Juliano Basile e André Guilherme Vieira - Valor Econômico
CURITIBA, BRASÍLIA e SÃO PAULO - A presidente da Petrobras, Graça Foster, poderá ser convocada a prestar depoimento aos investigadores da força-tarefa da operação Lava-Jato, da Polícia Federal, que apura conluio entre empreiteiras, políticos e funcionários da estatal para desviar bilhões de reais da companhia.
O Valor apurou que Graça ainda não figura como investigada no caso. No entanto, o longo depoimento de quase cinco horas prestado pela ex-gerente Venina Velosa da Fonseca, na sexta-feira, aos procuradores da República revelou fatos que serão apurados em novos inquéritos policiais. A presidente da Petrobras deve ser chamada não somente na condição de testemunha, mas para prestar esclarecimentos a respeito das irregularidades na estatal.
A ex-gerente denunciou internamente por cinco anos diversos problemas em contratos, licitações e práticas da Petrobras. Acabou transferida para o escritório da estatal em Cingapura e, em 19 de novembro deste ano, foi destituída de suas funções.
Na sexta-feira, acompanhada de seu advogado Ubiratan Mattos, Venina entregou documentos e um computador aos responsáveis pelas investigações da operação Lava-Jato. Os e-mails em que Venina fez alertas de irregularidades para Graça Foster e para José Carlos Cosenza, o diretor que preside a comissão de apuração de irregularidades dentro da Petrobras, já estão em poder da força-tarefa, assim como os documentos internos da Petrobras. Com base nessas informações, Cosenza também deve ser chamado a prestar esclarecimentos.
A força-tarefa recebeu informações a respeito de três esquemas de desvio de dinheiro denunciados pela geóloga.
O primeiro esquema envolve desvios na área de comunicação da Diretoria de Abastecimento e foi descoberto por Venina entre 2008 e 2009. Na época, ela era subordinada ao então diretor Paulo Roberto Costa, um dos mentores do esquema de corrupção e seu delator. Ao se queixar com Costa sobre uma série de contratos em que os serviços simplesmente não estavam sendo prestados, Venina alega que viu o então diretor apontar o dedo para o retrato do presidente Lula e perguntar se ela estava "querendo derrubar todo mundo".
O esquema na área de comunicação envolveu supostamente o desvio de verbas para o PT da Bahia, grupo político do então presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli.
Em 3 de abril de 2009, Venina enviou e-mail pedindo ajuda a Graça Foster, então diretora de Gás e Energia, para concluir um texto sobre as descobertas que fez sobre desvios milionários na área de comunicação. A mensagem foi enviada às 3h50 daquele dia. Na mesma data, a comissão interna da estatal concluiu que houve os desvios. Graça, entretanto, não respondeu à mensagem da gerente.
Ao todo, os desvios na área de comunicação do Abastecimento retiraram mais de R$ 58 milhões da Petrobras para serviços que não foram prestados. A estatal informou, em nota, que demitiu o funcionário supostamente responsável pelos desvios - Geovanne de Morais. No entanto, como ele estava sob licença médica, a estatal manteve-o no cargo por mais quatro anos. Ao verificar que Geovanne não foi demitido, Venina obteve parecer jurídico determinando o desligamento do funcionário, mesmo sob licença médica. Ela encaminhou o parecer aos superiores, pois achava absurdo que o funcionário acusado de desvios continuasse sob a folha de pagamento da estatal. Geovanne, porém, não foi desligado de imediato. Passaram-se quatro anos para que ele fosse demitido, informação atestada em nota da própria Petrobras.
A força-tarefa também recebeu documentos a respeito da elevação de custos na refinaria Abreu e Lima, que subiu de US$ 4 bilhões para mais de US$ 18 bilhões. As informações mostram que a terceira fase das obras só foi autorizada um mês após a saída de Venina da área de Abastecimento, em outubro de 2009. Antes de deixar o cargo na diretoria de Paulo Roberto Costa, a geóloga encaminhou notas, e-mails e documentos alertando para a escalada de preços da refinaria.
Um documento interno da Petrobras mostra que Venina fez, a pedido de Paulo Roberto, um plano de antecipação das obras da refinaria, em 8 de março de 2007. Na ocasião, ela deixou claro que o plano envolvia aumento de custos da ordem de US$ 328,7 milhões, para fazer com que a refinaria começasse a funcionar antes da data prevista, conforme pedido do diretor. Venina reitera que o plano foi submetido "à consideração de V. Sa. (Paulo Roberto)" para que, se estivesse de acordo, fosse submetido à diretoria. O plano foi levado à diretoria e, em seguida, ao Conselho de Administração, presidido na época pela então ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff.
Por fim, os procuradores da República obtiveram documentos a respeito de desvios feitos por negociadores de combustível de navio em unidades da Petrobras no exterior. Mais de mil comunicações entre "traders" de combustível com "fortes evidências" de desvios foram recebidas pelo Ministério Público.
Venina depôs em Curitiba, na sexta-feira, sob proteção policial. Ela também deve ser ouvida pelo juiz Sérgio Moro, que conduz os autos da Lava-Jato na capital paranaense.
Procurados pelo Valor após o depoimento, Venina e seu advogado preferiram não fazer comentários sobre o testemunho.
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