segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

E-mail apócrifo alertou diretores em 2008

• Funcionário autointitulado O Vigilante relatava parte das acusações que surgiram depois, na Operação Lava Jato

• Texto cita Fernando Soares, o Baiano, como um dos lobistas que agia na Petrobras; hoje ele está preso

Mario Cesar Carvalho – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Um e-mail de dezembro de 2008 que circulou na Petrobras já alertava diretores e gerentes que um cartel funcionava dentro da estatal, com divisão de obras por meio de influência política e de lobistas.

Com mais de cinco anos de antecedência, a mensagem relata parte das acusações contra a estatal que surgiram na Operação Lava Jato.

"Continua a ser praticada livremente toda a sorte de maracutaias e acertos' nas cúpulas da nossa Petrobras. Isso precisa acabar", defendia o funcionário que se autointitula O Vigilante.

O nome fictício que ele escolheu para enviar o e-mail, Norberto Andrade Camargo, é uma junção do nome de três empreiteiras que estão sob investigação na Lava Jato: a Norberto Odebrecht, Andrade Gutierrez e Camargo Corrêa.

Mensagem anônima é considerada por especialistas como um dos instrumentos mais eficazes de combate à corrupção porque o denunciante pode falar o que quiser sem sofrer retaliações.

O e-mail foi enviado a quatro diretores e 16 executivos da petroleira. Paulo Roberto Costa, ex-diretor de Abastecimento, Renato Duque, ex-diretor de Serviços, e Nestor Cerveró, ex-diretor da área Internacional, todos réus da Lava Jato sob acusação de terem recebido suborno, aparecem como destinatários, assim como Sérgio Machado, presidente da Transpetro.

Machado se licenciou do cargo depois que Costa disse ter recebido R$ 500 mil de propina dele por conta de contratos superfaturados.

O e-mail também foi enviado a Venina Velosa da Fonseca, ex-gerente da estatal que diz ter alertado Graça Foster em 2007 dos desvios na diretoria de Abastecimento. À época, Graça, a atual presidente da Petrobras, era diretora de óleo e gás.

Todos vão ganhar
A maneira como o funcionário descreve o funcionamento do suposto cartel é similar à narrativa feita por dois delatores da Lava Jato: Julio Camargo e Augusto Miranda, da Setal. Segundo eles, havia um "clube" que loteava obras pagando propina a diretores.

O missivista diz que o fato de a Petrobras não aplicar a Lei das Licitações estimulou "falcatruas e desmandos": "Vence quem combinou vencer e ninguém se queixa, porque todos ganham (...). E ganha o diretor, ganha o lobista e ganha o político".

O e-mail cita o nome de Fernando Soares, chamado de Baianinho, como um dos lobistas que agia na estatal. Soares foi acusado por delatores de ter recebido US$ 40 milhões (R$ 106 milhões) de propina em 2009 e 2010 ao intermediar a venda de dois navios para a diretoria internacional, ocupada à época por Nestor Cerveró.

Soares está preso na Polícia Federal de Curitiba desde 18 de novembro sob acusação de intermediar propina.

O político que indicou Paulo Roberto para a diretoria de Abastecimento, José Janene (PP-PR), também é mencionado na mensagem ao lado do senador Jader Barbalho (PMDB-PA). "Pobres diretores, tornaram-se escravos do Janene, do Jader Barbalho."

Janene morreu em 2010, de problemas cardíacos.

Outro lado
A Petrobras não quis comentar o e-mail de 2008. O advogado de Fernando Soares, Mario de Oliveira Filho, diz que seu cliente só fez negócios lícitos na Petrobras.

A Folha não conseguiu localizar neste domingo (21) assessores de Jader Barbalho.

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