O Globo
O agro está no rol dos adversários da
esquerda dominante no governo Lula. Incluindo o presidente. Um baita equívoco
Em qualquer país, o governo, seja de
direita ou de esquerda, comemora quando há crescimento do Produto Interno
Bruto. Lógico. É tudo de bom — emprego, renda, oportunidades. Pois, nesta
semana, o IBGE informou que o PIB brasileiro
cresceu 1,9% no primeiro trimestre em relação ao período anterior, resultado
expressivo e bem acima das expectativas. Tanto que os analistas elevaram a
perspectiva de expansão neste ano para acima dos 2%, o dobro do que se
calculava no início de 2023.
O governo e seus aliados não comemoraram. Em alguns setores, notou-se até mesmo um certo desconforto. Há um motivo técnico. O resultado do primeiro trimestre foi puxado pela agropecuária, com uma surpreendente e espantosa expansão de 21,6%, sempre na comparação com o último trimestre do ano passado.
Os demais setores mostraram números
modestos (expansão de 0,6% em serviços e estabilidade na indústria). Além
disso, o agronegócio flutua bastante no ano, conforme o andamento das safras.
Não é possível crescer assim em todos os trimestres. De todo modo, continua
sendo bom. O agro brasileiro hoje é alta tecnologia em genética, máquinas,
fertilizantes. Puxa crescimento em vários segmentos industriais e de serviços.
Qual o problema?
Simples. O agro está no rol dos adversários
da esquerda dominante no governo Lula. Incluindo o presidente.
Um baita equívoco.
O pensamento conservador ou de direita é
dominante no pessoal da agropecuária. Tem bolsonaristas e desmatadores. Tem uma
bancada ruralista no Congresso que é, na maioria, oposição a Lula. Mas a maior
parte da produção brasileira — e bota maior nisso — é correta e sustentável
pelos padrões internacionais. Tanto que exporta para o mundo todo.
Um governo, digamos, normal trataria de
apoiar esse setor. Politicamente, o correto seria separar líderes políticos da
extrema direita de toda uma área da economia que gera benefícios para todo o
país. Mas não aqui, não neste governo. E aí dá o “azar” de ver o agro
estourando. Difícil comemorar.
Há outro motivo subjacente para o
desconforto com o PIB forte: a batalha com o Banco Central. O Comitê de
Política Monetária do BC (Copom) tem mantido a taxa básica de juros no nível,
elevado, de 13,75% ao ano. Segundo o presidente do BC e do Copom, Roberto
Campos Neto, a inflação brasileira mostra-se resiliente por causa, entre outras
coisas, de uma demanda geral aquecida. Entram aqui os gastos do governo e o
consumo das famílias.
Os ministros Haddad e Simone Tebet têm
repetido que não há inflação de demanda e que o governo promove ajuste fiscal.
Logo, arrematam, o BC deveria reduzir os juros imediatamente.
E aí vem um Pibão.
Foi o agro — dos inimigos! Vá lá, mas,
mesmo retirando da conta esse setor, continua havendo crescimento — e da
demanda. Segundo analistas de fora do governo, o nível de emprego é bom para o
momento, e os programas de transferência de renda sustentam o consumo de bens e
serviços. E tudo isso a três semanas da próxima reunião do Copom. Daí o
desconforto.
Uma bobagem. No terreno específico da
política econômica, há argumentos para defender uma redução da taxa de juros
mais rápida do que o BC tem indicado. No mercado financeiro, muita gente já
antecipa essa queda da taxa básica. Nas transações com papéis de vencimento
mais longo, o mercado já reduziu os juros — os “juros futuros” —
acentuadamente.
Em resumo, o governo tem um aliado de fato
em boa parte do mercado. Assim como no agro. Mas o mercado é tão ou mais
inimigo que o agro. Essa distorção ideológica aparece em toda parte. Ainda
ontem, em evento na Universidade Federal do ABC, Lula disse que a educação é
base do desenvolvimento, devendo receber muito investimento público.
Óbvio.
Mas a questão não é essa. É esta: por que o
ensino público, sobretudo nos níveis fundamental e médio, falha tão
escandalosamente? Mesmo tendo recebido investimentos? Sistema de ensino
equivocado? Professores mal remunerados? Não, diz Lula. É porque as elites não
querem que os pobres aprendam.
Aí fica difícil.
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