Dentro do trem, a minha figura envolvida em lágrimas e saudades.
Passada a parte mais crucial da pandemia,
talvez tenha sido esse Dia das Mães o que apresentou maior mobilização das
famílias, no deslocamento para outras localidades – estados e municípios – para
o reencontro das famílias para festejar as mães, revê-las, presenteá-las e
melhor que tudo: receber o carinho, o colo e, mais que isso, saborear a comida
de mãe.
O comércio se manifestou com a expectativa
de incremento de 30% nas vendas, enquanto bares e restaurantes estiveram com
reservas lotadas durante a semana inteira.
Contribuiu também para essa movimentação a
mudança nas regras de prevenção contra a Covid-19. O controle decorrente da
vacinação em massa potencializou na população a vontade de sair, circular nos
espaços do comercio, entretenimento como uma forma de curtir a liberdade do ir
e vir. Mas não se pode esquecer de que o novo coronavírus tirou a vida de mais
de 650 mil pessoas no Brasil inteiro e continua fazendo vítimas.
Fiquei curiosa ao saber sobre a situação
das mães no Brasil, já que se confunde com a situação das mulheres de modo
geral. No Brasil, a população feminina é de 109 milhões, correspondendo a 52%
da população de um modo geral. (IBGE)
O Brasil tem 67 milhões de
mães, segundo pesquisa do Instituto Data Popular, sendo que dessas, 31% são solteiras
e 46% trabalham.
Pelo estudo realizado, podemos observar alguns avanços em relação à vida das mães brasileiras, pois os dados revelam que “mães do século 21 são menos conservadoras e mais interessadas em tecnologia do que as do século 20. Entre as mães do século passado, 75% acreditavam que uma pessoa só pode ser feliz se constituir família. O percentual de verdade dessa premissa cai para 66% para as mães da nova geração. Para 58% das mães da geração anterior é um dever da mulher cuidar das refeições. Enquanto esse pensamento prevalece em apenas 45% das progenitoras do século 21”.( Agenda Governamental)
A presença de mais de 20 milhões de
mulheres consideradas mães solteiras, sendo responsáveis sozinhas pela
manutenção, criação e educação dos filhos, traz à tona uma questão muito séria
que é a feminização da pobreza, o que vem acontecendo em todas as regiões
brasileiras, agravando também o processo de desigualdade existente entre a
população brasileira.
Considerando a adoção do conceito de
feminização da pobreza é que já há alguns anos alguns programas sociais
privilegiam as mulheres como titulares dos benefícios, a exemplo do Bolsa
Família, moradia e outros.
Daí que quando pensamos em mães
brasileiras, é necessário focar nas diferenças e nas dificuldades que um grande
número atravessa para cumprir suas funções de mães, sobretudo quando têm filhos
crianças.
As dificuldades vão desde a
ausência de creches, mal atendimento nas unidades de saúde, deficiências nos
transportes públicos, ausência de moradias e, sobretudo, baixos níveis de
renda.
Mães que são chefes de família precisam
trabalhar. Os programas de repasse de auxílios pelos poderes públicos são
insuficientes para manutenção dos filhos e pagar moradia e transporte. Crianças
não encontram vagas em creches porque elas (as creches) são raras e as mães
deixam suas crianças com outras mulheres, vizinhas, amigas, parentes e mesmo
assim, pagando com os minguados recursos que têm para subsistência.
As escolas públicas de ensino básico
deveriam funcionar em sistema integral para o aluno, para sua melhor
aprendizagem, proteção e tranquilidade das famílias, sobretudo as que estão sob
responsabilidade das mulheres.
No dia dedicado às mães, a sociedade se
movimenta quase em comoção em louvor às mesmas mulheres que durante o ano todo,
em vários momentos, são tão maltratadas pelos homens – maridos ou companheiros
– pelos filhos e pelos poderes públicos.
Os tipos de violências praticadas vão desde
a ausência de políticas públicas de apoio e proteção, à prática do feminicídio.
Mães têm sido mortas por maridos, namorados, amantes na presença dos filhos
pequenos com muita frequência.
Em 2021 foram 1.319 mulheres, média de mais
de 25 casos por semana, e mais de 70% entre 18 a 44 anos, em idade reprodutiva,
o que se pode inferir que haja alto índice de mães entre as mulheres mortas.
(Forum Brasileiro de Segurança Pública)
Mães merecem todas as páginas que lhes são
dedicadas ao se escrever a história do ser humano em sua travessia planetária.
É comum que qualquer mãe rompa qualquer
barreira para defender ou ajudar o seu filho ou filha, mesmo na dúvida. São
protetoras até demais, são cúmplices, dedicadas, ficam junto até a última hora,
segundo Cora Coralina fala em seu poema. Mas também são autoritárias,
fragilizadas pelo machismo, herança que a sociedade lhes joga sobre os ombros
ao longo dos anos de colonização escravagista nesse país.
Mães também sofrem pelos filhos, adoecem,
têm depressão, ficam tristes, ficam muito cansadas pelo trabalho e pelas
pressões psicológicas, por isso também requerem proteção familiar,
companheirismo, amor.
A maternidade se constrói no
dia a dia e sempre se espera que, na família, o amor tenha a forma de
reciprocidade.
Todos lembramos de nossas mães.
Eu lembro da minha. Vivi muito pouco tempo
com minha mãe, em nossa casa, porque logo cedo, aos 14 anos, tive de estudar em
Fortaleza porque não havia ensino médio no interior do Ceará. Os jovens saiam
para Fortaleza e já emendavam estudos com vida profissional.
Então eu voltava nas férias, em finais de semana,
e a maior lembrança é de quando eu apanhava o último trem de passageiros, à
noite, de volta do Ipu para Fortaleza. Minha mãe ao lado do meu pai olhando a
saída do trem, na plataforma da estação.
Dentro do trem, a minha figura envolvida em
lágrimas e saudades.
Em 09.05.2022
*Mirtes Cordeiro é pedagoga.
Nenhum comentário:
Postar um comentário