Correio Braziliense
A mudança deve reacender o debate sobre a
política econômica, sob comando de Fernando Haddad, cuja orientação é
social-liberal
Bastou uma troca de comando para a Petrobras
perder R$ 35 bilhões em valor de mercado num só dia. Pode ser uma reação
natural dos investidores, que gostam de especular nestes momentos, ou uma
tendência de mudança de rumo da economia. É cedo para avaliar qual será o
desfecho da substituição do ex-senador petista Jean Paul Prates, que manteve
atuação relativamente independente, pela engenheira Magda Chambriard, também
petista, que já foi presidente da Agência Nacional de Petróleo (ANP).
A Petrobras encerrou o pregão desta quarta-feira com um valor de mercado de R$ 499 bilhões, contra R$ 548,5 bilhões de terça-feira, quando o presidente Lula convocou Prates para uma reunião. Na presença do ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, e do ministro da Casa Civil, Rui Costa, Lula comunicou sumariamente que precisava do cargo e que nomearia Magda para o comando da empresa. Magda Chambriard defende a expansão das áreas de refino e de produção de gás e também fala em incentivar a indústria naval, para aumentar a participação de empresas brasileiras no arranjo produtivo da companhia.
Magda tem 66 anos, é formada em engenharia
civil pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e mestre em engenharia
química. Também tem especializações em engenharia de reservatórios e avaliação
de formações, além de produção de petróleo e gás. Começou a trabalhar na
Petrobras em 1980 e atuou na área de produção por mais de 20 anos. Em 2002,
assumiu a assessoria da diretoria de Exploração e Produção da Agência Nacional
de Petróleo (ANP). Em 2008, assessorou a comissão interministerial criada pelo
presidente Lula para estudar as regras de exploração e produção das reservas de
petróleo e gás na área do pré-sal e, em 2012, assumiu a diretoria-geral da ANP,
onde permaneceu até 2016.
A mudança de comando da Petrobras deve
reacender o debate sobre a política econômica do governo, sob comando do
ministro da Fazenda, Fernando Haddad, cuja orientação é social-liberal. Essa
linha é muito questionada por dirigentes e parlamentares do PT e economistas
desenvolvimentistas, cuja principal expressão no governo é o presidente do
Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Aloizio
Mercadante. Esses setores defendem uma participação mais intensa da Petrobras
no desenvolvimento do país.
Acontece que a experiência do PT no comando
da Petrobras, nos governos Lula e Dilma Rousseff, foi desastrosa, por causa da
estratégia megalômana de expansão da empresa e os escândalos de corrupção, que
resultaram no chamado Petrolão e na Operação Lava-Jato. Os prejuízos da
Petrobras foram enormes, inclusive nos Estados Unidos, cujos fundos de pensão
estão entre seus maiores investidores. O caso da empresa Sete Brasil é o mais
escandaloso e um dos maiores fracassos de política industrial do país.
Capitalismo de Estado
Em recuperação judicial desde 2016, a Sete
Brasil pediu falência à Justiça, ao fim de um enredo de dívidas, má gestão e
escândalos de corrupção. Fundada em 2010, como um consórcio de grandes
acionistas privados, fundos de pensão e a Petrobras, a empresa deveria
gerenciar a compra e a operação de sondas para exploração de novas áreas. Das
28 sondas previstas, somente quatro entraram em operação. Deixou R$ 18 bilhões
de dívidas com bancos e investidores, além de processos contra executivos
acusados de corrupção.
Se o pedido de falência for aprovado, a
Petrobras, que vinha tentando recuperar pelo menos R$ 1 bilhão do que tem a
receber da Sete Brasil, deve esquecer esse dinheiro, assim como o FGCN, que
destinou R$ 6,3 bilhões à empresa, e o Fundo de Investimento do Fundo de
Garantia do Tempo de Serviço (FI-FGTS), responsável por um aporte de R$ 2,5
bilhões no negócio. Bancos e estaleiros contratados para construir as sondas
também estão com um mico na mão. Nos Estados Unidos, os fundos de pensão também
cobram o ressarcimento dos prejuízos.
Com a mudança de rumo da Petrobras, a
retomada do debate sobre capitalismo de Estado no Brasil será inevitável.
Durante o governo Dilma Rousseff, a chamada “nova matriz econômica”, que
fracassou e foi uma das causas de seu impeachment, resultou da reorientação do
papel do Estado na economia, em razão da crise de 2008, ainda no governo Lula
2. Houve maior participação do Estado em todas as áreas de atividades, com o
fortalecimento das estatais e dos bancos públicos.
Lula dá mostras de que pretende retomar o
desenvolvimento do país a partir da política que adotou no fim do seu segundo
mandato, quando ampliou o crédito ao consumidor e ao mutuário, aumentou o
salário mínimo, criou programas de transferência de renda direta, criou o PAC I
e o PAC II (lançado em 2010) e ampliou o leque de atuação do BNDES para
estimular o investimento tanto público quanto privado.
Também houve uma mudança significativa na
condução das empresas estatais (Eletrobras e Petrobras) e dos bancos públicos,
principalmente do BNDES, que passou a ser o motor da recuperação econômica. No
mundo acadêmico, o velho debate sobre a intervenção do Estado na economia
gravita em torno de três modelos bem-sucedidos: Cingapura, Estados Unidos e
China. Agora, esse debate transbordará para a política.
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Veremos.
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