Raymundo Costa e Andrea Jubé – Valor Econômico
BRASÍLIA - A presidente Dilma Rousseff anunciou na Austrália que todos os 39 ministros de Estado apresentaram suas cartas de demissão, o que considerou um gesto elegante mas dispensável porque os cargos são dela. Segundo apurou o Valor, no entanto, nem todos enviaram a carta e pelo menos três ministros de primeira linha do PT resistiram ao limite à recomendação do ministro Aloizio Mercadante (Casa Civil): Gilberto Carvalho, Ricardo Berzoini e Paulo Bernardo. Nada combinado. Apenas uma reação tácita à movimentação de Mercadante para se firmar como alternativa à sucessão presidencial em 2018. Como plano B, registre-se, porque o plano A é o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva - nome já lançado, oficialmente, pelo presidente do PT, Rui Falcão.
Carvalho, da Secretaria Geral da Presidência, deixa o cargo até 31 de dezembro, e Berzoini segue no segundo mandato, mas se ele continua na Secretaria de Relações Institucionais, ou muda de pasta, ainda cabe à presidente definir. O destino do ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, ainda é incerto. O deputado Alessandro Molon (PT-RJ) é um dos nome cotado para substituí-lo. O fato é que, embora Dilma nem sequer tenha concluído o primeiro mandato, a corrida para 2018 já começou, dentro do PT. Lula é o número um, mas Mercadante disputa com o governador da Bahia, Jaques Wagner, a condição de Plano B.
Na Casa Civil, Mercadante desponta como uma espécie de "vice-rei" que acumula a função de gerente do governo e coordenador dos demais ministros com a articulação política. Ele consolidou-se como um dos principais auxiliares de Dilma e atua com desenvoltura, e de forma quase onipresente, nos bastidores. Sem muito tato, avança sobre assuntos de outros e acaba criando áreas de atrito.
Após a eleição, o ministro se expôs mais aos holofotes. Antes avesso aos jornalistas, começou a dar entrevistas, até para anunciar a criação de um grupo de trabalho com a Confederação Nacional da Indústria (CNI) para discutir medidas para alavancar o setor. Esses movimentos recentes foram interpretados, internamente no PT, como primeiros passos de quem planeja voos mais altos.
Mercadante, porém, não atropela o líder maior do partido. Numa reunião da bancada, semana passada, causou furor ao defender a volta de Lula em 2018. Disse que se a oposição chegara "furiosa" nesta eleição, eles não haviam visto nada, porque a "artilharia virá ainda mais pesada" daqui a quatro anos, porque os adversários preveem o retorno de Lula.
De seu lado, o governador Jaques Wagner, credenciado por uma vitória espetacular na Bahia e pela proximidade com Dilma - e por isso, nome considerado pule de dez para o novo ministério -, não quer entrar no governo pelo palácio. O motivo: por lá no momento reina Mercadante, e não ele quer ficar disputando sobras de agenda com o chefe da Casa Civil. No PT, ainda é vívida a memória de que o corredor que separa a Casa Civil da SRI, à época de José Dirceu e Aldo Rebelo, respectivamente, era chamado de "Faixa de Gaza". Jaques gostaria de um lugar na Esplanada dos Ministérios. É cotado para mais de uma pasta, entre as quais a Secretaria de Comunicação Social, cujo gabinete funciona no Palácio do Planalto.
Há quem diga que a função é "pequena" diante do projeto político do governador, mas um auxiliar da presidente, que não descarta essa hipótese, lembra-se de ministros de estatura que ocuparam a pasta, e cita Luiz Gushiken, morto no ano passado, e Franklin Martins - ambos influentes no governo. Franklin, aliás, ainda na campanha foi um nome de peso decisivo na definição das estratégias da candidata. Não importa o lugar que Wagner vá ocupar, ele deve ser um dos principais conselheiros da presidente Dilma, que pensa em ter por perto um grupo de auxiliares que constituirão o núcleo duro do novo governo. Além de Wagner e Mercadante, há o ministro Miguel Rossetto (Desenvolvimento Agrário), cotado para o lugar de Carvalho na Secretaria Geral.
O governador da Bahia também é cotado para outras pastas, como o Ministério das Comunicações, para o qual também concorre o deputado Molon, ou para o Desenvolvimento, Indústria e Comércio (Mdic), ao qual se vinculam o BNDES e a Apex, ministério que também pode integrar a cota do PMDB na Esplanada dos Ministérios, com a nomeação do empresário Josué Gomes da Silva. Um auxiliar próximo da presidente confirma que, mesmo lotado na Esplanada, longe do Palácio do Planalto, Jaques Wagner será um nome importante no grupo de conselheiros que Dilma quer instituir, inspirada no modelo do governo Lula, quando Márcio Thomaz Bastos - titular da Justiça - frequentava, diariamente, o palácio, assim como Luiz Gushiken cujo gabinete ficava na extremidade oposta.
O caso do pedido das cartas de demissão é exemplar. Mercadante recomendou que todos os ministros encaminhassem suas cartas, para deixar a presidente à vontade para fazer as mudanças. Berzoini resolveu não atender à convocação e alegou o óbvio: os cargos de ministro e de toda sua equipe estão à disposição da presidente desde sempre, ou no caso dele, desde 1º de abril, quando tomou posse. Argumentação idêntica a usada por Gilberto Carvalho. Segundo o secretário-geral, a presidente pode contar com ele até o último dia de seu mandato, em 31 de dezembro. Se for convidado, Carvalho fica; o mais provável é que saia: ele está no Planalto há mais tempo que a própria presidente da República. Paulo Bernardo só mandou sua carta na última sexta-feira.
Nos bastidores, fontes palacianas dizem que o pedido das cartas foi mais uma manobra desastrada de Mercadante, cujo gesto apenas amplificou o ruído provocado pela carta de demissão de Marta Suplicy, que deixou a pasta da Cultura atirando no governo. "Dilma podia ter passado sem essa", diz um auxiliar. Mas Dilma, por seu turno, não desestimulou a iniciativa do chefe da Casa Civil: ao ser questionada sobre o assunto em entrevista no Catar, disse que o regime era presidencialista e que sentia-se à vontade para trocar e nomear novos ministros. Mas se estendeu na resposta e acabou afirmando que não deixava de ser uma "cortesia" dos ministros entregar a carta. Mercadante, que já matutava sobre o assunto, não pensou duas vezes. "Ele é muito afoito", atestou uma fonte palaciana.
A seu modo, Mercadante age como o ex-todo poderoso ministro José Dirceu na Casa Civil, no primeiro mandato do Lula, com a diferença, segundo seus adversários no PT, de que não tem tamanho para isso. Já na montagem do governo Lula, era Dirceu que chamava os candidatos ao posto para conversar. Certa vez, quando Lula foi para o Oriente Médio, Dirceu fez reunião com nove ministros no palácio e abriu para imagens de TV. Mas o caminho que Mercadante quer trilhar não é o de Dirceu, mas o de outra ocupante ilustre da Casa Civil: Dilma Rousseff.
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