A presidente Dilma Rousseff mantém elevados os índices de popularidade revelados em pesquisas, ainda; vem obtendo o que quer do Congresso e, se não consegue, tem como impor o que pretende por medida provisória ou decreto, sem cerimônia, fugindo de contrariedades democráticas; é senhora absoluta da administração e da política e mantém bem lacradas as tradicionais caixas-pretas do governo, o que favorece a fuga de polêmicas desgastantes. No entanto, há uma constatação abrangente no PMDB e no PT, os dois pilares da aliança política que a levou ao governo: a presidente vive seu pior momento.
A primeira nuvem negra se formou no cenário eleitoral. Dilma enfrenta uma dissidência importante no seu grupo, a do governador Eduardo Campos, cuja candidatura vai ficando a cada dia mais irreversível em razão inversa da campanha agressiva contra ele movida pelo PT, que, depois de ver frustradas as tentativas de isolá-lo pela pressão externa, detonou uma estratégia destinada a asfixiar a sua candidatura por dentro do PSB.
Em vão falaram os governadores e políticos petistas do Nordeste, notadamente Jaques Wagner e Marcelo Déda, em vão o PT convenceu o ex-presidente Lula, que não aderiu integralmente à tese mas cedeu liminarmente, a permitir o confronto sob o comando do presidente do partido, Rui Falcão.
A supremacia da personalidade sobre a relação política
Falcão traçou o plano de encurralar Campos nas cordas por integrantes do próprio partido. O governador do Ceará, Cid Gomes, o líder do PSB carioca, Alexandre Cardoso e o ministro Fernando Bezerra, que vinham falando há meses a favor da aliança com o PT, amplificaram sua voz, levando-a a vários Estados, com apelos a Eduardo Campos para não se candidatar e guardar-se para 2018. Foi simples para o PT organizar a rede em diferentes regiões e promover o palanque, tendo em mãos a audiência do partido e do governo Dilma. Missão que vai continuar à medida em que identificar outros aliados de Eduardo Campos dispostos a expor publicamente a opção por Dilma.
O próximo pode ser o governador do Piauí, Wilson Martins, que foi vice de um governador do PT. Ele está sendo convocado a aderir à campanha, o que até agora evitou porque sua posição, como a da maioria dos governadores e líderes do partido, tem nuances que podem confundir os já convencidos pelo PT.
A pressão para retirar da MP dos Portos o que favorecia o porto de Suape teria surtido mais efeito sobre o humor e os planos de Eduardo Campos do que a armação da guerra interna pelo PT. Também por isso a campanha de Dilma não está totalmente satisfeita com os resultados obtidos até aqui. Campos recolheu-se, afastou-se dos embates públicos, voltou-se mais para seu Estado e retomou o plano inicial, que era tratar da candidatura só a partir de janeiro do ano que vem. Com isso, o PT, agora, sabe pouco dos seus passos e teme perder o controle do processo.
Mesmo com a campanha da reeleição muito centrada no Nordeste, Dilma ainda não vislumbra o isolamento definitivo de Eduardo Campos. Mas recebeu positivamente o engajamento do presidente do PT na elaboração e execução do plano da coordenação da reeleição para esse adversário.
Outro fato contabilizado como negativo para o cenário da reeleição ocorreu nas hostes da oposição. A convergência do PSDB para uma candidatura presidencial fora de São Paulo reduziu boa parte do arsenal de ataques do PT e aumentou a possibilidade da argumentação com a imagem não desgastada de Aécio Neves.
Ainda na ala adversária, Dilma viu Marina Silva resistir à medida do governo para sufocar sua candidatura com uma tardia medida de força contra a criação de partidos. Marina não é uma caloura em disputa presidencial, tem recall que lhe dá o primeiro lugar entre os adversários do PT, e está conseguindo caminhar bem na montagem do seu partido.
Uma segunda e ampla nuvem negra a ser dissipada formou-se na gestão do governo. A presidente deixou que fossem criados muitos flancos ao mesmo tempo. Vão da inflação ao baixo crescimento, das disputas em nível pessoal com o Congresso, que lhe provocam reações de fígado, à falta de resultados concretos nas políticas de um governo que está na metade do mandato e tendo que intensificar a campanha reeleitoral, o que condiciona a ação de todos os ministros. Tem perdido auxiliares importantes. Não consegue, ou não quer, definitivamente, abrir mão do seu sistema próprio e oferecer um governo mais aberto.
Dilma não perde os embates com o Congresso, mas alguém, com realismo, é capaz de dizer quem obteve vitória política na votação da MP dos Portos? Esta foi um divisor de águas, o êxito foi exclusivamente numérico e o governo viu expostos seus interesses, suas idiossincrasias, suas deficiências na negociação política, seu temperamento mercurial. Ter escolhido o líder do PMDB como seu inimigo número um vai ter um preço, até porque esse político se revelou, para um público externo interessado nos assuntos de conteúdo do Congresso, um contendor articulado, com argumentação técnica bem engendrada, e para o público interno do partido velho de guerra um corajoso combatente dos métodos e intransigências do governo que incomodam a todos.
Para aplicar o carimbo ao pior momento surgiram críticas internacionais atribuindo a seu estilo a razão das dificuldades do Brasil. E o PT não discorda. O partido, especialmente a bancada parlamentar, faz tudo o que lhe pedem, está perfeitamente afinada com o projeto, coordena as ações, carrega o andor mas, internamente, manifesta insatisfação.
É lá, nas reuniões internas, que se pergunta: para quem o PT fará campanha? Para quem o PT vai renunciar à cabeça de chapa em algumas eleições estaduais? É para Dilma, claro. Mas, ressalvam os petistas, se continuar o clima de insatisfação generalizada de alguns setores da sociedade, dos trabalhadores, dos patrões, dos banqueiros, dos bancários, dos sem teto, dos sem terra, de deputados e senadores, a permanecer o Palácio com um time hermeticamente fechado em si mesmo, enumeram, Dilma pode conseguir mudar o resistente quadro favorável.
A razão que levou ao pior momento, na concepção de aliados do PT e do PMDB, é a mesma que determinou as recentes críticas à presidente no plano internacional. A supremacia da sua personalidade sobre as relações políticas.
Fonte: Valor Econômico
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