A guerra federativa que se instalou no Congresso em torno da distribuição dos royalties do petróleo foi alimentada pelo governo federal, que depois não soube administrar a questão ainda no governo Lula, e agora, no governo Dilma, mostrou-se incapaz de articular uma ação conjunta de sua base partidária.
O que prevaleceu foi o imediatismo político da maioria dos estados não-produtores, atrás de uma riqueza que nem se sabe se realmente existirá a longo prazo, devido às novas formas de energia que estão sendo pesquisadas e às dificuldades da exploração do pré-sal, tanto tecnológicas quanto financeiras mesmo, pois a Petrobras não tem condições no momento de assumir os custos de 30% de todos os campos de petróleo.
O governo do Rio de Janeiro confiou demasiadamente na promessa de Lula de garantir pelo menos que os contratos já firmados seriam respeitados, e agora depende de uma interpretação do Supremo Tribunal Federal. Os próprios vetos da presidente Dilma foram feitos mais por formalidade, pois o governo não tinha a menor condição de controlar a ânsia de sua base parlamentar para dividir esse bolo, atual e futuro.
A descoberta de enormes reservas de petróleo e gás em mar, nas camadas do pré-sal, mudou radicalmente o cenário de aceitação dos royalties como compensação financeira aos estados produtores. No campo da divisão federativa da receita, subitamente irrompeu e foi fomentado um enorme conflito federativo, porque aquela receita passou a ser vista como uma espécie de redenção para as finanças de todos os governos do país, sobretudo dos ditos não produtores, de acordo com um estudo feito por encomenda da bancada parlamentar do Rio.
A exploração do pré-sal em mar passou a ser vista como espécie de novo e futuro eldorado para as finanças públicas estaduais e municipais, capaz de gerar um enorme e inesgotável volume de receitas. Neste contexto, o novo marco regulatório em si passou para o segundo plano no Congresso Nacional na apreciação final do projeto que o regulamentou. A nova divisão não servirá para resolver o problema de nenhum ente federativo, pois a repartição geral gerará muito pouco para cada um dos envolvidos, mas os estados produtores sofrerão grandes perdas.
O novo problema aumenta a lista dos conflitos federativos já existentes, como o da guerra fiscal, já proibida pelo Supremo, e a perda de arrecadação de estados e municípios a cada isenção ou redução de IPI decidida pelo governo. Os estados produtores de petróleo não recebem o ICMS sobre essa produção, imposto que é dos únicos a ser cobrado no consumo. Também por isso receberam essa compensação, além do fato de estarem sujeitos a acidentes de exploração em seus territórios.
A partir do novo marco regulatório do pré-sal, que alterou o sistema de concessão na exploração pelo da partilha, abriu-se uma brecha para a rediscussão dessa questão, e nessa ocasião o governador Sérgio Cabral não entendeu, ou não quis entender por interesses políticos, que ali estava o ovo da serpente que poderia ser fatal para as finanças do estado.
Quando o Congresso se rebelou ainda no governo Lula, e aprovou a mudança da legislação, o governador Cabral chorou em público, porque previa a catástrofe que essa decisão representava para o estado. Desta vez, diante de uma realidade dura, ele tomou outra decisão polêmica: suspender "todos os pagamentos do Estado, com exceção do [salário] dos servidores públicos" até que o Supremo Tribunal Federal julgue a constitucionalidade do projeto de lei de distribuição de royalties do petróleo. Um estado que está discutindo seus direitos adquiridos, passa também a quebrar contratos.
Fonte: O Globo
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