A causa dos "moderados" na Malásia, movimento pára-governamental que pretende dar conteúdo político ao novo governo do primeiro-ministro Najib Razak, transformando-o em porta-voz da modernidade na região, está sendo contestada pelos fatores locais, o que provocou ontem, na primeira sessão do seminário da Academia da Latinidade aqui em Kuala Lumpur, uma grande discussão.
A começar pelo próprio staff do primeiro-ministro, que tem contestadores contra o projeto de "1 Malásia", a grande propaganda política governamental. O país se compõe de três etnias principais: Malaios (+/- 50%), Chinesa (30%) e Hindu (15%). De forma geral, estas três etnias tem papéis muito distintos na sociedade: Os malaios são funcionários públicos, os chineses se dedicam a negócios privados e os hindus são os prestadores de serviços (advogados, médicos, etc.).
A lei do país não permite que outra etnia que não os Malaios (muçulmanos) exerça o funcionalismo público. Também não permite que mulheres Malaias casem com não muçulmanos ou não malaios. A miscigenação é quase inexistente no pais. Dificilmente uma sociedade como essa poderia ser definida como exemplo de "multiculturalismo".
É verdade que esse movimento de moderados, liderado pela Fundação do Movimento Global de Moderados, uma instituição privada ligada ao partido governista, existe justamente para ajudar o governo como movimento da sociedade civil a superar esses obstáculos de segregação e de descriminação.
Os malaios são a maioria, mas os chineses dominam a economia. Foram criadas várias cotas para os malaios que deveriam se encerrar quando eles atingissem o controle de no mínimo de 30% da economia, o que por estatísticas privadas já acontece. As cotas no entanto permanecem, pois os números oficiais indicam que ainda não foi atingido o índice desejado.
A Constituição da Malásia estabelece que todo cidadão que nasce aqui é muçulmano, e portanto as cotas estabelecem um domínio da máquina pública pela etnia malaia. Há um movimento para que essa definição seja retirada da Constituição justamente para promover a igualdade entre as etnias, mas até agora foi uma esforço infrutífero.
No momento, há uma grande discussão pública entre os muçulmanos e os cristãos, que são minoria no país, sobre o uso do nome de Alá. Os muçulmanos radicais querem proibir que a Bíblia cristã se refira a Deus com o nome de Alá, alegando que isso causa confusão entre as religiões, enquanto os cristãos demonstram que o uso é histórico e não poderia ser proibido.
A disputa está levando a ações da parte do governo que resiste à moderação, com o uso de instrumentos da burocracia para criar dificuldades para a Sociedade Bíblica da Malásia. A discussão pública coloca em confronto os muçulmanos moderados, que querem modernizar a visão das políticas públicas e os radicais que estão representados no governo.
Enquanto não superam essas questões internas, o governo, com o auxílio dos moderados da sociedade civil, continua vendendo a tese da moderação como diferencial para a Malásia na região asiática. Coube ao professor Shamsul A. B. diretor do Instituto de estudos Étnicos da Universidade Nacional da Malásia, explicar a experiência bem sucedida da moderação na Malásia. Para ele, desde maio de 1969, quando aconteceu o último conflito étnico com muitas mortes, os malaios se convenceram de que a a violência não poderia ser uma opção, e mais de quatro décadas depois está constatado que durante esse período de paz a qualidade de vida melhorou para todos, houve uma grande redução da pobreza, que hoje está em cerca de 5% da população.
O Secretário de Estado dos estados Unidos, John Kerry, afirmou recentemente que a Malásia é um país "moderno, inovativo, e modelo de diversidade religiosa para o mundo". Para Shamsul A. B. o segredo pode ser definido pela sigla BN, que é a mesma do partido majoritário Barisan Nasional (Frente Nacional) mas corresponde a duas palavras: Barganha (no bom sentido de troca) e Negociação.
Fonte: O Globo
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