas eletrônicas e o processo eleitoral brasileiro. Sabe que se a onda antiurnas de Bolsonaro prosperasse, ele e sua turma também perderiam.
Além de civil, a hora é de
coragem. Cara feia não pode assustar as instituições e os cidadãos livres do
país. Edson Fachin, fisicamente o mais frágil dos ministros do STF, mostrou que
fardas, botas, tanques e fuzis não o amedrontam. “A Justiça Eleitoral jamais
estará aberta a se dobrar a quem quer que seja para tomar as rédeas do processo
eleitoral (...) ninguém nem nada interferirá”, disse o ministro, com sua voz
calma, quase fina, mas em tom resoluto e determinado.
Embora tenha salientado
que não manda recados, obviamente Fachin falou como se estivesse olhando nos
olhos de Bolsonaro e da sua entourage militar. E sua oração de grandeza
histórica também serviu para colocar um freio na sanha golpista do presidente,
pelo menos temporariamente. No mesmo dia, Bolsonaro comentou o pronunciamento
do ministro. E, claro, mentiu mais uma vez. Disse que “ninguém quer atacar as
urnas eletrônicas e a democracia”. Como se trata de Bolsonaro, este vaivém já
nem merece atenção. O fato é que o pândego disse que todos os seus ataques às
urnas e ao processo eleitoral nunca aconteceram.
A fala desassombrada e definitiva
de Edson Fachin deve servir de exemplo para que outros setores da sociedade
civil também se manifestem em favor da democracia. O Brasil pertence a todos os
brasileiros e não apenas ao rei e seus amigos destrambelhados. As trincheiras
covardes escavadas em muitos balcões de negócios devem ser soterradas para no
lugar fincar bandeiras que saúdem a legalidade e o poder civil.
Ninguém confia em ninguém
Há um sentimento que beira o pavor
circulando nos corredores e salas do Palácio do Planalto. Trata-se do medo de
ser denunciado por qualquer
ato, gesto ou encontro que possa parecer traição aos olhos
de Jair Bolsonaro. As agendas mais sensíveis, que tenham potencial de parecer
“estranhas” ao presidente, são marcadas em horário fora do expediente e em
local “neutro”. Segundo servidores que trabalham no palácio, a paranoia é tão
grande que mesmo ministros estão de orelha em pé. Ninguém confia em ninguém,
nem nas secretárias mais fiéis.
Mais um
Com a demissão do almirante Bento
Albuquerque do Ministério de Minas e Energia, completa-se a primeira dúzia de
oficiais superiores defenestrados por Bolsonaro do governo. Muitos com alto grau de humilhação, como
Rêgo Barros, Santos Cruz, Fernando Azevedo e Lima, Silva e Luna e o próprio
Bento. Aliás, como ficam os generais, quase todos de estatistas e
nacionalistas, com o novo ministro, o Adolfo Sachsida (uma espécie de Weintraub
iletrado), que no seu primeiro discurso anunciou desejo de privatizar a
Petrobras?
Notas militares
Pescado nas redes, de Marcia Zoé Ramos:
“Bombeiro que dirigia uma BMW atira em atendente de lanchonete; delegada tem R$
2 milhões apreendidos em casa; militar diz que vai arrebentar aluno de ensino
médio por causa de protesto; PMs
com 77 quilos de ouro são presos; assédio sexual
denunciado em escola da Aeronáutica. Tudo isso é notícia fresquinha. Agora,
imaginem se essa turma consegue dar um golpe”.
Mais deputado
A divulgação da lista de parlamentares que
distribuíram recursos do orçamento secreto revela que há alguns deputados e
senadores mais deputados e senadores que outros. Pelo menos no que diz
respeito ao
acesso a dinheiro público. Os graúdos nadaram de braçada
na piscina de verbas federais. O presidente da Câmara, Arthur Lira,
disponibilizou a aliados e parentes R$ 357 milhões. O relator do orçamento,
senador Márcio Bittar, repassou R$ 460 milhões, a senadora Eliane Nogueira, mãe
e suplente do ministro Ciro Nogueira, distribuiu R$ 399 milhões. Já para a
deputada Aline Sleutjes (PSL-PR) coube R$ 250 mil e aos deputados Marcelo Aro
(PP-MG) e Professor Alcides (PP-GO) restaram R$ 300 mil para cada um. Alguma
surpresa?
Fé inabalável 1
Uma das explicações da turma do João Doria
para seu fraco desempenho nas pesquisas eleitorais é a ausência do debate
político nesta fase da pré-campanha. Hoje, segundo assessores do ex-governador,
a polêmica sobre o hambúrguer de
costela no ambiente digital é três vezes maior do que a sucessão presidencial.
Enquanto a eleição mobiliza 4% do conteúdo disponível online, o hambúrguer de
costela chegou a movimentar 12%. Isso vai mudar, dizem, quando a campanha
começar para valer, lá pelo final de agosto. Os assessores dea Doria apostam que
ele vai para o segundo turno no lugar de Bolsonaro. Será? Não sei, mas agora
não parece.
Fé inabalável 2
A entourage do Doria tem um bom argumento
para sustentar sua fé inabalável numa reviravolta eleitoral. São exemplos históricos:
Bolsonaro ganhou a eleição nos últimos 35 dias de campanha; Trump passou
Hillary a menos de duas semanas do pleito; o Brexit se viabilizou na véspera do
plebiscito; e o próprio Doria só se consolidou em SP na reta final. Esqueceram
de dizer que estes não eram lanterninhas dos processos eleitorais de que
participaram.
Fim do teto
Lula disse numa reunião com reitores de
universidades federais que no seu governo não haverá mais teto de gastos. Por
ora é só um sonho do candidato. Se for eleito e quiser cumprir sua promessa,
terá de passar uma emenda constitucional para derrubar a regra. Neste caso,
precisará do apoio do Centrão, que não é difícil de obter. E então será moleza,
porque se tem uma coisa que esta
turma gosta é de gastar, gastar sem limite dinheiro
público.
A estética da luta
Vale a pena prestigiar “A estética da luta”, documentário produzido pela Approach e dirigido por Guillermo Planel que conta a emocionante história da Organização Não Governamental Rio de Paz. Em 15 anos de atividade, a ONG realizou mais de 50 ações de protesto contra a violência no Rio e em outros estados do país. Todas as atividades são impactantes porque trabalham com símbolos visuais, duros e realistas. A mais conhecida delas é a das cruzes e covas rasas na praia de Copacabana em homenagem aos mortos pela pandemia. As cruzes foram derrubadas por um bolsonarista radical e imediatamente reerguidas pelo pai de um jovem de 25 anos que morreu de Covid. O bem venceu o mal.
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