- Correio Braziliense
O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa, decidiu abandonar a relatoria do processo do mensalão, incluindo o cumprimento das penas e o andamento de ações correlatas. Era sua última tarefa relacionada à Ação Penal 470, que levou à cadeia os dirigentes petistas José Dirceu, José Genoino e João Paulo Cunha e outros políticos, como Waldemar da Costa Neto, ex-presidente do PR, e Roberto Jefferson, ex-presidente do PTB e autor da denúncia de compra de votos no Congresso que deu origem ao processo. De certa forma, Barbosa "desfulaniza" as decisões sobre a execução das penas dos condenados, porque estava sendo acusado de "perseguir" os réus pelos respectivos advogados.
"Julgo que a atitude juridicamente mais adequada neste momento é afastar-me da relatoria de todas as execuções penais oriundas da Ação Penal 470 e dos demais processos vinculados à mencionada ação penal", alegou o presidente do STF ao deixar o caso. O ministro Luís Roberto Barroso é o novo relator. Foi escolhido por sorteio e pretende pôr em pauta os pedidos de agravo regimental dos réus na próxima semana. "Eu gostaria de entrar no recesso com isso decidido e gostaria de fazê-lo em plenário, na medida do possível", disse. Ele quer que a Corte decida sob o comando de Barbosa, que havia anunciado a antecipação da aposentadoria. Barbosa será substituído, naturalmente, pelo ministro Ricardo Lewandowski, que assumirá a Presidência do Supremo em seu lugar. Ambos protagonizaram os debates mais acirrados e polêmicos durante o julgamento do mensalão.
O argumento de Barbosa para deixar a relatoria foi a representação criminal que apresentou contra o advogado Luiz Fernando Pacheco, que defende o ex-presidente do PT José Genoino. Um incidente com o defensor, em plena sessão plenária do STF, foi a gota d"água. Pacheco foi à tribuna, indevidamente, para acusar Barbosa de abuso de autoridade e foi retirado do plenário por agentes de segurança, a pedido do presidente da Corte. Queixa-se, Barbosa, de que os advogados que atuam no caso passaram a agir politicamente contra ele, "através de manifestos e, até mesmo, partindo para os insultos pessoais, via imprensa, contra este relator".
O presidente do STF antecipou-se ao abaixo assinado de 300 pessoas, entre políticos, intelectuais, artistas e líderes de movimentos sociais, que o acusa de "agredir o Estado de Direito". Os senadores Roberto Requião (PMDB-PR) e João Capiberibe (PSB-AP), o deputado estadual Campos Machado (PT-SP), as professoras Maria da Conceição Tavares e Walnice Nogueira Galvão, o teólogo Leonardo Boff, o presidente do instituto João Goulart, João Vicente Goulart e o embaixador Samuel Pinheiro Guimarães estão entre as personalidades solidárias com os reús que o subscrevem.
Carismático e polêmico, Barbosa conquistou ampla simpatia da opinião pública como relator do mensalão e passou a ser visto como espécie de reserva moral da nação. Os réus foram condenados pela plenário da Corte, mas, em algumas penas, tiveram direito a novo julgamento, por haver ao menos quatro votos contrários à condenação. Nessa fase derradeira do processo, Barbosa acumulou a presidência do Supremo e o cargo de relator, o que lhe deu grande poder na condução do processo e apoio popular, mas permitiu à defesa dos réus, nos meios jurídicos e políticos, a construção da imagem de que a Corte havia sido "fulanizada".
Agravos regimentais
Entre os dois julgamentos, houve também uma mudança na composição da Corte, com a entrada de ministros, entre os quais o novo relator, Luís Roberto Barroso, cujas críticas à Ação Penal 470 foram explicitadas já na posse. A nova composição do tribunal abrandou algumas penas no julgamento dos embargos infringentes. A ação organizada dos advogados que atuam no processo, além do jus esperneandis dos réus e a campanha sistemática dos militantes petistas contra Barbosa, dificultaram a atuação monocrática do presidente do STF na execução das penas. Recrudesceram as críticas à suposta "fulanização" da Corte.
Há 10 agravos regimentais dos advogados dos réus contra decisões que foram tomadas pelo ministro Joaquim Barbosa, que negou o direito de trabalho a Dirceu e cortou o benefício de outros condenados ao regime semiaberto, como os ex-deputados João Paulo Cunha e Valdemar Costa Neto e o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares. Seu entendimento é de que os condenados precisam cumprir um sexto da pena antes de obter direto para trabalhar fora da penitenciária, tese contrária ao parecer do Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot. Os advogados pedem que os agravos sejam julgadas por todos os ministros, mas Barbosa não os havia pautado, nem dado previsão de quando isso aconteceria. Ao tratar do assunto, ontem, o ministro Barroso comparou a Ação Penal 470 ao cadáver de um elefante, que é fácil de matar, mas difícil de enterrar.
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