Carmen Munari – Valor Econômico
BRASÍLIA - Em fevereiro ou no máximo em março, mais uma legenda ingressa com pedido de registro. O Partido Liberal, a 33ª sigla brasileira, tem à frente o ministro das Cidades Gilberto Kassab (PSD) e já nasce sob bombardeio de lideranças da oposição, que temem perder integrantes atraídos por seu viés governista. Os planos para o PL incluem a fusão ao Partido Social Democrático (PSD), ou a união dos dois em um único bloco de atuação no Congresso.
Os números dos que devem aderir ao Partido Liberal não são precisos. Serão de 20 a 30 deputados federais, que, somados aos 36 eleitos pelo PSD em 2014, chegariam a pelo menos 56. Na próxima legislatura, o PMDB terá 67 e o PT, 64 - já descontados aqueles que assumiram cargos nos governos estaduais e federal. Entre os senadores, há tentativa de atrair dois. Dos governadores, o do Amazonas, José Melo de Oliveira (Pros), é dado como certo. Ricardo Coutinho (PSB), da Paraíba, é uma possibilidade.
Houve uma sondagem para que Antonio Carlos Magalhães Neto, ACM Neto, prefeito de Salvador, deixasse o DEM para ingressar no PL, mas o prefeito não demonstrou interesse em fazer a troca, que implicaria em aderir ao governo federal. ACM Neto é a principal liderança eleitoral do DEM, partido de origem de Kassab. Na terça-feira, o advogado goiano Cleovan Siqueira, que tenta organizar o novo partido, se reuniu em Brasília com o governador da Bahia, Rui Costa, do PT, acompanhado pelo senador eleito pela Bahia Otto Alencar (PSD), adversários do prefeito de Salvador. Genericamente, Cleovan afirma que trocaram ideias sobre o interesse no novo partido.
Siqueira, advogado, ex-vereador e ex-deputado estadual, contabiliza 400 mil assinaturas para o PL e deve chegar às 500 mil assinaturas necessárias para ingressar com o pedido de registro até o Carnaval. A nova legenda, relata, já obteve registro em nove Estados: Amapá, Distrito Federal, Goiás, Mato Grosso do Sul, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Roraima e Tocantins. Adianta que o processo deverá ir além desses locais necessários para o pedido de registro e que objetivo é levar certidões dos 26 Estados e do Distrito Federal. Siqueira, que não conseguiu se eleger deputado federal pelo PSD em Goiás em outubro, tem bom trânsito não apenas no partido de Kassab.
As tentativas para criar o PL vêm dos últimos oito anos, mas o o processo no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) ganhou impulso com a articulação do ministro das Cidades Gilberto Kassab, que fundou o PSD em 2011 em tempo recorde, coletando as 500 mil assinaturas necessárias em apenas alguns meses.
O início, conta Siqueira, foi em janeiro de 2007, quando os interessados no PL registraram a intenção em cartório de Brasília. "Sem a ajuda do Kassab iria demorar mais dez anos", diz Siqueira, para em seguida relatar que conta não apenas o ministro como com a estrutura, o pessoal, a organização e o apoio logístico do PSD. Os parlamentares da legenda também estão engajados.
"Quem cria um partido cria dois", diz Arthur Rollo, advogado do escritório Alberto Rollo, que assessorou Kassab, ex-prefeito de São Paulo, na fundação do PSD, mas não atua na formação do PL. Como o PSD, o PL vai absorver os parlamentares insatisfeitos em suas legendas que querem apoiar o governo. O PSD levou deputados em massa do PSDB e DEM.
Um alto integrante do PSD acredita que a tendência de os políticos rumarem ao governismo faz parte da índole do brasileiro, "que é patrimonialista, quer poder, quer tomar o público para si". Afirma que o PT é campeão nesta tendência. O combate ao patrimonialismo foi incluído no discurso de posse do novo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, no início do mês, para quem trata-se da "pior privatização da coisa pública".
As novas siglas também são a saída para driblar a exigência da fidelidade partidária, imposta pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em 2007. A regra pode levar à perda do mandato caso o parlamentar troque para um partido já existente, o que não acontece se mudar para uma sigla nova. Para a Justiça, o mandato é do partido, que pode requerer a cassação dos que trocam para outros.
Essas adesões mostram seu artificialismo ao se confrontarem as eleições. Enquanto o PSD tem 45 deputados filiados na atual legislatura, apenas pela troca de siglas, em outubro de 2014 saíram vitoriosos das urnas pela legenda de Kassab apenas 36 parlamentares, o que indica que a realidade da Câmara nem sempre se identifica com a do eleitor. A bancada deverá ter 37 integrantes, um a mais que as urnas, pelo ingresso de um suplente.
Além de receber parlamentares da oposição, a previsão é que o PL terá força para incomodar o PMDB, o que agradaria ao governo Dilma Rousseff, que tem embates no Congresso com o parceiro. Antonio Augusto, diretor do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), da Câmara, diz que o PL não conseguirá cargos na mesa diretora e nas comissões, que levam em conta votos obtidos na eleição e não pela fusão.
"É muita pretensão neutralizar o PMDB, que tem 500 anos de história e participou da democratização", exagera o deputado Guilherme Campos (PSD-SP), alçado à presidência do PSD na segunda-feira com a ida de Kassab ao Ministério das Cidades neste mês. Campos, que não foi reeleito para um novo mandato, também assumiu a articulação sobre o PL.
A oposição reage à nova sigla. Presidente do DEM, o senador José Agripino Maia (RN), vê na estratégia do PSD e do futuro PL a cooptação de parlamentares a serviço da ocupante do Palácio do Planalto. "Sobre esse partido, do jeito que estamos caminhando, ao sabor do Poder Executivo, quem sofre é a democracia brasileira", disse. Para o senador Álvaro Dias (PSDB-PR), essa movimentação sinaliza a urgência da aprovação da reforma política, com medidas como o fim das coligações partidárias para a eleição proporcional e a instituição da cláusula de desempenho para os partidos. As legendas não poderão se unir nas eleições de deputados e os partidos teriam que obter algo como 5% dos votos nacionais distribuídos em nove Estados para obter tempo de TV e recursos do fundo partidário. "Podem surgir cem partidos, mas temos que estabelecer regras rigorosas para eles", afirmou.
A decisão sobre a fusão do PSD e do PL depende exatamente dessas novas regras. Se for aprovado o fim das coligações para a eleição proporcional, haverá a fusão, senão, os dois partidos atuam em bloco. Na fusão, os novos partidos não assumem o tempo de TV dos novos integrantes e tampouco os recursos do Fundo Partidário. Para isso, é preciso passar pelo crivo das urnas a partir de 2018.
O PL anterior, liderado pelo ex-deputado Valdemar Costa Neto, condenado no processo do mensalão, se fundiu ao Prona e reapareceu como Partido da República (PR) em 2006. Na trajetória desta legenda, Guilherme Afif Domingos, patrono de Kassab na vida política e agora seu colega no ministério Dilma, concorreu à Presidência em 1989. Kassab também foi da legenda, que trocou pelo PFL/DEM antes do PSD. O novo PL prega o "Estado necessário", nem mínimo nem máximo, e o equilíbrio entre capital e trabalho.
Nem tudo é governo nesta área criativa de novos partidos. O Solidariedade, efetivado em 2013, atua na oposição e já fez seu bloco, junto ao PSB, PPS e PV. A proliferação não para por aí. Estão em fase de criação o Rede Sustentabilidade, de Marina Silva; o Muda Brasil, do próprio Valdemar Costa Neto; o Partido Novo, ligado a empresas; e o Partido da Mulher Brasileira (PMB). (Colaborou Raymundo Costa
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