- O Globo
Os melhores economistas do Brasil na área fiscal, alguns com experiências no governo, debateram durante uma manhã inteira o problema das contas públicas do país. O resultado do encontro assusta. Eles acham que o ajuste fiscal que está sendo feito agora é apenas para atacar o problema imediato. Há outras reformas a serem feitas para garantir o equilíbrio fiscal de longo prazo.
O diretor-presidente do Insper, Marcos Lisboa, que foi chefe da assessoria econômica do Ministério da Fazenda, re uniu, na última semana, em seminário em São Paulo , os principais especialistas em contas públicas para debater a política fiscal no curto , médio e longo prazos. Eles explicaram que a proposta enviada ao Congresso é apenas para combater a crise de curtíssimo prazo, para tirar o país do déficit primário que a antiga equipe econômica deixou, de 0,59% do PIB, em 2014. Se tudo der certo, o país voltará a ter superávit este ano. Mas isso está longe de re solver todos os desequilíbrios. — É só o início. Ataca o que chamo de crise aguda, que está colocando em risco o grau de investimento. A crise crônica é mais ampla: passa pelo aumento do gasto acima da receita, pela elevação da carga tributária, ausência de medidas para avaliar a qualidade do gasto.
Tudo promove perda de produtividade e é um limitador ao crescimento — afirmou Marcos Lisboa. Somente os gastos com a Previdência, estima o economista Mansueto Almeida, vão subir 0,7 ponto percentual do PIB nos próximos quatro anos. A tendência é essa despesa continuar em alta, diz Fábio Giambiagi, porque a população está envelhecendo. Haverá cada vez mais idosos para receber benefícios, e menos jovens para financiar a conta. Samuel Pessoa considera inevitável que haja novos aumentos da carga tributária para conter o crescimento da dívida bruta e o déficit nominal. Felipe Salto explica que as receitas estão caindo quase 5% este ano, com a queda da atividade, e avalia que o governo não vai chegar à meta de superávit de 1,2% do PIB. Bernard Appy, que também trabalhou no Ministério da Fazenda, defende que a reforma tributária é o único caminho para aumentar a produtividade e impulsionar o crescimento no curto prazo.
Marcos Mendes, da USP, fez um levantamento de 251 projetos que tramitam no Congresso que afetam direta ou indiretamente a Lei de Responsabilidade Fiscal. O resultado: mais de 60% deles propõem flexibilizar gastos, principalmente com pessoal. José Roberto Afonso lembrou que o partido do governo, o PT , quando na oposição, sempre votou contra medidas de ajuste. Lisboa chama atenção para o crescimento dos orçamentos paralelos, que não estão devidamente contabilizados e deixam confusos até quem acompanha os números com atenção. — Há as transferências ao BNDES, mas também os gastos com o Fies, o FAT, o setor elétrico, o FGTS. Perdemos o controle sobre o quanto isso vai custar nos próximos anos. Quando um economista como o Mansueto Almeida fica em dúvida, a conclusão é que, se ele não sabe, ninguém sabe — afirmou. Lisboa explica que o quadro político deixou tudo muito mais difícil de corrigir.
O fato de o governo ter feito uma campanha eleitoral de negação de problemas torna o ajuste mais custoso. Primeiro, porque ele começa atrasado; segundo, porque é preciso superar a perda de credibilidade; terceiro, é necessário convencer a própria base no Congresso, que se elegeu com outro discurso. Ele avalia que as medidas emergenciais do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, combatem o problema agudo, mas podem agravar a crise fiscal crônica. — Elevar imposto sobre o crédito não é a melhor forma de fazer ajuste fiscal. Isso vai tirar competitividade, reduzir o potencial de crescimento e bater na arrecadação. Resolve um problema de curto prazo, mas agrava outro. Na atual situação, só existe uma coisa pior do que um ajuste fiscal mal feito, que é não ter ajuste nenhum. Isso levaria à perda do grau de investimento — afirmou Lisboa. A conclusão é que as medidas que estão passando com dificuldade no Congresso são um pequena parte das mudanças que terão que ser negociadas e implantadas no país. O ajuste terá que ser contínuo para se atingir o equilíbrio de longo prazo.
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