sexta-feira, 23 de junho de 2023

Claudia Safatle - Comunicado é compatível com a queda dos juros em agosto

Valor Econômico

Um comunicado do Copom deve ser lido sempre em comparação ao texto anterior

O comunicado do Comitê de Política Monetária (Copom), divulgado logo após a reunião em que o Banco Central manteve a taxa básica de juros (Selic) em 13,75% ao ano, é compatível com um corte dos juros em agosto, garante um ex-diretor do BC que trabalhou no primeiro mandato de Lula.

Garantir a queda da Selic é algo difícil porque pode ocorrer algum evento gigantesco até a próxima reunião do Copom, marcada para os dias 1º e 2 de agosto. Mas é fato que o comunicado deixa aberta a porta do corte para o mês de agosto.

Um comunicado do Copom deve ser lido sempre em comparação ao texto imediatamente anterior. Neste caso, foram retiradas todas as referências a uma possível alta da taxa básica de juros. Esta era uma limpeza necessária caso se pretenda reduzir os juros.

É natural que o texto não dê certeza quanto ao início da queda por vários motivos, sendo que um deles é a reunião do Conselho Monetário Nacional (CMN) marcada para o dia 29. Sobre isso o Copom não pode falar explicitamente, sob pena de parecer estar impondo condições ao conselho.

Caberá ao CMN confirmar ou não as metas para a inflação de 2024 e 2025 e definir a meta para 2026. As declarações de Lula feitas no início do ano criaram uma enorme especulação sobre a possibilidade de a meta mudar. Lula chegou a citar o percentual de 4,5% como mais factível para a economia brasileira do que os 3% já estabelecidos para os próximos dois anos. Se essa meta for confirmada, ela se repetirá em 2026.

O Copom se referiu à reunião do CMN, ao listar no balanço de riscos para a alta da inflação “uma desancoragem maior, ou mais duradoura, das expectativas de inflação para prazos mais longos”

Amainada a especulação, o mercado tem como base que o número não mudaria para os próximos três anos, ficando em 3%. Se essa não for a decisão do conselho monetário, tal como ocorreu em junho de 2007, quando o CMN se reuniu para estabelecer a meta de inflação de 2009, Lula estará inflacionando a meta.

Definir quando vai começar ou interromper um ciclo é sempre difícil. É uma questão de sintonia fina. Se o BC estiver pretendendo cortar os juros e quiser preservar sua liberdade de fazer o corte de maneira gradual e em pequenas doses, ele não vai querer que mercado precifique uma queda grande.

Outra questão se refere a operar a política monetária no ano-calendário ou por prazos mais longos. “Há modelos diferentes para trabalhar com uma meta contínua e de não trabalhar com o ano-calendário, vai de ser algo bacana até ser uma coisa ruim”, e o mercado aguarda também uma definição do CMN sobre isso.

É importante que se leia comunicado de forma comparativa com o comunicado anterior. Tudo que tem no comunicado é compatível com cortar os juros em agosto.

O que tem de novo: o desaparecimento do cenário em que os juros não cairiam no horizonte relevante; toda a conversa sobre a possibilidade de ter que subir os juros também desapareceu e que diz que a estratégia de manter os juros altos tem sido suficiente. Não diz que a estratégia “foi” suficiente.

Toda a referência de linguagem sobre uma possível alta futura sumiu.

No fim do comunicado, o Copom “relembra que os passos futuros da política monetária dependerão da evolução da dinâmica inflacionária, em especial dos componentes mais sensíveis à política monetária e à atividade econômica, das expectativas de inflação, em particular as de maior prazo, de suas projeções de inflação, do hiato do produto e do balanço de riscos”. São, portanto, coisas extremamente genéricas, e a liberdade de ação do comitê é enorme.

“Acho que o comunicado é muito compatível com o corte de juros em agosto, embora o BC tenha preferido não explicitar, pelos efeitos que poderia ter: excesso de precificação de cortes, assumir o compromisso de antemão, e tornar isso independente da decisão do CMN e do que ela poderá fazer com as expectativas de inflação”, comentou o ex-dirigente do BC.

Quanto aos comentários de Lula e dos demais colaboradores, que estavam furiosos e indignados por não lerem que os juros vão cair no dia tal, ele afirma que compreende a ansiedade pela queda dos juros e que eles queiram mostrar aos seus eleitores que estão ativamente lutando por isso.

“Mas, infelizmente esses objetivos conflitam com o objetivo de ajudar os juros a cair.”

Paciência e serenidade já estavam no comunicado anterior. Perseverar, idem. E o que foi colocado - um conjunto de condicionantes bastante amplo e genérico - aumenta a liberdade de cortar.

“Mais sinalização de corte teria sido uma afoiteza”, disse.

 

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