O Globo
Nero foi acusado de tocar lira enquanto
Roma ardia em chamas. Hoje alguns líderes fazem pior: jogam combustível no
fogo. A resposta de algumas nações à crescente crise de energia tem sido dobrar
o uso de combustíveis fósseis — despejando bilhões de dólares em carvão,
gasolina e gás, aprofundando a emergência climática.
Os indicadores climáticos continuam a
quebrar recordes, projetando um futuro de ferozes tempestades, inundações,
secas, incêndios e com temperaturas inabitáveis em vastas áreas do planeta. Novos
investimentos na exploração de combustíveis fósseis são ilusórios — eles não
são a resposta e nunca deveriam ser. Estão no noticiário diariamente os danos
que fazemos ao planeta. Combustíveis fósseis são a causa da crise climática.
Energia renovável é o plano de paz para o século XXI, a resposta para limitar os distúrbios climáticos e impulsionar a segurança energética. Mas a batalha por uma transição energética rápida e justa não está sendo travada em campo. Investidores ainda apoiam combustíveis fósseis, e governos distribuem bilhões para subsidiar carvão, petróleo e gás — US$ 11 milhões por minuto.
Há uma palavra que define alívio a curto
prazo, em vez de bem-estar a longo prazo: vício. Ainda estamos viciados em
combustíveis fósseis. Pela saúde das nossas sociedades e do planeta, precisamos
parar. Agora.
Para isso, pedi que os governos do G20
desfaçam infraestrutura em carvão, eliminando-a por completo em 2030 para os
países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e em
2040 para os demais. Tenho apelado para que os atores financeiros abandonem o
financiamento do combustível fóssil e invistam em energia renovável. E proponho
um plano com cinco pontos para impulsionar a energia renovável no mundo:
1) instituir a tecnologia de energia
renovável como um bem público global, removendo barreiras de propriedade
intelectual para transferência tecnológica;
2) melhorar o acesso global às cadeias de
suprimento para componentes e materiais brutos de tecnologia de energia
renovável;
3) aprovar mais rápido e dedicar mais
esforços à modernização da matriz de eletricidade;
4) trocar os subsídios energéticos de
combustíveis fósseis para proteger os mais vulneráveis e investir numa
transição justa para um futuro sustentável;
5) triplicar os investimentos em
renováveis. Isso inclui bancos de desenvolvimento multilaterais e
desenvolvimento de instituições financeiras, assim como bancos comerciais.
Precisamos de mais urgência de todos os
líderes globais: reduzir as emissões em 45% em 2030 e alcançar a neutralidade
de carbono até a metade do século. Mas os comprometimentos nacionais atuais nos
levarão a um aumento de quase 14% nesta década, e isso significa catástrofe.
A resposta está nos renováveis — para ação
climática, segurança energética e eletricidade limpa.
Enquanto os preços de gasolina e gás
atingem níveis históricos, os renováveis estão cada vez mais baratos: o custo
da energia solar e de baterias despencou 85% na última década, enquanto o da
energia eólica caiu 55%. Investir em renováveis cria três vezes mais empregos
do que em combustíveis fósseis.
Claro que os renováveis não são a única
resposta para a crise climática. Soluções baseadas na natureza, como reverter o
desmatamento e a degradação de terra, são essenciais. Assim como os esforços
para promover eficiência energética. Mas uma transição rápida para energias
renováveis precisa ser nossa ambição.
À medida que superamos a dependência de
combustíveis fósseis, os preços da energia serão mais baixos e previsíveis, com
efeitos positivos nos alimentos e na segurança econômica. Então, vamos
concordar que uma rápida revolução renovável é necessária para deixarmos de
tocar a lira enquanto nosso futuro arde em chamas.
*Secretário-geral das Nações Unidas
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