domingo, 24 de março de 2024

Hélio Schwartsman - Olhe de novo

Folha de S. Paulo

Livro destrincha os efeitos psicológicos da habituação e defende que aprendamos a nos desabituar

A Lava Jato não passa de uma criação da CIA. Essa asserção e variantes são demonstravelmente falsas, mas petistas as repetem tão amiúde que já há quem as tome por verdadeiras. O nome do fenômeno é "efeito da verdade ilusória", que pode ser definido como a tendência de acreditar que informações falsas estão corretas após exposição repetida. Incrivelmente, funciona.

"Look Again" (olhe de novo), de Tali Sharot e Cass Sunstein, explica essa e outras facetas da habituação, um dos mais fascinantes atributos da psique humana. Tecnicamente, a habituação é uma forma de aprendizado, caracterizada pela diminuição da intensidade com que respondemos a um estímulo à medida que a exposição se prolonga. A habituação é uma bênção e uma maldição.

Sharot e Sunstein explicam as bases evolutivas e biológicas da habituação e mostram como ela está envolvida em quase tudo o que fazemos. É ela que permite que nos adaptemos a novas realidades. Mas também é o mecanismo por trás da própria insatisfação humana: nós rapidamente nos acostumamos às coisas boas em nossas vidas e deixamos de valorizá-las.

Os autores sustentam que precisamos aprender a nos desabituar. Em várias circunstâncias, fazê-lo pode significar extrair mais prazer de nossas atividades, nos livrar de fatores de estresse e até inovar mais.

Sharot e Sunstein passam sua mensagem num texto cheio de boas histórias, muitas delas surpreendentes. "Högertrafikomläggnigen" é a palavra sueca para designar "desvio do tráfego para a direita". É como ficou conhecido o dia 3 de setembro de 1967, quando a Suécia trocou a mão inglesa pelo sistema vigente no restante da Escandinávia. As autoridades esperavam um aumento nos acidentes, mas o que se constatou foi uma redução.

A explicação? A desabituação levou os motoristas suecos a ficarem mais atentos. O efeito durou dois anos. Depois houve nova habituação e os acidentes voltaram às taxas basais.

 

Um comentário:

ADEMAR AMANCIO disse...

Muito bom o artigo.