• Ao rejeitar medida provisória sobre desonerações, Renan defendeu interesses próprios, mas também pôs freio nos exageros do governo
Foi um gesto "a favor do Congresso e da democracia no Brasil", declarou Renan Calheiros (PMDB-AL) nesta quinta-feira (5). O presidente do Senado procurava explicar por que rejeitou, dois dias antes, a medida provisória que o governo editou a fim de rever as regras da desoneração da folha de pagamento de empresas.
Na ocasião, o peemedebista havia afirmado que não poderia concordar com o aumento de impostos por meio daquele instrumento legal, uma iniciativa que terminava por "reduzir o papel do Congresso".
Pelo inusitado do episódio --a última recusa de uma medida provisória dera-se em 2008, e, antes disso, em 1989--, seriam necessárias boas doses de ingenuidade para comprar pelo valor de face os argumentos esgrimidos da cadeira de presidente do Senado.
Faz mais sentido supor que uma confluência de fatores levou o sempre governista Renan a contrariar os interesses do Executivo, a começar pelos desdobramentos da Operação Lava Jato, que apura o escândalo de corrupção na Petrobras.
Sabendo que a Procuradoria-Geral da República pediria, na mesma terça-feira (3), investigações mais aprofundadas sobre seu nome, o senador esperava que o Planalto manifestasse intenção de protegê-lo.
Consta, ademais, que Renan tem encontrado dificuldades para indicar ocupantes de cargos nos órgãos do governo e na Petrobras. Por fim, mas não necessariamente menos importante, Alagoas, Estado comandado por seu filho, enfrenta gravíssimos problemas financeiros e gostaria de receber auxílio federal para reorganizar sua dívida.
São escusos os motivos, mas nem por isso deve-se desconsiderar o que resulta de meritório da atitude.
O governo brasileiro há muito abusa das medidas provisórias, e nisso a gestão Dilma Rousseff (PT) não se diferencia das que a precederam. Um Congresso verdadeiramente zeloso de suas prerrogativas trataria de conter os excessos legislativos do Poder Executivo.
Bastaria, para tanto, que sempre fossem analisadas a relevância e a urgência da medida, como aliás determina a Constituição.
No caso específico da desoneração da folha de pagamento, por exemplo, restou evidente que o assunto merece maiores discussões. Agindo de afogadilho, o governo exagerou na dose tributária, situação que poderá ser repensada nos debates a respeito do projeto de lei que versa sobre o mesmo tema.
A altivez do Legislativo, de todo modo, não decorre de súbita deferência ao princípio da separação de Poderes; resulta da fraqueza do Planalto e da movimentação de políticos ardilosos. Não há virtude no avanço do Congresso, apenas o conhecido oportunismo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário