Folha de S. Paulo
Origem do juiz de garantias está em acordos
internacionais dos quais o país é signatário desde os anos 1990
Está evidente que a democracia é um regime político que pode ser corroído
por dentro.
A celeridade no avanço da chamada minirreforma eleitoral é um exemplo. Numa
tacada, fragiliza o poder de fiscalização e controle da Justiça Eleitoral sobre os gastos de dinheiro público
pelos partidos políticos, além de flexibilizar as regras criadas para ampliar a
diversidade de candidaturas de mulheres e de negros nos pleitos
nacionais. Mas não o único.
Difícil pensar em democracia num cenário em que a maioria da população se
encontra alijada do exercício pleno da cidadania por uma "questão de
cor". Ou quando a presença de uma pessoa negra em espaço de poder causa
estranhamento e é motivo de debate sobre merecimento em pleno 2023. Ou onde o
risco de um negro ser assassinado é três vezes maior e um jovem preto ou pardo
é morto a cada 23 minutos.
Nesse contexto, o jurista Hédio Silva
Júnior crê que a figura do juiz de garantias, aprovado recentemente pelo STF, possa
significar "um freio na carnificina da juventude negra".
É que a polícia será obrigada a enviar ao Judiciário o
auto de resistência (registro sobre mortes em decorrência de atividade policial
sob a alegação de legítima defesa). Além disso, terá de acionar um perito
obrigatoriamente —o que já deveria ser óbvio.
Para ter noção da importância da preservação da cena de um crime, não é preciso
ser especialista em coisa alguma. Basta bom senso ou apenas ter assistido a um
episódio qualquer de série criminal para saber que o morto tem muito a dizer.
Ao alterar a posição de um cadáver, se está interferindo na investigação...
A origem do juiz de garantias está em acordos internacionais dos quais o país é
signatário desde os anos 1990. Mas pode-se dizer que a revelação das supostas ilegalidades
cometidas pela força-tarefa da operação Lava Jato foi a gota d’água. Afinal, um sistema
acusatório só será democrático na medida em que o acusador não tiver interesse
na causa.
Nenhum comentário:
Postar um comentário