Doações para políticos e partidos com mediação do doleiro Youssef podem configurar um propinoduto ou novo esquema de financiamento político ilegal
Com tantas nuvens pesadas despejando chuva ácida sobre o Planalto e derretendo as intenções de voto da presidente Dilma Rousseff, e com o pessimismo econômico, real e/ou induzido, corroendo a confiança no governo, que mais poderia faltar, se não um grande escândalo político?
Não falo do escândalo econômico da compra da refinaria de Pasadena pela Petrobras, já em curso com as respectivas implicações, mas de um escândalo envolvendo atores políticos importantes na seara governista, com poder para balançar a figueira e abalar as raízes dela, como foi o mensalão. Se ele vier, pode até não alterar o resultado da eleição, mas afetará muito as condições da disputa.
Desde o início do imbróglio para a instalação da CPI da Petrobras, alguns sussurros, já registrados aqui e alhures, informavam que o problema principal não era o negócio da refinaria. Problema, ressalve-se, para os parlamentares que se opuseram à CPI, não para proteger a presidente Dilma, pelo fato de ela ter votado a favor do negócio, ou para preservar a joia da coroa de estatais.
O que temiam era o desembarque, na CPI, do ex-diretor Paulo Roberto Costa, preso com o doleiro Albert Youssef pela Polícia Federal na esteira da Operação Lava-Jato. Isso porque haveria uma teia de relações perigosas entre ele, Youssef e integrantes da base governista, especialmente do PP e do PMDB. Pelo menos por ora, as relações do deputado André Vargas com o doleiro, que ontem o levaram a pedir licença da Câmara, parecem ser de ordem individual, não representando uma conexão do PT.
O governo conseguiu embananar a instalação da CPI, mas, mesmo assim, começam a surgir informações, vazadas a partir do inquérito policial da Operação Lava-Janto, sobre doações que teriam sido mediadas pela dupla hoje presa.
Segundo reportagem do jornal O Estado de S.Paulo, a Polícia Federal encontrou e-mails de Youssef tratando de doações para políticos com diretores da empreiteira Queiroz Galvão e da empresa Jaraguá Equipamentos. Ambas têm contratos com a Petrobras e atuam na construção da Refinaria Abreu e Lima, que estaria superfaturada por influência de Costa.
Nos e-mails, eles acertam doações no pleito de 2010 e a emissão de recibos pelos beneficiados. O PP declarou ao TSE ter recebido R$ 500 mil da Queiroz Galvão e R$ 2,24 milhões da subsidiária Vital Engenharia. As seções baiana e pernambucana do PP também receberam doações, de R$ 500 mil e R$ 100 mil, respectivamente, e o executivo estaria cobrando os recibos no e-mail para Youssef, certamente por ter sido ele o mediador.
Alguns parlamentares do PP, como Roberto Teixeira (PE), Nelson Meurer (PR), Roberto Britto (BA) e Aline Corrêa (SP) — filha de Pedro Corrêa, condenado no processo do mensalão — teriam recebido doações individuais. Outro condenado na Ação Penal 470, o ex-deputado Pedro Henry (MT), também. A matéria cita ainda a seção do PMDB de Rondônia, chefiada pelo presidente em exercício do partido, senador Valdir Raupp.
Se forem confirmadas transferências frequentes e abrangentes de recursos para partidos ou parlamentares, estará configurado um propinoduto ou esquema de financiamento político-eleitoral ilegal, o que sempre dá no mesmo. E é o fio dessa meada que a oposição tentará puxar na CPI, quando for instalada, assim como a CPI dos Correios não se interessou nem um pouco pelo que houve nos Correios sob a influência de Roberto Jefferson, concentrando-se nas relações entre o valerioduto e os aliados do governo.
Se o doleiro negocia com empresários doações para políticos, está claro o papel dele de elo num esquema de favorecimentos recíprocos em que os partidos da base usam seus feudos no governo, especialmente na Petrobras, para obter vantagens.
O aparelhamento político da Petrobras teve um momento emblemático em 2005, quando o ex-deputado Severino Cavalcanti reuniu-se com a então ministra Dilma e pediu para seu partido, o PP, “aquela diretoria que fura poço e acha petróleo”.
Dilma disse-lhe que a Diretoria de Exploração e Produção não poderia sofrer alterações, mas que outro posto na empresa poderia ser estudado para um indicado dele. Severino já presidia a Câmara, não gostou e passou a torpedear o governo, até cair na esteira do escândalo do “mensalinho” do restaurante da Casa.
Publicado no Correio Braziliense de 8/4/2014
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