Troca de comando na Petrobras traz volta ao passado
O Globo
Ao escolher Chambriard, Lula insiste em
retomar as políticas fracassadas dos tempos de Dilma
Seria enganoso acreditar que a troca de comando na Petrobras tenha sido consequência apenas de intrigas palacianas ou divergências a respeito da distribuição de dividendos. Foi o presidente Luiz Inácio Lula da Silva quem decidiu substituir o ex-presidente Jean Paul Prates por Magda Chambriard, ex-funcionária de carreira da petroleira e diretora-geral da Agência Nacional do Petróleo (ANP) no governo Dilma Rousseff. O relevante e grave para o Brasil são as razões que motivaram a decisão. Ela é um sinal eloquente de intervenção do governo numa empresa aberta de capital misto, cuja motivação traduz o desejo de retomar as práticas dos tempos de Dilma, de tão traumáticas lembranças. Não há como evitar falar em retrocesso.
A reação dos agentes financeiros foi
imediata. Nesta quarta-feira, a estatal perdeu R$ 34 bilhões em valor de
mercado, puxando a Bolsa para baixo. Como revelou
a colunista do GLOBO Malu Gaspar, Lula pretende que Chambriard
acelere investimentos em refinarias, encomendas de navios e tente manter
controle sobre o preço dos combustíveis, estratégias adotadas em governos
anteriores do PT que já deram muito errado. A avaliação era que Prates não vinha
dando a urgência desejada aos planos do governo. Na visão intervencionista de
Lula, a petroleira deve ser um braço do Executivo para estimular empregos em
setores tidos como estratégicos e para segurar a inflação via controle de
preços — mesmo que tudo isso seja artificial, represente perdas bilionárias
para a companhia e crie distorções na economia.
As evidências da volta ao passado estão até
no vocabulário. Em conversa com Lula nos últimos dias, Chambriard prometeu
acelerar projetos “estruturantes”, como a retomada de investimentos em
refinarias como Abreu e Lima, em Pernambuco, e Complexo Petroquímico do Rio de
Janeiro (Comperj), rebatizado de Polo GasLub.
Abreu e Lima entrou para a História como um
dos maiores focos de corrupção desmascarados pela Operação Lava-Jato e como um
sorvedouro insaciável de recursos públicos (orçada em US$ 2 bilhões, consumiu
US$ 22 bilhões e não foi completada). O Comperj, lançado no segundo governo
Lula em 2008, deveria ter entrado em operação quatro anos depois. Também foco
de desvios, acabou paralisado em 2015. Entre 2017 e 2018, o plano de construir
uma refinaria foi adaptado para uma unidade de processamento de gás natural. Com
a volta de Lula ao poder, a Petrobras retomou a ideia de investir no refino. Há
duas semanas, lançou processo de licitação de obras para construção e
finalização da infraestrutura. Sabe-se lá quando serão finalizadas e a que
custo.
Nas administrações do PT entre 2003 e 2015, a
Petrobras gastou US$ 100 bilhões para ampliar a capacidade de refino do país em
400 mil barris diários. A quantia é uma fábula quando comparada aos US$ 24,7
bilhões investidos entre 1954 e 1999 para refinar uma quantidade de petróleo
cinco vezes maior. Chambriard conhece o setor, é “do ramo” e assumirá uma
Petrobras em grave crise de reputação. Ou desconsiderará análises técnicas para
obedecer ao chefe — e, assim, aprofundará os retrocessos que começaram na gestão
Prates —, ou então criará novo conflito com quem tem a última palavra no
Palácio do Planalto. Nenhum dos cenários é bom para o Brasil.
Recursos para Rio Grande do Sul são
essenciais, mas é preciso haver controle
O Globo
Histórico das tragédias nacionais recomenda
atenção para desvios no uso de verbas emergenciais
Executivo e Legislativo têm sido diligentes
ao destinar recursos ao Rio Grande do Sul, às voltas com caos e devastação sem
precedentes depois da tragédia das enchentes. O Congresso
aprovou Projeto de Lei Complementar suspendendo por três anos o pagamento da
dívida dos gaúchos com a União e reduzindo a zero a taxa de juros no período. Estima-se
que, com a medida, o estado deixe de gastar R$ 11 bilhões com a dívida e R$ 12
bilhões com juros. O presidente
Luiz Inácio Lula da Silva anunciou ontem um auxílio de R$ 5 mil a famílias de
baixa renda e a inclusão da população vulnerável no Bolsa
Família. O governo também destinará verbas para financiar imóveis e concederá
crédito a empresas e produtores rurais.
É sensata a ajuda de todo tipo ao povo
gaúcho. Os números são eloquentes. Até quarta-feira, a tragédia que atingiu 90%
dos municípios do estado já deixara quase 150 mortos, mais de cem desaparecidos
e mais de 600 mil fora de casa. A infraestrutura foi destruída em várias
cidades. Pontes, estradas, escolas, hospitais precisarão ser recuperados.
Bairros terão de ser realocados ou reconstruídos. Fazendas foram arrasadas,
fábricas ficaram debaixo d’água, comerciantes perderam seus estoques.
Mas é preciso haver controle rigoroso sobre o
uso dos recursos. O próprio projeto que suspende o pagamento da dívida do
estado com a União afirma que o dinheiro economizado só poderá ser aplicado em
ações de enfrentamento à calamidade e suas consequências. Diante das carências,
não faltarão projetos para recebê-lo, mas órgãos de controle e fiscalização
terão de acompanhar os gastos. O histórico de tragédias nacionais recomenda
atenção no uso de verbas emergenciais.
Depois das chuvas que devastaram a Região
Serrana do Rio em 2011, os casos de incúria se multiplicaram com a chegada dos
recursos para reconstrução. Como mostraram reportagens do GLOBO, a taxa de
propina nas obras — muitas sem licitação devido à urgência — saltou de 10% para
50%. Os escândalos chocaram a sociedade e levaram à queda de vários prefeitos
da região.
Na pandemia de Covid-19, também foram
registrados inúmeros casos de malversação de recursos emergenciais que deveriam
ter sido destinados a atendimento aos doentes. A roubalheira não poupou nem a
compra de respiradores, equipamento essencial para socorrer pacientes graves.
Na profusão de malfeitos, houve quem encomendasse insumos hospitalares em casa
de vinho.
Não há dúvida de que o Rio Grande do Sul
precisará de recursos robustos para a reconstrução. O governador Eduardo Leite
(PSDB) estimou a necessidade em pelo menos R$ 19 bilhões. Executivo e
Legislativo têm agido com presteza para liberar ajuda. A partir de agora,
caberá aos órgãos de controle e à própria sociedade fiscalizar o uso do
dinheiro público. Solidariedade é fundamental. Controle sobre os gastos também,
para que a população não seja punida duas vezes.
Guerra sem fim
Folha de S. Paulo
Com nova ofensiva na Ucrânia, Putin muda
comando da Defesa e eleva gasto militar
Vladimir
Putin inaugurou seu quinto
mandato como presidente da Rússia com um pacote de surpresas.
Na sexta (10), lançou ofensiva no norte da Ucrânia,
mirando a região de Kharkiv, ao avançar sobre as defesas com velocidade
inaudita desde o início do conflito em 2022.
Seu objetivo é ora insondável, se subjugar
Kharkiv, uma missão difícil, ou criar um cordão sanitário para impedir
lançamento de mísseis ucranianos contra o sul da Rússia.
Certo é que a ação drenou recursos humanos e
materiais de Kiev em toda a linha de frente de 1.000 km e expôs áreas sob
ataque a novos avanços. O pânico se espalhou, e o presidente Volodimir
Zelenski teve de cancelar viagem ao exterior.
Os EUA despacharam seu secretário de Estado,
Antony Blinken, para prometer apoio e armas que, por motivos paroquiais no
Congresso americano, só foram liberadas em abril e ainda não chegaram.
Blinken foi além, sugerindo que o eventual
emprego delas contra território russo, um tabu ocidental dado o risco de
escalada, é decisão privativa do aliado
Em meio a esse cenário, Putin colocou na mesa
carta ainda mais bombástica no domingo (12): promoveu
a ministro da Defesa um economista keynesiano chamado Andrei Belousov,
que o assessorou ao longo dos anos.
Ele ocupa agora o lugar de Serguei Choigu,
que dirigia o órgão havia quase 12 anos e comandou a invasão do vizinho, mas
fracassou em vencê-lo rapidamente. Ainda é incerto se Choigu, que foi para o
posto de um aliado linha-dura de Putin no Conselho de Segurança do país, irá
reter influência.
Já o presidente foi claro acerca do papel de
Belousov. Nesta quarta (15), ao anunciar um gasto militar recorde no período
pós-Guerra Fria, de 8,7% do
PIB neste 2024, afirmou que "a relação entre canhão e manteiga
deve ser integrada organicamente à estratégia geral de desenvolvimento do
Estado russo".
Ou seja, Putin quer uma economia militarizada
por longo prazo, para o embate existencial com o Ocidente que já anunciou em
outras ocasiões. Considerando o poderio nuclear do Kremlin e a possibilidade de
choques imprevistos, trata-se de perspectiva temerária.
Programa econômico de Lula é o atraso
Folha de S. Paulo
Demissão de Prates na Petrobras mostra
presidente empenhado em repetir o que deu errado nas gestões petistas
anteriores
Luiz Inácio Lula da
Silva (PT),
para a surpresa de ninguém, demitiu Jean
Paul Prates da chefia da Petrobras porque o defenestrado não
cumpriu, com a velocidade e a fidelidade canina exigidas pelo mandatário, a
missão de submeter a
estatal aos comandos do bestiário ideológico petista.
Para o chefe de Estado, não bastou Prates já
ter descarrilhado a política de preços da Petrobras, reestabelecendo defasagens
significativas em relação aos praticados internacionalmente. Era necessário
afundar o pé no acelerador de projetos ruinosos, considerados estratégicos pelo
mandachuva petista.
Lula faz campanha pela retomada vertiginosa
de obras no Rio de
Janeiro e em Pernambuco, empreendimentos que entraram para os
anais da indústria petrolífera mundial pelos desembolsos estratosféricos,
irrecuperáveis, e pela corrupção desabrida.
O presidente também faz carga pela entrada da
estatal em projetos bilionários nas áreas de fertilizantes e de construção de
navios no Brasil. Encampa, assim, a plataforma de repetir tudo o que deu errado
nos seus dois mandatos anteriores e na desastrosa passagem da
correligionária Dilma
Rousseff pelo Palácio do Planalto.
As consequências negativas do
intervencionismo que assoma das catacumbas serão duradouras. A deterioração
manifesta-se no banho de
sangue nas ações da estatal nesta quarta-feira (15), mas não apenas
nesse indicador arisco.
Torrar recursos em novas aventuras de retorno
improvável vai reduzir a lucratividade da empresa, deprimindo os repasses de
dividendos ao Tesouro Nacional, seu principal acionista, que não deveria perder
oportunidades de reduzir o seu rombo fiscal.
A invectiva na Petrobras —a repetir, em novo
contexto, o intervencionismo tosco de Jair Bolsonaro (PL), que empilhou quatro
presidentes na estatal— insere-se num conjunto de atitudes nefastas da
administração petista na condução da política econômica.
Lula não faz questão de esconder que mandou
às favas a preocupação com o equilíbrio orçamentário e ninguém se surpreenderá,
infelizmente, se indicar um cupincha para presidir o Banco Central com
a ordem de baixar juros na
marra.
A bagunça e a incerteza que o mandonismo
voluntarista produzem no ambiente e nas instituições econômicas vão dificultar
o crescimento sustentado da renda e do emprego. O fiasco dos investimentos na
produção de bens e serviços responde a esses estímulos irresponsáveis do chefe
do governo.
O programa econômico de Lula e do PT é o atraso, e seu vulto empobrecedor vai-se tornando cada vez mais nítido conforme progride o mandato presidencial.
Lula, o CEO da Petrobras
O Estado de S. Paulo
Magda Chambriard será a sexta executiva em
menos de seis anos a ocupar a presidência da Petrobras, um cargo que Lula,
assim como Bolsonaro antes dele, imagina ser seu por direito
A demissão de Jean Paul Prates da presidência
da Petrobras revelou que o verdadeiro CEO da empresa se chama Luiz Inácio Lula
da Silva e assim permanecerá até o fim de 2026. Magda Chambriard, indicada para
ser a próxima preposta, será apenas a tarefeira de Lula em seu plano de
financiar a indústria naval, produzir fertilizantes, controlar o preço dos
combustíveis, investir em estaleiros e bancar a tresloucada política
desenvolvimentista lulopetista da forma que produzir maiores dividendos
eleitoreiros.
A bem da verdade, Prates não se interpôs aos
anseios do chefe em praticamente nenhum desses quesitos. Mas teve o demérito de
tentar privilegiar também os investidores na questão da distribuição de
dividendos extraordinários, que Lula tentou reter, sabe-se lá com qual
intenção. Além, é claro, de partir para o confronto com o Centrão do ministro
das Minas e Energia, Alexandre Silveira, ungido por Lula da Silva como um de
seus principais assessores, ao lado do ministro da Casa Civil, Rui Costa.
Irritado e em busca de mais poder na estatal
– sim, a Petrobras até pode ser uma empresa de economia mista por direito, mas,
de fato, continua controlada pelo Estado –, Silveira reclamou da morosidade de
Prates no financiamento da agenda do governo e venceu a disputa por poder que
se arrastou por mais de um ano. A mensagem de Prates em um grupo de WhatsApp,
providencialmente vazada, não deixa dúvidas sobre o caráter político da
decisão: “Minha missão foi precocemente abreviada na presença regozijada de Alexandre
Silveira e Rui Costa”.
Lula da Silva quer avançar sobre a Petrobras
desde o início de seu terceiro mandato, derrubando importantes obstáculos
erguidos justamente para reduzir a ingerência política na empresa. Para isso
contou com a subserviência de Prates, inclusive para mexer no estatuto e
derrubar a política de paridade de preços, que vinculava o preço dos
combustíveis às oscilações internacionais. Mas essa mudança talvez não tenha
dado o retorno que Lula esperava.
Todos os ingredientes postos na bagunça
promovida pelo governo Lula da Silva na condução da Petrobras remetem
perigosamente a um enredo de abusos e corrupção conhecido por todos, resumido
no escândalo do petrolão: disputa de políticos por cargos e poder de
influência, obras superfaturadas, estímulo desnecessário à construção de navios
e uso da Petrobras como alavanca de programas sociais do governo.
Nas gestões anteriores do PT, essa mistura de
interesses estranhos ao negócio da empresa levou à formação de um cartel de
empreiteiras que, entre 2004 e 2012, levou a um prejuízo comprovado pelo
Tribunal de Contas da União (TCU) de R$ 18 bilhões (valor de 2020, época do
estudo). Mas não foi apenas nem principalmente corrupção que arruinou a
Petrobras naquela época, e sim o desvirtuamento de sua administração para fins
políticos, eleitorais e ideológicos – que gerou imensos prejuízos ao País,
pagos pelo contribuinte. É precisamente esse status que Lula pretende
restabelecer.
O demiurgo petista parece determinado a fazer
da Petrobras uma poderosa fonte de recursos à margem do Orçamento para custear
projetos mirabolantes e comprovadamente fadados ao fracasso – como o que
distribuiu contratos vultosos da companhia a 19 estaleiros espalhados pelos
País, 5 deles estreantes, que tiveram obras garantidas antes mesmo de
existirem.
Magda Chambriard, a escolhida por Lula para
chefiar a Petrobras em seu nome, é do ramo. Funcionária de carreira da empresa,
é especialista em engenharia do petróleo e foi diretora-geral da Agência
Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). Ou seja, currículo
tem, mas todos sabem que não foi isso o que pesou em sua escolha, e sim sua
suposta disposição para fazer o que Lula mandar.
A julgar pelo que a sra. Chambriard escreveu
num artigo na revista Brasil Energia, publicado em dezembro do ano passado,
Lula ficará feliz. Além de demonstrar entusiasmo pela ideia de reativar
estaleiros, a nova executiva diz ali que “a estatal não poderia ter a dimensão
atual sem a mão forte de um governo que a fez crescer de tamanho abruptamente”
e que se espera que a empresa e o governo “retribuam o esforço da sociedade em
seu benefício”, inclusive na luta pela “redução das desigualdades”. Logo se vê
que, sob nova direção, o core business da Petrobras não será petróleo, e sim
demagogia.
O pessimismo dos cientistas climáticos
O Estado de S. Paulo
Especialistas já não têm grandes esperanças
de que mundo cumprirá a meta de temperatura global, o que amplia o desafio de
reduzir os danos ambientais para mitigar os desastres naturais
Alguns dos cientistas climáticos mais
renomados do mundo estão clamando por urgência. Para a maioria deles, a meta de
1,5°C para limitar o aquecimento global até 2030, como definido pelos países no
Acordo de Paris, poderá ficar inviável ainda nesta década, segundo mostrou um
levantamento realizado junto a especialistas que integram o Painel
Intergovernamental da ONU para Mudança do Clima (IPCC). Realizada pelo jornal
britânico The Guardian, a consulta aos pesquisadores mostrou que quase 80%
deles preveem um aquecimento de pelo menos 2,5°C, enquanto apenas 6% afirmaram
que o limite de 1,5°C será cumprido. Tal pessimismo é resultado tanto da
trajetória do aquecimento global nas últimas décadas quanto da resposta
empreendida pelos governos para reduzir as emissões de gases de efeito estufa.
Mais de 30 anos após a assinatura da
Convenção-Quadro da ONU sobre Mudança do Clima – uma recomendação do IPCC que
definiu a base para a cooperação internacional sobre as questões relacionadas
ao aquecimento global –, e nove anos depois do Acordo de Paris, a insuficiência
da resposta parece ser um consenso, ainda que a severidade os efeitos gere
divergências. Acordada em 2015 por mais de 195 países, a meta de limitar o
aumento das temperaturas globais a 1,5°C (comparada com níveis préindustriais)
vem sendo perseguida desde então. Diferentes evidências mostram, no entanto,
que há riscos de o mundo ultrapassar esse limiar. É uma discussão que divide a
comunidade científica, inclusive sobre qual impacto cada fração a mais, ou a
menos, exercerá sobre o planeta.
É muito mais uma meta política, ainda que
ancorada em evidências científicas. Não está escrito nas estrelas, portanto,
que descumpri-la resultará no apocalipse. Há quem preveja, para usar uma
expressão de um cientista envolvido nos relatórios do IPCC, um futuro
“semidistópico”, como fome, conflitos e migração em massa, impulsionados por
ondas de calor, incêndios florestais, tempestades e enchentes – como a do Rio
Grande do Sul. Mas, no caso, é a política, conjugada com os cálculos e
projeções da ciência, que pode fazer a diferença para um futuro com mais ou
menos catástrofes naturais, climáticas e ambientais. Os relatórios do IPCC
estão no olimpo das análises sobre mudanças climáticas. Em geral são avaliações
aprovadas pelos governos. E, como descreveu o Guardian, suas evidências
demonstram que muitas das pessoas mais bem informadas do planeta esperam o caos
climático.
Um relatório de 2022 mostrou, por exemplo,
que diante de um aquecimento de 1,5°C, cerca de 350 milhões de pessoas estarão
expostas à escassez de água devido a secas severas. Com 2°C, esse número sobe –
e outros milhões estarão expostos a ondas de calor extremas. Aumento das chuvas
torrenciais e furacões, redução do gelo e clima desértico em alguns países são
algumas das projeções realizadas pelos cientistas. O melhor é não pagar para
ver: cada fração de grau evitada na temperatura global pode reduzir o nível dos
problemas no futuro.
Esse é um desafio gigantesco para a ciência,
para os governos e, sobretudo, para as finanças globais. Com as projeções
atuais, o financiamento climático global precisará ampliar para cerca de US$ 9
trilhões por ano até 2030, acima do quase US$ 1,3 trilhão em 2021-2022, de
acordo com um relatório do Climate Policy Initiative. Não se trata de um número
aleatório: são cálculos realizados a partir das mudanças que o novo clima
exigirá. Para citar um exemplo, a International Renewable Energy Agency
(Agência Internacional de Energias Renováveis) estima a necessidade de gerar
anualmente, até 2030, 1.000 gigawatts de capacidade de energia renovável. Sem
falar na adaptação da infraestrutura das cidades, na maior eficiência em
energia de edificações e na restauração de ambientais naturais, como a
reconstrução das cidades destruídas pelas chuvas no Rio Grande do Sul.
Exatamente por não ser fácil nem barato que
metas e acordos políticos – mesmo se não cumpridos – são fundamentais. É uma
forma de o mundo ter parâmetros, limites e responsabilidades, de modo a
dimensionar fracassos, mensurar avanços e, afinal, saber quem está sendo mais
ou menos negligente com a humanidade.
Os ruídos no Banco Central
O Estado de S. Paulo
Tecnicamente, a ata entregou as explicações
esperadas. Politicamente, o BC ainda parece ter mais a dizer
ata do
Comitê de Política Monetária (Copom) dissipou as dúvidas do mercado de que o
Banco Central (BC) estaria disposto a adotar uma postura mais leniente com a
inflação. O tom do documento foi considerado duro e houve um esforço para
esclarecer as razões pelas quais quatro dos diretores – todos indicados pelo
presidente Lula da Silva – votaram por uma redução maior da taxa básica de
juros.
Como esperado, a ala dissidente preferia
seguir o rumo sinalizado na reunião anterior, na qual o BC indicou a
possibilidade de uma última redução de 0,50 ponto porcentual (p.p.) na Selic.
Para esses diretores, por maiores que fossem as incertezas externas e
domésticas, a política monetária já estaria em nível suficientemente
contracionista, e o custo de mudar a sinalização anterior poderia ser elevado
demais.
Já os diretores que preferiram votar pela
redução de 0,25 p.p. reforçaram que o cenário mais benigno com o qual
trabalhavam até março não se confirmou. Ficou implícito, para esse grupo, que
as declarações dadas pelo presidente Roberto Campos Neto em um evento em
Washington, em abril, já eram uma indicação de que o BC não hesitaria em fazer
o necessário para levar a inflação à meta.
Tecnicamente, a ata entregou as explicações
esperadas e deixou a impressão de que os juros não mais cairão a um dígito,
dada a avaliação unânime sobre a necessidade de uma política monetária “mais
contracionista, mais cautelosa e sem indicações sobre os próximos passos”.
Politicamente, no entanto, o BC ainda parece ter algo a dizer, haja vista que
três integrantes do Copom saíram a público para fazer comentários adicionais
sobre a última reunião do Copom.
À Bloomberg, o diretor de Assuntos
Internacionais, Paulo Picchetti, sustentou que o comitê deveria “priorizar
mecanismos oficiais de comunicação” que resultam de “conversas entre membros do
conselho”, uma crítica não tão velada à atitude de Campos Neto.
Campos Neto, por sua vez, não escondeu o
desconforto. Na abertura da Conferência Anual do Banco Central do Brasil, em
Brasília, ele reforçou que as expectativas de inflação estão desancoradas e que
a política monetária não permite discussões sobre o centro e a banda da meta de
inflação. “Nossa meta é 3% e deveríamos persegui-la”, disse.
Já o diretor de Política Monetária do BC,
Gabriel Galípolo, provável sucessor de Campos Neto no cargo, contemporizou. Em
um evento em Nova York, endossou a declaração do presidente do BC sobre a
necessidade de firme persecução da meta, mas não deixou de dar razão a
Picchetti ao mencionar que Campos Neto não consultou os demais diretores antes
do discurso em Washington, que pavimentou a decisão adotada na última reunião
do Copom.
A piora nas expectativas, aliada ao conteúdo da última ata, já foi suficiente para o mercado ajustar suas posições – e já há quem espere que a Selic será mantida inalterada na próxima reunião, em junho. Fato é que o BC precisará aparar arestas e afinar sua comunicação antes disso – não para preparar o mercado para suas decisões, mas para preservar a credibilidade da instituição.
Planos do Planalto tendem a reviver a ‘velha’
Petrobras
Valor Econômico
Com preços domésticos dos produtos que vende parados e pesados investimentos a realizar, a lucratividade da empresa tenderá a cair de novo
Jean Paul Prates, ex-senador do Partido dos
Trabalhadores, teve o destino reservado ao de um presidente da Petrobras nos
dias de hoje - foi demitido pelo presidente da República após pouco mais de um
ano de mandato. Prates era alinhado às diretrizes do Planalto, mas não inteira
e satisfatoriamente alinhado. Cumpriu suas primeiras missões, como acabar com a
fórmula de reajustes de preços em paridade com as cotações internacionais -
desde outubro os preços domésticos não se moveram. Foi retirado do comando da
maior estatal do país com o pretexto de desavenças com o ministro de Minas e
Energia, Alexandre Silveira, e com o ministro da Casa Civil, Rui Costa. Era
criticado por “não entregar resultados”, mesmo após ter apresentado o segundo
maior lucro da companhia em sua história no ano passado. Por trás disso, estava
o interesse do governo de usar a estatal de modo intervencionista.
A disputa sobre a distribuição dos R$ 43,9
bilhões de dividendos selou seu destino, ainda que a solução por ele proposta,
de repartição de 50%, pela qual foi finalmente punido, fosse adotada. Os
resultados a que o presidente Lula, Silveira e Costa se referem não têm nada a
ver com o desempenho econômico-financeiro da empresa, mas com os objetivos
políticos do governo, que mais uma vez atropelaram o comando da estatal e
regras de governança de uma S.A. A ideia, velha e errada, na cabeça do
presidente Lula é tornar a Petrobras a indutora do crescimento nacional com
projetos de viabilidade econômica mais que duvidosa e financiamentos camaradas.
Pela experiência do passado das gestões de Lula e Dilma Rousseff, esses
projetos foram vorazes dilapidadores de recursos.
Lula nomeou Magda Chambriard, ex-funcionária
da Petrobras e ex-diretora-geral da Agência Nacional do Petróleo (ANP) no
governo de Dilma Rousseff, no lugar de Prates. Como ele, Chambriard participou
da equipe de transição de governo para a área de energia e, tanto em conversas
com ministros de Lula quanto em artigos publicados, está de pleno acordo com os
planos que o governo quer que a Petrobras execute. São os mesmos de sempre dos
governos petistas, que afundaram junto com o mar de corrupção que quase arruinou
a Petrobras e alimentou a Operação Lava-Jato.
Chambriard, ao que tudo indica, seguirá orientações do Planalto, para acelerar projetos “estruturantes”, entre eles a Refinaria Abreu e Lima, inconclusa em seu desenho original depois de US$ 18 bilhões (R$ 90 bilhões) enterrados ali - custo orçado originalmente em US$ 2,3 bilhões. Nos planos da Petrobras, para atingir a capacidade de 230 mil barris por dia, estão reservados investimentos adicionais de R$ 6 bilhões a R$ 8 bilhões. O Complexo Petroquímico do Rio (Comperj), paralisado pela roubalheira e tido como antieconômico no governo Michel Temer, tinha custo estimado original de US$ 6,1 bilhões, mas já consumira US$ 13,5 bilhões em 2014, um ano antes de o projeto ser interrompido.
O presidente Lula pretende reanimar os
estaleiros nacionais com encomendas de embarcações pela Petrobras, com
financiamentos não se sabe a que taxas do BNDES. O histórico petista dessa
tentativa, ao qual se lançará novamente, é o de um fracasso absoluto, tanto
pelos preços domésticos muito superiores aos dos concorrentes externos como
pela má administração, mau planejamento e corrupção incontida. “Aguarda-se
pelos estaleiros lotados, conforme promessa da empresa, veiculada por diversos
veículos da mídia especializada, em agosto de 2023”, escreveu Chambriard em 27
de novembro de 2023 na revista Brasil Energia.
Chambriard comandou a licitação de oito
blocos na Bacia da Foz do Amazonas e defende a exploração da Margem Equatorial,
como seu antecessor. Em artigo, vai mais longe e questiona atribuições legais
do Ibama. “O Ministério do Meio Ambiente será, de fato, o verdadeiro poder
concedente do país? A Presidência da República concorda com isso? (...) É nesse
contexto que se advoga a intervenção do Presidente da República. É ele que tem
mandato para estabelecer as prioridades nacionais, em nome do povo”, escreveu
em 14 de junho do ano passado.
A presidente indicada para a Petrobras
concordou em encerrar o PPI e é pouco provável que faça reajustes para cima nos
preços dos combustíveis a curto prazo, apesar das defasagens em dois dígitos.
Em suas disputas com Prates, Silveira reclamou da morosidade do então
presidente da estatal em reduzir preços e, com ênfase, dos baixos investimentos
em gás. Chambriard é favorável à ampliação desses investimentos, assim como dos
que serão destinados ao setor de fertilizantes.
A volta ao passado não é bom augúrio para a Petrobras. O lucro líquido da empresa declinou 24% no primeiro trimestre do ano em relação ao último de 2023 e 34% em relação ao primeiro do ano passado. Com preços domésticos dos produtos que vende parados e pesados investimentos a realizar, a lucratividade da empresa tenderá a cair de novo. Não é difícil antever que nos rumos da Petrobras, transformada em uma repartição do Planalto no Rio de Janeiro, haverá mais disputas com os acionistas minoritários, que têm interesse em que sua direção cumpra estritamente as regras de governança.
Intolerância religiosa não cabe no Brasil
plural
Correio Braziliense
O Brasil é um país plural, mas seu povo ainda
carece de praticar o respeito à diversidade e aos direitos humanos
Qual é o dano pessoal que a opção religiosa
de alguém pode causar ao próximo? A indagação se impõe diante da reação de pelo
menos 200 mil brasileiros que deixaram de ser seguidores da cantora Anitta. Ela
revelou ao público que aderiu ao candomblé, expôs a sua iniciação na
afrorreligiosidade e tornou-se alvo da intolerância religiosa. Foi o suficiente
para o afastamento dos fãs e de ácidas críticas por meio das plataformas
digitais. Mas as ofensas não suprimem o valor artístico da cantora, uma
celebridade do funk carioca, com valores reconhecidos nacional e
internacionalmente.
A intolerância religiosa é lamentável
comportamento que se arrasta desde o século 16, quando chegaram ao país os
primeiros grupos de negros sequestrados em vários povos do Continente Africano,
para serem escravizados no Brasil, pelos colonizadores europeus. Nos tribunais
de Justiça do país, as ações motivadas por intolerância religiosa somam 33%
(176 mil) entre as relacionadas ao racismo, segundo levantamento da startup Jus
Racial. A instituição constatou que no Supremo Tribunal Federal (STF), a
intolerância religiosa representa 43% de 1,9 mil processos contra o racismo.
A reação dos (ex) fãs de Anitta é mais uma
demonstração da repulsa de parcela da sociedade aos valores dos legados
africanos. Trata-se de comportamento recorrente no país. A demonização do povo
negro e de sua religiosidade está ancorada no racismo. Enquadra-se entre as
afrontas à Constituição de 1988, que garante a liberdade religiosa no país, a
igualdade de direitos a todos os cidadãos, independentemente da origem
étnico-racial. Ofende também o arcabouço legal dos direitos humanos. Porém,
nenhum marco legal tem conseguido impedir a violência contra as instituições e
aos adeptos das religiões de matrizes africanas. Denúncias levadas aos fóruns
internacionais de direitos humanos também não surtem efeito mitigador desse
comportamento.
Nas religiões de matrizes africanas, não há
restrições ao gênero, à cor da pele, à condição socioeconômica, ao status
social, ao grau de escolaridade e a tantos outros paradigmas que dividem a
sociedade em castas e motivam disputas por espaços, muitas vezes, insanas e
mortais. Entendem como fundamentais o respeito entre as pessoas, a preservação
da vida, o direito de escolha, inclusive, religiosa, de pensamento, de
expressão. A ausência de preconceitos é uma das razões que tem elevado o número
de adeptos aos terreiros.
A falta de letramento racial está entre as
causas do racismo e das atitudes violentas, preconceituosas e intimidadoras
contra os adeptos do candomblé e da umbanda em todo o território nacional. A
Lei nº 10.639/2003, que tornou obrigatório o ensino da história e cultura
afro-brasileira e africana em todas as escolas públicas ou particulares, desde
o ensino fundamental até o ensino médio, não é cumprida. A educação é uma das
formas mais eficazes de quebrar os estigmas, forjados em inverdades,
consolidados em relação ao povo negro, suas culturas, práticas de fé, hábitos e
costumes.
A hegemonia das vertentes de religiões cristãs não autoriza uma cruzada racista, intolerante, agressiva e violenta contra pretos e pardos nem contra a afrorreligiosidade. Há espaço para todas no país, sob o manto da Constituição Cidadã. O Brasil é um país plural, mas seu povo ainda carece de praticar o respeito à diversidade e aos direitos humanos.
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