César Felício - Valor Econômico
SÃO PAULO - O Brasil poderá ter um nível de abstenção recorde no segundo turno da eleição presidencial no próximo domingo. Historicamente, o percentual de eleitores que não comparece para votar cresceu em todas as eleições presidenciais com dois turnos disputadas desde 1989. Na votação do último dia 5, o patamar dos que não votaram já foi elevado: 19,39% dos eleitores ficaram de fora do pleito, o que significou o segundo maior índice desde a redemocratização, atrás apenas dos 21,5% que deixaram de votar na eleição presidencial de 1998.
A tendência é a inversa em relação aos votos em branco e nulos, que costumam cair nos segundos turnos. A única exceção foi na presidencial de 2002, em que o total de votos em branco subiu de 3% para 4,7% entre uma rodada e outra da eleição. No dia 5, o total de votos em branco ficou em 3,8% e o de nulos em 5,8%.
A abstenção não é levada em conta pelos institutos de pesquisa quando fazem levantamentos de intenção de voto. De acordo com Marcia Cavallari, diretora do Ibope Inteligência, boa parte da abstenção se explica pela desatualização do cadastro, que não é limpo de eleitores que já morreram ou não estão mais em seus domicílios eleitorais. Prova disso seria o comparecimento maior às urnas no Distrito Federal, Sergipe, Amapá e Alagoas, únicos Estados onde o recadastramento biométrico foi de virtualmente 100%. Nestes Estados, a abstenção caiu em relação a 2010. O Amapá registrou o nível mais baixo, com 10,4%.
Mas a explicação não é considerada suficiente por especialistas no tema. "Como a multa para o não comparecimento é baixa, o voto no Brasil acaba ganhando um caráter semi-obrigatório e a abstenção ganha um componente político, demonstrando insatisfação com o processo eleitoral, tanto que sobe entre o primeiro e o segundo turno", disse o professor de ciência política Homero Costa, da UFRN.
O Rio Grande do Norte registrou a maior soma de votos em branco, nulos e de abstenções nas eleições para governador. A quantidade de votos que não foram para candidato algum atingiu 40% no Estado. Para presidente, esta soma caiu para 30,8%, o que indica, de acordo com Costa, que havia uma insatisfação maior do eleitor com a disputa para governador do que no nível nacional. No Rio Grande do Norte, o recadastramento foi de 48%. "Não se pode atribuir os votos em branco e nulos apenas ao desconhecimento do eleitor em relação ao processo de votação", disse. A maior alienação eleitoral no Brasil na eleição presidencial aconteceu na Bahia, em que 33,8% do eleitorado não votou em candidatos. A porcentagem de eleitores que se recadastrou na Bahia foi insignificante, abaixo de 5%.
A realização do recadastramento biométrico apenas em alguns Estados e não em outros e a insatisfação com o processo eleitoral fizeram com que se alterasse o padrão da alienação eleitoral no Brasil. Normalmente, o percentual de eleitores que invalidam o voto ou não comparecem para votar era mais alto no Norte e no Nordeste. Mas desta vez a abstenção foi expressiva no Sudeste.
Em São Paulo, o percentual que não compareceu às urnas foi de 19,5%, ante 16% na eleição passada. No Rio de Janeiro e em Minas Gerais, o percentual foi de 20%. No Ceará, onde o recadastramento também foi baixo, a abstenção ficou em 20,1%.
A abstenção eleitoral sobe também no segundo turno pela característica das eleições. Sem a presença de candidatos proporcionais, diminui a ocorrência de fenômenos como o transporte de eleitores, que, embora ilegal, é prática generalizada. Em 2010, a abstenção no Acre no primeiro turno foi de 22,7%. No segundo, alcançou 28,5%. Em Tocantins, passou de 18,5% para 26,5%.
O aumento da abstenção tende a prejudicar a presidente Dilma Rousseff (PT), porque é mais expressivo em pequenas cidades, de forte vocação governista. Em Presidente Jânio Quadros, no interior da Bahia, a abstenção este ano ficou em 39,5% no primeiro turno. Lá, Dilma teve 79,2% dos votos. Em Salvador, onde a abstenção foi de 20,2%, abaixo da média da Bahia, Dilma conseguiu 49%.
Mas a queda de votos em branco e nulos joga a favor da petista. Ela não é um fenômeno difuso e se manifesta com maior intensidade nos colégios eleitorais propensos ao governismo. Na capital do Estado de São Paulo, onde Dilma perdeu a eleição presidencial passada, a quantidade de votos em branco e nulos caiu de 6,3% para 6,1% entre um turno e outro de 2010. Em Caxias (MA), onde Dilma teve 74% dos votos no primeiro turno e 83% no segundo, o percentual de votos em branco e nulos caiu de 8,3% para 3,4%.
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