quarta-feira, 13 de maio de 2015

Ata de abril revela falhas no controle da Petrobras

Controle ainda falho na Petrobras

• Em reunião de abril, auditoria alertou estatal sobre brechas nas medidas contra desvios

Vinicius Sassine, Jailton de Carvalho – O Globo

BRASÍLIA - Representante da PwC, auditoria externa da Petrobras, advertiu na última reunião do conselho de administração, em 22 de abril - quando a estatal divulgou balanço após cinco meses de atraso - que ainda existem Gaps (falhas) no sistema de controle da empresa, mesmo com as providências adotadas após o escândalo da Operação Lava-Jato para frear a corrupção na empresa. Os auditores identificaram brechas na fiscalização interna ao analisar medidas adotadas para coibir desvios apontados antes e depois do início da fase pública da Lava-Jato. Segundo áudio da reunião, obtido pelo GLOBO, o auditor alertou que um dos problemas seria o ambiente pouco favorável a pessoas que queiram fazer denúncias sobre possíveis irregularidades:

- O que nós fizemos esse ano foi, a partir de ações que a companhia adotou nos dois ou três últimos anos, avaliar ações para ver se elas, de fato, preveniriam a ocorrência de novos fatos e (a conclusão é que) ainda existem Gaps . Algumas dessas ações não operam de maneira efetiva.

Ambiente pouco favorável a denúncias
Um conselheiro pergunta, em seguida, quais seriam as falhas. O auditor menciona o ambiente pouco favorável ao recebimento de denúncias sobre irregularidades. O conselheiro relata que teve uma experiência ruim ao tentar fazer uma denúncia contra o ex-diretor de Abastecimento Paulo Roberto Costa antes da Lava-Jato se tornar pública. Paulo Roberto é apontado como um dos chefes do esquema de fraudes em contratos de empreiteiras com a Petrobras.

- Fui à Ouvidoria fazer uma denúncia contra o Paulo Roberto. Falei com uma moça e ela disse: "pelo amor de Deus, vai embora". Nesse ritmo é difícil alguém fazer denúncia - protestou.

Um outro conselheiro pediu a demissão do ouvidor-geral da estatal, Paulo Otto. Segundo ele, o ouvidor seria ex-assessor do ex-ministro José Dirceu. O ex-ministro está entre os investigados da Lava-Jato. O Ministério Público Federal e a Polícia Federal estão analisando contratos de consultoria de Dirceu com algumas empreiteiras acusadas de pagar propina a políticos para obter ou manter contratos com a estatal.

- No final do ano passado, levei à Graça (Maria das Graças Foster, ex-presidente da Petrobras) que tinha tomado conhecimento (pela mídia) que o nosso ouvidor tinha sido assessor do ex-deputado José Dirceu, que tinha ascendência sobre alguns diretores. Os servidores da Petrobras não têm conforto em fazer uma denúncia a um ex-assessor do José Dirceu.

131 controles com "deficiência"
O representante da PwC disse que os auditores analisaram 1.219 controles-chave. Deste total, 131 apresentaram "deficiência": controles que não funcionam a contento e expõem a empresa a riscos de desvios. O auditor relatou aos conselheiros que, com base nas investigações da Lava-Jato e nas apurações internas, a auditoria identificou a interferência de executivos da empresa na manipulação de licitações.

Executivos teriam "sobrepujado" mecanismos de controle para obter resultados específicos em licitações. Se não fossem as interferências, as disputas poderiam ter sido vencidas por outras empresas, concluiu. As investigações da Lava-Jato apontam pagamentos de propina em contratos das diretorias de Abastecimento, Serviços e Internacional da Petrobras. Um conselheiro perguntou se a PwC não tinha observado problemas de controle interno em anos anteriores.

O representante da PwC evitou uma resposta direta. Disse que processos de controle são dinâmicos e mudam quando pessoas de uma área são substituídas. Sustentou que os testes da auditoria foram feitos com o mesmo rigor de análises anteriores. Procurada pelo GLOBO, a Petrobras não respondeu perguntas sobre críticas ao ouvidor e mecanismos de controle.

Atas e áudios das reuniões do conselho em 2014 revelam que o então presidente do colegiado, Guido Mantega, só recomendou o aumento do preço da gasolina e do óleo diesel após a reeleição da presidente Dilma Rousseff. A decisão do ex-ministro da Fazenda ocorreu em reunião de 4 de novembro, que era continuação do encontro de 31 de outubro. Dilma foi reeleita em segundo turno em 26 de outubro.

Em ao menos quatro reuniões antes da eleição, Mantega não atendeu aos apelos de Graça Foster, pelo fim do represamento de preços. Ela chegou a falar em "sacrifício" e em "constrangimento" à estatal. Manter preços congelados foi a forma encontrada pelo governo Dilma para segurar a inflação, o que contribuiu para o endividamento e as perdas da petroleira. Em 6 de novembro, a Petrobras divulgou comunicado sobre o reajuste - 3% para a gasolina e 5% para o diesel - que começou a vigorar no dia seguinte.

Na reunião de novembro, Mantega cita o endividamento da empresa. "Para que se obtenha melhoria dos indicadores de endividamento e alavancagem, é preciso passar um tempo com preços acima da paridade, a fim de recompor defasagens do passado", disse e recomendou o aumento à diretoria quando o considerasse conveniente, ainda em 2014. Ele orientou a diretoria a manter os preços "acima do preço de paridade no futuro para chegar a um equilíbrio financeiro melhor".

Estatal não comenta áudios e atas
Nas reuniões anteriores, em 8 de agosto e 12 de setembro, Graça fez discursos incisivos contra o represamento e disse acreditar que o reajuste viria "no teto da banda de preços" . Ela disse não "ter poder" para promover o aumento. Segundo ela, o reajuste era "condição básica para a sustentabilidade" da estatal em 2015.

O GLOBO questionou a Petrobras sobre os áudios e as atas. "Não comentaremos informações supostamente oriundas de vazamentos ilegais", respondeu. Procurada sobre o represamento de preços de combustíveis, a Secretaria de Imprensa da Presidência da República não retornou.

Nenhum comentário: