Folha de S. Paulo
Livro combina ciência e filosofia para fazer
uma genealogia de instinto moral dos humanos
Gostei de "The Invention of Good and
Evil" (a invenção do bem e do mal), de Hanno Sauer. O livro é,
literalmente, uma genealogia da moral. O autor combina conhecimentos de
vários campos da ciência com
filosofia, a sua área de atuação, para nos contar como o instinto moral surgiu
em nossa espécie e se desenvolveu.
Sauer começa bem no começo, 5 milhões de anos atrás, quando, por alguma razão
geológica, nossos ancestrais se viram sem a proteção de uma frondosa cobertura
vegetal e se tornaram muito mais vulneráveis a predadores do que os primos chimpanzés.
Essa mudança alterou a matemática da sobrevivência. Para não perecer, eles tinham de cooperar com seus semelhantes numa escala inaudita para outros primatas. O instinto moral foi a resposta da evolução para esse problema.
O resultado, mensurável em nós, é que
conseguimos trabalhar bem até com desconhecidos, mas criamos defesas contra a
possibilidade de sermos explorados. Daí nosso tribalismo e nossa prontidão para punir trapaceiros.
Sauer continua em divisões por dez. Cerca de 500 mil anos atrás, começa a atuar
com força um processo de autodomesticação, que excluiu de nosso pool genético os
indivíduos mais propensos à violência e avessos à cooperação. Isso é visível na
neotenia que marca nossa espécie.
O autor segue nessa toada até chegar a 5 anos atrás, quando ganham destaque os
movimentos sociais que clamam por maior igualdade e as guerras culturais que
passaram a contaminar a política de vários países.
No meio do caminho, Sauer revela diferentes
facetas de nosso instinto moral. E o faz num diálogo produtivo com autores
contemporâneos como Steven Pinker, Jared Diamond, David Graeber, Joseph
Henrich, entre outros que estão mudando a forma como vemos a nós mesmos.
Acho que dá para dizer que Sauer é um otimista. Ele acredita que a moral mais
nos une do que nos separa e que nossas opiniões são mais maleáveis do que
pensamos. E, de toda maneira, a história da moral mostra que o círculo dos
indivíduos, grupos e até de outras espécies que protegemos tem se expandido,
não contraído.
Nenhum comentário:
Postar um comentário