Valor Econômico
Marqueteiro orientou Bolsonaro a
capitalizar Auxílio
O juiz nem apitou o início do jogo
eleitoral, mas a bola está rolando faz tempo, como observou o ministro da Casa
Civil, Ciro Nogueira, em conversa com o Valor na semana passada.
Para tentar roubar a bola dos pés do
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que está ganhando de goleada no
Nordeste, o presidente Jair Bolsonaro deflagrou uma ofensiva na região.
Há 11 dias, ele faz marcação cerrada ao
adversário: nesse período, já repetiu, ou repetirá o roteiro do petista em três
escalas: Rio Grande do Norte, Alagoas e Bahia.
Lula cumpriu agenda em Natal no dia 16 de
junho. Um dia depois, Bolsonaro desembarcou na capital do Rio Grande do Norte.
Neste mesmo 17 de junho, Lula teve
compromissos em Maceió (AL), ao lado do senador Renan Calheiros (MDB). Hoje,
quando completam 11 dias da visita do petista, é a vez de Bolsonaro aterrissar
na capital de Alagoas. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) - principal
adversário de Renan -, acompanhará Bolsonaro na entrega de 1.120 casas
populares a famílias alagoanas de baixa renda.
Finalmente, neste sábado (2), Lula e Bolsonaro cumprirão agendas, simultaneamente, em Salvador, na comemoração da Independência da Bahia. Segundo o ex-ministro da Cidadania e pré-candidato ao governo João Roma (PL), Bolsonaro chegará ao Estado na véspera: no dia 1º, ambos anunciam início das obras do Rodoanel em Feira de Santana, a 100 quilômetros de Salvador.
No sábado, Bolsonaro vai conduzir uma
motociata na capital baiana, partindo da Arena Fonte Nova, até o Parque dos
Ventos. No mesmo estádio, que comporta até 48 mil pessoas, Lula fará um ato político,
mas na parte da tarde.
O cerco de Bolsonaro a Lula nos Estados do
Nordeste é uma estratégia previsível. Orientado pelos caciques do Centrão e
pelo marqueteiro Duda Lima, Bolsonaro convenceu-se de que precisa reduzir a
vantagem ampliada de Lula na região.
Segundo sondagem do Datafolha divulgada no
dia 23, o petista detém 58% das intenções de voto dos nordestinos, contra 19%
que declaram voto no presidente da República. Essa dianteira de 39 pontos
percentuais, se persistir, pode garantir ao petista a vitória no primeiro
turno.
Com 41 milhões de eleitores, o Nordeste
concentra 26,9% do eleitorado. Fica atrás somente da região Sudeste, que reúne
64 milhões de eleitores (42,4%).
O Nordeste é igualmente estratégico porque
contempla o maior número de beneficiários do Auxílio Brasil: são 8,5 milhões de
famílias cadastradas no programa que substituiu o Bolsa Família. Logo atrás vem
a região Sudeste, com 5,2 milhões de famílias registradas, segundo dados do
Ministério da Cidadania.
A decisão de intensificar o cerco ao
adversário no Nordeste foi um dos temas da reunião de emergência da coordenação
da campanha bolsonarista na quarta-feira (22), quando o ex-ministro da Educação
Milton Ribeiro foi preso pela Polícia Federal. Ainda tateando a resposta ao
fato inesperado, Bolsonaro havia declarado à rádio Itatiaia, naquela manhã, que
se a PF prendeu, “tem um motivo”. E o ex-auxiliar que respondesse “pelos atos
dele”.
Participaram da reunião o senador Flávio
Bolsonaro (PL-RJ), os ministros Ciro Nogueira e Célio Faria (Secretaria de
Governo), o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, o ex-ministro da Defesa e
indicado para a vaga de vice, general Braga Netto, e auxiliares mais próximos.
Segundo uma fonte que acompanha de perto os
bastidores da campanha bolsonarista, nessa reunião, o marqueteiro Duda Lima foi
ouvido com atenção. Ele recomendou veementemente ao presidente que, nos atos
políticos, principalmente no Nordeste, dedique mais energia a expor as ações
positivas do governo, como a entrega de residências do Casa Verde e Amarela e a
criação do Pix, e, principalmente, empenhe-se em capitalizar o Auxílio Brasil.
Na mesma fala, Duda Lima ponderou que
insistir nos ataques às urnas eletrônicas e aos ministros do Tribunal Superior
Eleitoral (TSE) e apostar no confronto institucional, não atrai votos. Ao
contrário, afugenta o eleitor de centro - um voto disputado a unha entre Lula e
Bolsonaro.
Na entrevista ao Valor, publicada na
sexta-feira, Ciro Nogueira afirmou que para Bolsonaro vencer a eleição, “só
precisa recuperar o eleitorado que votou nele em 2018”. A base bolsonarista
representa cerca de 30% do eleitorado. O restante dos eleitores - que ajudaram
a elegê-lo com 55% dos votos válidos (57,7 milhões de votos) - hoje engrossa a
taxa de rejeição ao presidente, de 55%, segundo o Datafolha.
É com esse pano de fundo, e seguindo os
conselhos de Duda Lima, que Bolsonaro escolheu o Nordeste para anunciar o
reajuste do Auxílio Brasil de R$ 400 para R$ 600.
“Como a imprensa está anunciando, o Auxílio
Brasil vai passar de R$ 400 para R$ 600”, disse Bolsonaro na sexta-feira, em
solenidade de entrega de casas populares em João Pessoa, na Paraíba. “É o
governo entendendo o sofrimento dos mais humildes e, dessa forma, buscando
atender a todos. Só aqui na Paraíba, 1,5 milhão de pessoas recebem o auxílio”,
completou. Ele acrescentou que se o beneficiário conseguir um trabalho formal,
não perde o auxílio.
A estratégia, entretanto, não tem retorno
garantido. No levantamento realizado em maio, quando fez um recorte do
eleitorado que recebe o Auxílio Brasil, o Datafolha apurou que entre
beneficiários do programa, 59% declaram voto em Lula.
No mesmo segmento, 66% dos entrevistados
responderam que o pagamento do benefício não influencia o seu voto, enquanto
69% dos beneficiários acham que o valor pago é insuficiente. O valor médio do
benefício pago em todo o Brasil até o mês passado era de poucos mais de R$ 500.
No futebol, há dois tipos de marcações. Em uma delas, o atacante parte pra cima e tenta dar o bote de saída. Contudo, se o adversário é muito habilidoso, aconselha-se cautela e paciência e esticar o cerco. Como disse Nogueira, tem muito jogo pela frente. Mas até agora, Lula está ganhando de 7 a 1 no Nordeste.
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