Editoriais / Opiniões
Demonstração de união contra o golpismo
O Estado de S. Paulo
Ao expressar firme união do País em torno da democracia e do TSE, cerimônia de posse de Alexandre de Moraes foi auspiciosa. Não há espaço para devaneios golpistas
Em tempos normais, a cerimônia de posse de
um novo presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) é ato meramente
protocolar e burocrático. Como não vivemos tempos normais, a posse do ministro
Alexandre de Moraes na presidência do TSE, anteontem, foi meticulosamente
organizada para expressar a imperturbável disposição de fazer valer a vontade
dos eleitores nas eleições de outubro, ante as ameaças golpistas do presidente
Jair Bolsonaro.
Além do próprio presidente Bolsonaro, estiveram
presentes os presidentes da Câmara e do Senado, o presidente do Supremo
Tribunal Federal, quatro ex-presidentes da República, numerosas autoridades de
diversas esferas, parlamentares, candidatos e lideranças da sociedade civil. Ou
seja, a República compareceu em peso para ouvir o ministro Alexandre de Moraes
garantir que o sistema eleitoral, difamado por Bolsonaro, é seguro e
transparente. Foi aplaudido de pé.
A cerimônia de posse do novo presidente do TSE expressou a firme união do País em torno da democracia e de sua Justiça Eleitoral. As urnas eletrônicas não são um tema que cause divisão na sociedade. Ao contrário: como mostraram os atos suprapartidários em favor do atual sistema de votação na semana passada, a campanha bolsonarista contra o sistema eleitoral é artificial e minoritária. Sem provas e sem apoio, Jair Bolsonaro, claramente deslocado na cerimônia do TSE, está cada vez mais solitário na tentativa de difamar e bagunçar as eleições brasileiras.
Com o auditório do TSE inteiramente lotado,
Alexandre de Moraes disse que a cerimônia de posse simbolizava “o respeito
pelas instituições como único caminho de crescimento e fortalecimento da
República e a força de democracia como único regime político onde todo poder
emana do povo e deve ser exercido pelo bem do povo”. Ou seja, se os tempos têm
um evidente caráter excepcional, com o presidente da República tentando
interferir explicitamente no processo eleitoral, é também evidente que o País e
suas instituições estão do lado da democracia. Não há espaço para devaneios
golpistas.
“Somos a única democracia do mundo que
apura e divulga os resultados eleitorais no mesmo dia, com agilidade,
segurança, competência e transparência. Isso é motivo de orgulho nacional”,
disse o novo presidente do TSE, sendo ovacionado pela plateia. Eis a resposta
da sociedade aos ataques de Bolsonaro: uma união ainda mais forte, um
reconhecimento ainda mais explícito, um aplauso ainda mais entusiasmado à
Justiça Eleitoral.
As palmas eram também um reconhecimento do
trabalho feito até aqui pelo anterior presidente do TSE, ministro Edson Fachin.
Nas justas palavras do corregedor-geral da Justiça Eleitoral, ministro Mauro
Campbell Marques, Edson Fachin mostrou na presidência do TSE um firme
compromisso com o exercício do diálogo, com a transparência e com a harmonia
institucional entre seus integrantes.
Com suas circunstâncias peculiares, a
cerimônia de posse do novo presidente do TSE serviu para reiterar um aspecto
fundamental do processo eleitoral: seu caráter civil. Os militares não foram
citados nos discursos. E essa ausência, longe de representar qualquer
menoscabo, é importante reconhecimento do papel constitucional das Forças
Armadas. Respeitam-se os militares respeitando suas funções, que nada têm a ver
com contagem de votos.
Ao expressar a firme união do País em torno
da democracia e do TSE, a cerimônia de posse foi especialmente auspiciosa. Mas
os desafios continuam. Como lembrou Alexandre de Moraes, “liberdade de
expressão não é liberdade de agressão, de destruição da democracia, das
instituições, da dignidade e da honra alheias”. O novo presidente do TSE
prometeu uma atuação da Justiça Eleitoral célere, firme e implacável no combate
à desinformação e a outras práticas abusivas, de forma a “proteger a
integridade das instituições do regime democrático e a vontade popular”.
Em sua fala, o procurador-geral da
República, Augusto Aras, garantiu que o Ministério Público “respeita o voto
votado e o voto apurado” e que está especialmente atento à defesa do sistema
eleitoral. É o que o País espera.
Campanha começa mal
O Estado de S. Paulo
Ignorando os problemas do País, Bolsonaro e Lula dão início à disputa como se fossem candidatos a líderes religiosos, não à Presidência, pintando um ao outro como o diabo em pessoa
A campanha oficial para a Presidência da
República começou mal. Os dois candidatos que ora lideram as pesquisas de
intenção de voto, o petista Lula da Silva e o presidente Jair Bolsonaro,
optaram por inaugurar os atos públicos de campanha, no dia 16 passado,
explorando politicamente a fé dos brasileiros, em especial dos evangélicos. É
lamentável que tenha sido assim, pois nem um nem outro concorrem à liderança
espiritual de alguma denominação religiosa. Lula e Bolsonaro disputam o poder
civil em um país democrático, regido por uma Constituição que determina que o
Estado é laico, ou seja, não tem um credo oficial.
Religião, portanto, é tema circunscrito à
esfera privada, individual. Se há algo que o poder estatal pode fazer em relação
à religião é assegurar as condições para a livre manifestação da fé dos
cidadãos e combater a intolerância religiosa. Numa República, todos são iguais
perante a lei e têm assegurado o direito de professar livremente sua fé
religiosa – ou mesmo o direito de não ter fé alguma.
Em Juiz de Fora (MG), no entanto, Bolsonaro
reforçou a narrativa absurda segundo a qual a eleição de 2022 será uma “luta do
bem contra o mal”. O presidente chegou a dizer que, caso Lula seja eleito, os
brasileiros “serão impedidos de falar em Deus”. Aliados seus espalham a mentira
de que “templos serão fechados” caso Bolsonaro seja derrotado. A própria
escolha da cidade para Bolsonaro dar o pontapé inicial à sua campanha oficial
não foi aleatória. O incumbente quis explorar o terrível atentado que sofreu em
2018 como um misto de martírio e predestinação.
Lula da Silva, por sua vez, decidiu marcar
posição nessa seara religiosa e usou seu primeiro ato de campanha oficial, em
São Bernardo do Campo (SP), para responder aos ataques de seu principal
adversário. Na porta de uma fábrica no ABC Paulista, o petista afirmou que
Bolsonaro “é um fariseu que está tentando manipular a boa-fé de homens e
mulheres evangélicos”, e que, “se há alguém possuído pelo demônio, é esse
Bolsonaro”.
O debate público travado assim pelos dois
líderes das pesquisas, ao rés do chão, chega a ser um desrespeito aos mais de
156 milhões de eleitores aptos a votar em outubro. O País tem problemas muito
graves a serem tratados. Nenhum desses problemas, nem remotamente, toca a
religião. Trazer a religiosidade do povo para as discussões eleitorais não
passa de diversionismo de quem tem receio de demonstrar incapacidade para
enfrentar temas muito mais prementes para a sociedade. É tática de quem não tem
o que dizer ou mostrar.
Há milhões de brasileiros passando fome e
outros tantos milhões vivendo em insegurança alimentar. O desemprego segue em
patamar elevado. A inflação, em que pesem reduções pontuais de alguns preços,
corrói a renda dos trabalhadores. O que será feito da educação pública após a
razia promovida por Bolsonaro no Ministério da Educação? Como recuperar a
reputação internacional do País na defesa do meio ambiente? Quais os planos de
cada candidato para revitalizar o Sistema Único de Saúde (SUS)? O que será feito
para resgatar a parte do Orçamento que foi capturada por um punhado de
parlamentares oportunistas para satisfazer interesses nada republicanos? Essas
são questões de altíssima relevância, entre outras, mas nenhuma delas foi
tratada por Lula nem Bolsonaro nos marcos iniciais de suas campanhas.
A religião é um componente muito importante
na vida de milhões de brasileiros. Isso é incontornável. Religião transmite
paz, acolhimento, traz conforto espiritual diante das atribulações da vida.
Religião oferece um norte moral. No entanto, religião não é tema para ser
debatido em campanha eleitoral.
A bem da verdade, a campanha eleitoral
oficial apenas começou. Oxalá todos os candidatos, sem exceção, concentrem-se
em apresentar ao público – inclusive comparecendo aos debates – suas ideias e
seus planos para governar um país que há quatro anos se ressente de não ter um
governo digno do nome e que vive dependente da misericórdia divina.
A diferença entre direito e regalia
O Estado de S. Paulo
Indenizações generosas pagas a militares que passam para reserva distorcem direito à proteção social da categoria
O pagamento de generosas remunerações a
militares nos últimos anos, revelado recentemente pelo Estadão, expõe de
forma cristalina um dos elos que sustentam a relação entre o presidente Jair
Bolsonaro e as Forças Armadas.
No auge da pandemia de covid-19, quando o
País buscava uma forma de ajudar milhões de famílias vulneráveis e
contabilizava milhares de mortes diárias em decorrência de uma doença ainda sem
vacinas nem tratamento eficaz, o governo depositava valores milionários a
militares como Walter Braga Netto e Bento Albuquerque, que ocupavam os
Ministérios da Casa Civil e de Minas e Energia à época, e a Luiz Eduardo Ramos,
à frente da Secretaria-Geral da Presidência da República.
Os dados, levantados pelo deputado Elias Vaz
(PSB-GO), jogam luz sobre benesses exclusivas, que garantem à categoria militar
a invejável condição de aumentar a renda na aposentadoria – chamada de passagem
para a reserva. O Ministério da Defesa argumentou haver amparo legal em todos
os pagamentos, que incluíram indenizações por férias, adicionais e licenças
especiais não usufruídas ao longo da carreira. A força do relatório do deputado
está na revelação de que a situação dos ministros não é caso isolado. Quase 1,6
mil militares receberam mais de R$ 100 mil por mês entre janeiro e maio deste
ano, totalizando despesas de R$ 262,5 milhões. Entre os contemplados está o
ex-ministro Eduardo Pazuello, conhecido pela ruinosa gestão à frente do
Ministério da Saúde e por ter violado a disciplina militar ao participar de um
comício bolsonarista quando ainda era general da ativa. Ele recebeu R$ 305,4
mil em março.
É um fenômeno que o colunista Pedro
Fernando Nery, do Estadão, chamou de “marechalcracia”, que garante aos
militares uma promoção de patente na passagem para a reserva, a integralidade
dos vencimentos e o direito de se aposentar com a maior remuneração da
carreira. Aos privilégios que já vigoram há anos, Bolsonaro adicionou novos
apanágios. No ano passado, permitiu que os militares acumulassem salários e
aposentadorias acima do teto constitucional de R$ 39,2 mil, medida autorizada
por portaria e que beneficiou inclusive o próprio presidente. Recentemente,
criou um bônus para o militar que continua trabalhando mesmo depois de atingir
o tempo para passar à reserva. Aos trabalhadores civis que se aposentam pelo
Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), resta arcar com um benefício
calculado a partir da média das contribuições e limitado a um teto de pouco
mais de R$ 7 mil, que proporciona um padrão de vida bem mais modesto.
O assunto suscita o debate sobre a diferença entre legalidade e moralidade. As indenizações militares podem até não violar nenhuma lei, mas são constrangedoras do ponto de vista moral, considerando os valores auferidos e o momento em que eles foram pagos. Como instituições permanentes de Estado, as Forças Armadas exigem dedicação exclusiva de seus quadros; em contrapartida, o País oferece uma proteção social permanente aos que seguem a carreira e às suas famílias. É um direito que deve ser preservado, mas que não pode ser distorcido ou usado como pretexto para a concessão de regalias.
Recado a Bolsonaro
Folha de S. Paulo
Na posse de novo presidente do TSE,
presidente fica isolado em delírio golpista
Do ponto de vista simbólico, a posse de
Alexandre de Moraes na presidência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) dificilmente
poderia ter sido mais bem-sucedida.
A elite institucional do país compareceu em
peso, num sinal inequívoco de prestígio da corte eleitoral e de apoio a Moraes,
um ministro cuja agenda todos conhecem há tempos e que pode se resumir em dois
pilares: defesa da urna eletrônica e combate à
desinformação.
Diante de olhares melancólicos do
presidente Jair Bolsonaro (PL), o ministro exaltou o TSE e sua capacidade de
apresentar os resultados da disputa no mesmo dia, com segurança e
transparência. "Isso é motivo de orgulho nacional", disse.
Moraes também anunciou que o tribunal
procurará intervir o mínimo nas eleições, mas o fará com velocidade e firmeza
se for necessário coibir a divulgação de notícias falsas ou de qualquer outra
prática abusiva. "Principalmente daquelas escondidas no covarde anonimato
das redes sociais", completou.
Enquanto a plateia saudava Moraes de forma
efusiva, Bolsonaro recusava-se a aplaudir —talvez por estar ocupado procurando
uma maneira de desaparecer sem chamar a atenção, tal era seu constrangimento
naquele ambiente solene.
Não é segredo que o chefe de Estado promove
o oposto do que enunciou o presidente do TSE. Ataca o sistema eleitoral,
estimula a circulação de fake news e insinua a possibilidade de não passar a
faixa caso seja derrotado.
Contra sua inclinação golpista já se
ergueram diversas barreiras da sociedade civil. A mais relevante delas foi
o ato de 11 de
agosto, no qual entidades distintas entre si e mais de 1 milhão de
pessoas ofereceram seus nomes como bastiões do processo democrático.
A iniciativas como essas se junta a
cerimônia no TSE. Chefes e membros de Legislativo e Judiciário, ex-presidentes
e governadores mostraram apreço pelas regras do jogo, deixando Bolsonaro
isolado no seu delírio bonapartista.
São sinais cristalinos, sem dúvida, mas não
se descarta que o presidente da República, do alto de sua parvoíce, revele-se
inapto a compreender o óbvio —ou que, de outro modo, não queira fazê-lo.
Afinal, entre os convivas de Moraes estavam
dois braços auxiliares do bolsonarismo: Arthur Lira (PP-AL), presidente da
Câmara dos Deputados, e Augusto Aras, procurador-geral da República.
É difícil imaginar que já tenham virado as
costas ao presidente; assim como eles, outros adeptos dos rapapés brasilienses
podem muito bem omitir-se mais adiante.
Haverá eleições limpas e o vitorioso
adentrará o Planalto em 1º de janeiro. Nem por isso os rosnados
antidemocráticos deixam de merecer vigilância permanente.
Sinecuras estatais
Folha de S. Paulo
Melhora de gestão não justifica benesses
como as pagas pelo BNDES a servidores
São fartamente conhecidos os abusos e
distorções nos gastos com o funcionalismo da administração federal direta,
financiados com dinheiro dos impostos. Isso também se deve a estatísticas mais
longevas, frequentes e detalhadas.
Muito menos sabido e escrutinado é o que se
passa nas empresas estatais que dispõem de receita própria, cujas despesas com
pessoal não estão no Orçamento da União e cujos dirigentes e funcionários não
estão sujeitos ao teto salarial do serviço público.
Nesses casos, depende-se de boletins
trimestrais resumidos e relatórios anuais, publicados com certa defasagem, em
que estão compiladas cifras referentes às cerca de 120 empresas controladas
direta ou indiretamente pelo Tesouro Nacional. E mesmo essas informações
esparsas não raro revelam privilégios e práticas espantosas.
O exemplo mais recente é o pagamento por
parte do BNDES de R$ 108,1 mil por funcionário, em média, a título de
participação no lucro amealhado em 2021, conforme
a Folha noticiou. O banco de fomento foi de longe o mais
generoso entre as instituições federais nessa modalidade de benesse.
Os valores individuais variaram entre R$
13,8 mil e R$ 257,3 mil, de acordo com a remuneração e o desempenho do
empregado. Em média, cada um dos contemplados recebeu uma bolada equivalente a
três meses de salário.
Se prêmios exorbitantes a executivos podem
gerar questionamento de acionistas até em empresas privadas de capital aberto,
que dirá no BNDES —que conta com receitas fixas, deve bilhões ao Tesouro
Nacional e não está sujeito à competição de mercado.
É fato que as estatais federais passaram
por sensível melhora de gestão nos últimos anos, em especial após o desastre do
governo Dilma Rousseff (PT). Isso decerto contribuiu para que seu resultado
conjunto passasse de prejuízo de R$ 32 bilhões, em 2015, para lucro de R$ 188
bilhões em 2021.
Nem tudo aí decorre de méritos gerenciais,
porém. No exemplo principal, o lucro de R$ 107 bilhões do grupo Petrobras foi
impulsionado pela disparada dos preços dos combustíveis —o que, aliás, motivou
ataques de Jair Bolsonaro (PL) à maior companha do país.
Privatizações podem encerrar boa parte das
dúvidas quanto à política de pessoal das estatais. Até lá, deve-se ter em mente
que elas compõem o patrimônio público, não o de seus dirigentes e funcionários.
Falta seriedade à declaração de bens dos
candidatos
O Globo
Em nome da transparência, regra deveria
exigir uma lista idêntica à apresentada à Receita Federal
Parecem piada certas declarações de
patrimônio entregues por candidatos de diferentes partidos ao Tribunal Superior
Eleitoral (TSE). Entre as práticas corriqueiras, estão a omissão descarada de
bens ou a apresentação de valores abaixo dos praticados pelo mercado. Ambas
representam um desrespeito aos eleitores. O cidadão precisa de informações
fidedignas para saber em quem está votando e para poder identificar quem tenta
esconder o que tem.
Revelar o patrimônio é importante no caso
tanto dos políticos novatos quanto dos tarimbados. No dos estreantes, a
declaração é fundamental para detectar contradições. Se alguém promete defender
o meio ambiente, não deveria ter propriedades rurais multadas por devastação
ilegal. Quem se vende como contrário ao tabagismo não pode ter ações de
empresas do ramo. E assim por diante.
No caso dos eleitos, a relação patrimonial
ajuda a detectar atuação em benefício próprio. Para candidatos em busca de
reeleição, existe ainda a possibilidade de analisar a evolução dos bens. Não
faltam casos de gente que entrou na política e enriqueceu, como se os ares dos
palácios e parlamentos exercessem efeito milagroso em carreiras empresariais.
Inúmeros exemplos que vieram à tona nos
últimos dias demonstram que a transparência está longe de ser a prática mais
comum. Um levantamento do portal g1 constatou que 38% dos candidatos não
declararam patrimônio nenhum. Apenas um declarou ter mais de R$ 1 bilhão — o
acionista do grupo Votorantim Marcos Ermírio de Moraes (PSDB), candidato a
segundo suplente de senador em Goiás. A grande maioria tenta reduzir o valor de
seus bens na declaração apresentada ao TSE.
O senador Romário (PL-RJ), candidato à
reeleição, omitiu um patrimônio avaliado em R$ 6,7 milhões que a Justiça afirma
pertencer a ele (incluindo a casa onde mora no Rio e o carro que usa para se
deslocar). A candidata a deputada distrital pelo PP Ana
Cristina Siqueira Valle, ex-mulher do presidente Jair Bolsonaro, deixou fora da
lista uma casa que possui na cidade de Halden, na Noruega. Como
revelou reportagem do GLOBO, o imóvel é avaliado em mais de R$ 6 milhões.
Em
todo o país, nove candidatos não declararam helicópteros ou aviões registrados
em nome dos postulantes na Agência Nacional de Aviação Civil (Anac).
Antonio Galvan, candidato ao Senado pelo PTB de Mato Grosso, declarou ter R$ 14
milhões. Faltou um avião agrícola. “Está declarado no Imposto de Renda, foi um
avião comprado em 2019, paguei uns R$ 800 mil quebradinhos”, disse Galvan ao
GLOBO.
Mantida a regra atual, a lista de bens do
TSE continuará sendo uma peça de ficção, uma espécie de “me engana que eu
acredito”. Para que seja levada a sério e de fato aumente a transparência,
teria no mínimo de ser um espelho do que é declarado à Receita Federal. É
verdade que muitos bens são declarados à Receita Federal por valores abaixo dos
praticados no mercado — em particular imóveis. Mesmo assim, corrigir a
legislação para que os candidatos tenham de apresentar declaração de bens
idêntica à entregue à Receita já seria um avanço.
Intervenção do governo federal no ICMS
cobrará preço alto no futuro
O Globo
Forçar queda de preços com objetivo
eleitoreiro desequilibrará caixa dos estados, e contribuinte pagará a conta
No vale-tudo eleitoral em que se
transformou o governo Jair Bolsonaro, leis e emendas constitucionais que
aumentam os gastos sem lastro se tornaram banais. Numa delas, rasgou-se o pacto
federativo, limitando a 17% a alíquota do Imposto sobre Circulação de Mercadorias
e Serviços (ICMS) cobrado sobre combustíveis, energia, comunicação e transporte
coletivo. O objetivo foi puramente eleitoreiro: forçar a queda de preços de
olho nos votos que renderia. O preço a pagar no futuro será alto.
O Rio de Janeiro cobrava 34% na gasolina. A
maior parte dos estados, 29%. Muitos taxavam o diesel em 17%. Nove aplicavam
uma alíquota acima desse limite. O Comitê Nacional de Secretários de Fazenda
(Comsefaz) estima perda de arrecadação neste ano de R$ 83,5 bilhões. Onze
estados e o Distrito Federal entraram com ações no Supremo Tribunal Federal
(STF) questionando a intervenção. O relator dos processos, ministro Gilmar
Mendes, pediu ao governo uma contraproposta. A Advocacia-Geral da União (AGU)
respondeu que é preciso monitorar a receita dos estados, e, se o excesso de
arrecadação for “consistente”, nada há a fazer. Os dois lados têm até novembro
para chegar a um acordo, do contrário o STF se verá obrigado a exercer seu
papel constitucional de arbitrar o conflito.
A resposta da AGU mistura ignorância sobre
o cenário que se avizinha à tentativa de empurrar o problema com a barriga. As
medidas eleitoreiras causam distorções que se acumulam à espera do próximo
presidente e dos futuros governadores. Se a arrecadação estadual com o ICMS foi
beneficiada nos últimos meses pela alta da inflação e dos combustíveis, ambas
já recuam. O barril do petróleo caiu abaixo de US$ 100, e o novo presidente da
Petrobras quer repassar rapidamente a queda aos preços. A ação do Banco Central
resultou na deflação que se estenderá de julho a agosto, talvez até setembro.
É evidente que o corte abrupto no ICMS
apertará o caixa dos estados, muitos endividados ou às voltas com dificuldades
para cumprir as exigências da Lei de Responsabilidade Fiscal. É previsível irem
daqui a pouco a Brasília pedir mais um socorro ao Tesouro, filme já visto
diversas vezes. A conta recairá sobre todos os contribuintes.
Gastos importantes dos estados serão
afetados. A Associação Nacional de Pesquisa em Financiamento da Educação
(Fineduca) prevê que as escolas
públicas perderão R$ 21 bilhões por ano, caso a lei não seja revista. O
orçamento do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de
Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) depende em 60% do ICMS.
São conhecidas as inúmeras distorções da
estrutura brasileira de impostos. Em vez de fazer a intervenção eleitoreira no
ICMS, o governo deveria ter dado prioridade à reforma tributária, em que
haveria um ajuste em todos os tributos. A mudança feita pelo governo só agrava
desequilíbrios que seriam resolvidos com a consolidação de vários impostos —
entre eles o ICMS — e a unificação de alíquotas. Para Bolsonaro e o Centrão,
porém, é como se não houvesse Brasil depois de outubro.
Fed indica moderação no aperto monetário
Valor Econômico
Ata não indica nenhum senso de urgência em
aplicar um ritmo ainda mais forte de ajuste dos juros
Depois de correr para recuperar o tempo
perdido no controle da inflação, o Federal Reserve não parece disposto a seguir
o mesmo ritmo de aperto imprimido até agora, ainda que possa fazê-lo. As
minutas da reunião de julho, que decidiu por repetir uma dose incomumente
elevada no ajuste dos juros, de 0,75 ponto percentual, sugerem que o Fed
continuará a elevar os fed funds, mas não indicam nenhum senso de urgência em
aplicar um ritmo vigoroso de ajuste no futuro. Os mercados, cuja expectativa
era de uma nova alta da mesma magnitude em setembro, reduziu sua aposta para
0,5 ponto após a leitura da ata do banco.
O Fed começou a levar os juros para o
terreno restritivo em condições relativamente favoráveis - exceto, claro, o
descontrole inflacionário, para ele inesperado. Mesmo depois de o índice de
preços ao consumidor chegar a 9,1% em junho, as expectativas de longo prazo
continuam ancoradas, após a maior escalada de juros desde 1980. O aperto,
segundo a ata, está sendo feito com a capacidade de pagamento das empresas em
“nível historicamente alto”, com os bancos sólidos e com menos preocupações com
os devedores de hipotecas, que viram até agora seus compromissos crescerem
menos do que a valorização dos imóveis. Em suma, na avaliação do banco, a
economia, que recuou por dois trimestres, aguenta sem grandes estragos doses
adicionais de juros.
Os riscos inflacionários continuam
apontando para cima e os da atividade econômica, para baixo. Investimentos
empresariais e gastos de consumo se reduziram, mas o mercado de trabalho
continua aquecido, com os salários por hora crescendo a um ritmo anual de 5,1%
(abaixo da inflação). Após a reunião de julho, o desemprego se reduziu ainda
mais, para 3,5%, com a criação de 528 mil postos de trabalho.
Pela ata, o Fed pretende esfriar a demanda,
de forma a obter um equilíbrio entre oferta e demanda de mão de obra, entre
outros objetivos, como a forma mais confiável e testada de reduzir a inflação.
Há muitas incertezas quanto à normalização dos suprimentos industriais por meio
da recomposição plena das cadeias de produção, especialmente depois dos
lockdowns na China e da ameaça permanente de um agravamento do conflito na
Ucrânia. “Elas podem não ser restauradas tão cedo”, registra a ata.
A queda das commodities, em especial dos
combustíveis, pode não perdurar. Ela foi a responsável pela primeira queda em
12 meses da inflação em julho (de 9,1% para 8,5%), mas sua trajetória futura
não é clara. O Fed prefere avaliar que as commodities continuam sendo “fonte
potencial de pressões altistas” nos índices de preços.
O banco não parece acreditar que o
esfriamento da economia vá longe. Ele calcula que, salvo surpresas, a economia
continuará a desacelerar no segundo semestre e que na segunda metade do ano que
vem haverá o fechamento do hiato do produto, do crescimento acima do potencial
atual para uma expansão de acordo com a capacidade. Com isso, o núcleo dos
gastos pessoais de consumo, a medida favorita do banco, atingirá ao fim de 2023
2,6% e 2% em 2024, em um período que conta com um índice de emprego menor,
cadeias de produção operando melhor e o “fim da inflação de preços importada”.
Nesta equação, o Fed espera que o nível de
emprego comece a diminuir no segundo semestre - há sinais “tênues” de que isto
começou a acontecer - até chegar à taxa natural de desemprego no fim de 2023. O
Fed estima a taxa de desemprego de longo prazo em 4%, isto é 0,5 ponto
percentual acima dos atuais 3,5%.
A alta dos juros, porém, não chegaram ainda
aos preços, enquanto que os movimentos já feitos pelo Fed trouxeram uma piora
das condições financeiras que fazem algo da tarefa da política monetária antes
que ela se materialize com pleno vigor. O ritmo de aumento dos juros daqui em
diante não está dado.
A ata menciona que a maioria dos membros do Fomc entende que à medida que o aperto se desenrola, será necessário “reduzir o ritmo de alta” para avaliar seus efeitos. Por outro lado, “levará algum tempo” até que a inflação volte à meta de 2%. O tom da ata indica que o Fed não vai usar a “bazuka” dos juros para derrubar rapidamente a inflação e que possivelmente manterá juros na faixa de 3,5%-4% até que os preços voltem a se comportar. Esse é um roteiro traçado em julho. Há investidores que o creem róseo demais e os juros almejados, incapazes de debelar uma inflação não vista há 40 anos.
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