sexta-feira, 8 de maio de 2009

No meio do caminho, a poupança

Eduardo Rodrigues, Brasília
DEU EM O GLOBO

BC indica que não poderá reduzir mais os juros se regra de remuneração da caderneta não mudar

Aata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) — que na semana passada cortou em um ponto percentual a Taxa Selic, para 10,25% ao ano — indica que o Banco Central (BC) continuará a reduzir os juros, ao menos no próximo encontro, em junho. Para o colegiado, apesar dos sinais de recuperação das economias brasileira e global, o ritmo da atividade ainda é fraco, aqui e lá fora. Consequentemente, não há pressões inflacionárias.

Porém, o BC advertiu no documento, de forma velada, que resolver a questão da remuneração da poupança é elemento-chave para a continuidade da queda dos juros.

O texto, divulgado ontem pela autoridade monetária, reforça que “a continuidade do processo de flexibilização monetária torna premente a atualização de aspectos, resultantes do longo período de inflação elevada, que subsistem no arcabouço institucional do sistema financeiro nacional”. A frase é bastante similar ao alerta que o presidente do BC, Henrique Meirelles, fizera na véspera em videoconferência com empresários gaúchos: — Evidentemente que tudo tem custo e já começamos a ver alguns dos problemas causados por isso, (...) fundos de pensão que têm rentabilidades mínimas que estão revisando isso, a caderneta de poupança que tem questões fiscais e de rentabilidade... Então é interessante, na medida em que os juros começam a cair começam a se enfrentar os problemas de uma sociedade toda estruturada para operar com juros muito mais altos.

Copom vê inflação abaixo da meta

Com os cortes consecutivos na taxa básica de juros, a caderneta tem se tornado mais rentável do que as aplicações em fundos de investimento com taxa de administração acima de 1% ao ano — o que inclui a maior parte das aplicações oferecidas no varejo —, preocupando a equipe econômica, que, por isso, estuda mudanças no cálculo da remuneração da poupança.

O enfraquecimento dos fundos atrapalha, por exemplo, a administração da dívida pública, já que eles são grandes compradores de títulos federais.

— O Copom usou o termo “premente” para explicitar o interesse, a necessidade e a urgência de uma solução para a poupança que viabilize os novos cortes. É claro que o Comitê não ficará limitado por isso, mas ele sempre evita tomar decisões que causem distorções na economia — analisou o estrategista-sênior do banco WestLB, Roberto Padovani, que aposta em nova queda de um ponto na próxima reunião.

Já foram estudadas pelo governo diversas fórmulas de rendimento.

Uma das mais fortes é remunerar a poupança com parte da taxa básica de juros, a Selic (por exemplo, 65% da taxa). Outra é zerar a TR, e uma terceira é criar uma escala para a remuneração dos poupadores, de acordo com o valor do depósito, recebendo mais quem tem menos depositado. Ainda poderia ser instituída a cobrança de IR sobre depósitos acima de R$ 500 mil.

Na avaliação macroeconômica, que já leva em consideração a redução da meta de superávit primário (a economia do governo para pagar os juros da dívida) de 3,8% para 2,5% do Produto Interno Bruto (PIB, soma de bens e serviços produzidos no país), a ata considera que houve leve redução, “ainda incipiente e sujeita a reversão”, da aversão ao risco de investidores, com retorno do movimento nas bolsas, elevando preços de ações e commodities. Além disso, o aumento do fluxo de capitais tem causado um aumento da cotação das moedas emergentes — o real entre elas — em relação ao dólar.

O Copom, no entanto, ressalta que a evolução dos preços em diversas economias aponta para uma significativa redução das pressões inflacionárias. “Dessa forma, o efeito líquido da desaceleração global sobre a trajetória da inflação doméstica segue sendo, até o momento, predominantemente benigno”.

Segundo o economista-chefe da Corretora Concórdia, Elson Teles, o BC deixou claro que continuará a afrouxar a política monetária: — O cenário é tranquilo, com todas as projeções de inflação ao fim do ano apontando para patamares abaixo da meta (de 4,5% pelo IPCA). Há espaço para novas reduções nos juros, mas como a distensão monetária já é longa, deve haver sim uma desaceleração nos próximos cortes.

Em meio ao debate sobre a mudança na remuneração da poupança, a captação da caderneta ficou negativa em R$ 526,285 milhões em abril, segundo o Banco Central (BC). O resultado é bastante inferior às perdas registradas até o dia 29 (R$ 1,878 bilhão), devido a um aporte de R$ 1,351 bilhão no último dia do mês. Segundo o diretor de Economia da Associação dos Executivos de Finanças (Anefac), Andrew Frank Storfer, apesar do clima de incerteza em relação às alterações nas regras do rendimento, o movimento dos poupadores no mês foi causado por outros fatores, como o pagamento de dívidas e tributos anuais.

Os principais partidos de oposição divulgaram ontem uma nota conjunta condenando a intenção de alterar o rendimento da poupança. Assinada pelos presidentes de PSDB, DEM e PPS, a nota afirma que a atual estrutura de remuneração — Taxa Referencial (TR) mais 6,17% de juros ao ano, com isenção do Imposto de Renda — deve ser mantida para todos os depositantes.

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