domingo, 26 de janeiro de 2025

Entre Davos e a COP30 - George Gurgel*

O Papa Francisco, em fala recente, dias depois da posse do Presidente Donald Trump, chamou atenção para o fato de que todos nós somos imigrantes. Tão oportuna declaração nos leva a refletir sobre uma maior responsabilidade e compromisso de cada ser humano, das nossas Organizações Multilaterais, a exemplo da ONU, FMI, Banco Mundial e das Organizações Mundiais da Sociedade Civil; assim como dos EUA, da Europa, da China e da Rússia - principais economias mundiais, responsáveis pela maior geração dos gases de efeito estufa no planeta – devem implementar medidas efetivas que minimizem as causas e os efeitos das mudanças climáticas ora em curso, atingindo as populações e os ecossistemas do planeta.

No entanto, as declarações e os decretos assinados no início do segundo governo do presidente dos EUA, Donald Trump, não são alvissareiros. Afrontam acordos internacionais, descomprometem o governo americano com o Acordo de Paris e com a Organização Mundial de Saúde; reorientam a economia americana para a produção e consumo de petróleo; além de declarações preocupantes em relação à autodeterminação do Canadá, do México, do Panamá e da Groelândia, diante de um complexo e beligerante cenário internacional, que tem os EUA, Israel, Palestina, China, Rússia, União Européia e os Brics, como atores relevantes.

Assim, a atual conjuntura internacional, com seus conflitos políticos, econômicos, sociais e ambientais, continua a nos desafiar. Precisamos de uma Cidadania Global mais efetiva, comprometida com solidariedade, igualdade, liberdade e fraternidade nas relações do ser humano entre si e com a própria natureza, para uma cultura de Paz - fundamento de uma nova ordem mundial, que nos leve à almejada sustentabilidade da humanidade. São insustentáveis as contradições econômicas, sociais e ambientais da sociedade contemporânea, agravadas em função das mudanças climáticas, das guerras, da fome, do desemprego, do narcotráfico e da violência urbana. Ainda, de maneira preocupante, aumenta a corrida armamentista e os conflitos regionais, atingindo o cotidiano das nossas vidas, em escala regional e global.

Portanto, coloca-se como desafio a defesa e ampliação da democracia - fundamento de novas relações políticas, econômicas e sociais a favor da vida e da preservação do planeta. A possibilidade desta construção coletiva tem como base a valorização de cada ser humano, colocando de maneira inadiável, a necessidade de uma reflexão sobre a efetividade dos nossos atuais sistemas políticos, econômicos, sociais e ambientais no Brasil e no mundo.

A Conferência de Davos

Entre os dias 20 e 24 deste mês de janeiro, em Davos, na Suíça, aconteceu mais uma reunião anual do Fórum Econômico Mundial. A Conferência de Davos é a dedicada à cooperação público-privada, que congrega lideranças políticas, empresariais e culturais para discutir e elaborar uma Agenda Global, para debater e procurar soluções em relação às questões contemporâneas. O tema central deste ano foi “Colaboração para a Era Inteligente”, cujas discussões giraram em torno dos principais desafios do cenário internacional, a exemplo das guerras na Ucrânia e em Gaza, colocando-se a necessidade de um reordenamento do cenário político internacional, a ser pautado pela multipolaridade, respeito à diversidade política, econômica, social, cultural e espiritual da humanidade.

A declaração final de Davos sugere soluções voltadas para o enfrentamento dos conflitos regionais e internacionais em curso, a exemplo do cumprimento das Resoluções do Acordo de Paris. Portanto, a busca de agendas comuns para o funcionamento das organizações multilaterais, a exemplo da ONU, FMI, Banco Mundial, OIT, constitui fundamentos necessários na perspectiva de resolução dos atuais problemas da humanidade: a exclusão de bilhões de pessoas da vida política, econômica e social; o direito à moradia, alimentação, trabalho, renda, saúde, mobilidade, no caminho de uma agenda propositiva que enfrente os reais problemas econômicos, sociais e ambientais que afetam uma boa parte da sociedade mundial. Ainda, implementar ações, necessárias e já conhecidas há décadas, para a melhoria climática do planeta e a consequente conservação dos seus ecossistemas, a exemplo da Amazônia, cujo desmatamento, acelerado nos últimos anos, tem colaborado para o aumento da temperatura regional e planetária.

A COP 30

Sobre os aumentos de concentração da pobreza e da riqueza, mais uma vez diagnosticados em Davos, assim como os desafios econômicos, sociais e ambientais do planeta, como nos colocamos? Qual a relação entre a Agenda de Davos e a Agenda da COP 30, a ser realizada no Brasil neste ano de 2025, no próximo mês de outubro, no Estado do Pará?

A reunião em Davos reiterou temas recorrentes das agendas globais. Os diagnósticos são preocupantes. Persiste, como imperativo, a necessidade de contribuição das economias mais desenvolvidas - que mais poluíram e poluem, a exemplo dos EUA, Europa, China e Rússia, no caminho de apoiarem medidas mais efetivas que minimizem os efeitos das mudança climáticas, em sintonia com as resoluções do Acordo de Paris, a favor da sustentabilidade do planeta, no caminho do enfrentamento da excludente realidade econômica, social e ambiental de uma boa parte da humanidade que vive nos continentes africano e asiático, e na América.

Além de Davos, as sociedades mundial e brasileira estão desafiadas ao enfrentamento dos reais problemas cotidianos, para a superação da nossa difícil realidade, que exclui a maioria da população das conquistas sociais modernas. O cotidiano das ruas e das redes sociais apresenta a tragédia de bilhões de pessoas em todo o planeta, excluídas do direito ao trabalho, à alimentação, à moradia, à saúde, ao saneamento, à educação, à cultura e à mobilidade urbana.

Nesta perspectiva, a ciência, aliada aos conhecimentos ancestrais e à educação, são fundamentos e o caminho para a sustentabilidade humana no planeta. São elementos estratégicos, imprescindíveis, frente aos atuais negacionismos e populismos, que constroem suas realidades paralelas e se retroalimentam. Há espaço para as avenidas da democracia e da diversidade, no caminho de novas relações políticas, econômicas, sociais, culturais e ambientais nos planos nacional e internacional, nos blocos continentais e regionais existentes, envolvendo países e organizações governamentais e não governamentais, democratizando as relações internacionais em prol desta sustentabilidade mundial e brasileira, tendo a democracia e a paz como fundamentos estruturantes desta construção.

A desejada sustentabilidade humana no planeta é um processo em curso e em disputa política no dia a dia da sociedade contemporânea, no cotidiano de cada um de nós. A participação da Cidadania é o fundamento desta almejada sustentabilidade e deve ser perseguida no processo de negociação e pactuação da Agenda a ser discutida na COP 30 no Brasil. O futuro da Sociedade e da Democracia deve ser trabalhado modificando as atuais relações políticas, econômicas, sociais e ambientais nos planos nacional e internacional. São desafios históricos que continuam atuais para a sociedade brasileira e para a mundial.

*Da UFBA e da Diretoria do Instituto Politécnico da Bahia

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