segunda-feira, 18 de setembro de 2023

Carlos Pereira - Paradoxo de instituições democráticas

O Estado de S. Paulo

Mesmo insatisfeitos com as instituições, a democracia se consolida como preferência dominante

Amais nova pesquisa Datafolha sobre a percepção da opinião pública brasileira acerca da confiança nas instituições políticas, que representam o coração da democracia, mostra que apenas 24% da população confia muito na presidência, 20% no STF, 19% no Ministério Público, 9% no Congresso Nacional e apenas 7% nos partidos políticos. Até mesmo a confiança nas Forças Armadas, que costumava ser mais alta (45% em abril de 2019), caiu para 34% depois das trapalhadas da sua participação no governo Bolsonaro.

Além disso, 61% dos brasileiros afirmam estar desanimados e tristes, 55% têm mais medo do futuro do que esperança e 71% se sentem inseguros com o país de hoje em dia.

Por outro lado, a maioria da população (75%) identifica a democracia como a melhor forma de governo, atingindo a maior taxa de apoio da série histórica. Ou seja, três em cada quatro brasileiros avaliam que a democracia é sempre melhor. Em torno de 12% é indiferente entre uma democracia ou uma ditadura e somente 7% acredita que uma ditadura, em certas circunstâncias, é melhor do que um regime democrático.

Como explicar o aparente paradoxo das instituições democráticas não partilharem da confiança da maioria da população, mas, ao mesmo tempo, a democracia, que é praticada por meio dessas instituições, ser identificada como a melhor forma de governo?

A base das insatisfações da população e da sua baixa confiança com as instituições políticas brasileiras pode ser buscada na efetividade das ações e no fortalecimento das próprias instituições.

Ao expor os meandros e bastidores do suposto “jogo sujo” da política, a atuação das instituições políticas tem o potencial de gerar um mal-estar generalizado. A imagem que fica é a de que as coisas estão fora do lugar. Contraditoriamente, o desempenho das instituições gera a sua própria rejeição, notadamente daqueles que, momentaneamente, estão do lado perdedor, que apresentam mais dificuldades de se distanciar para ter uma noção mais ampla da trajetória que o país se move.

O conjunto de informações – decorrente da ação das instituições políticas – termina por diminuir o suporte e a confiança que a população tem do governo e, em alguns casos, das suas próprias instituições democráticas. A atuação das instituições democráticas, portanto, pode ter o efeito colateral de diminuir a esperança das pessoas de que elas sejam capazes de resolver os seus problemas.

Mas, mesmo diante dessas frustrações, não enxergam alternativas à democracia, ainda que não se percebam satisfeitos com a atuação das instituições democráticas.

*CIENTISTA POLÍTICO E PROFESSOR TITULAR DA ESCOLA BRASILEIRA DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E DE EMPRESAS (FGV EBAPE)

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