- O Estado de S. Paulo
A solenidade de devolução simbólica de R$ 157 milhões repatriados da roubalheira da Petrobrás nos remete a duas comparações entre a Lava Jato e o mensalão, marcos fantásticos de tudo o que aconteceu de mau no setor público, está acontecendo de prático nas investigações e poderá acontecer de bom nos processos de punição.
No mensalão, não houve delações premiadas nem devolução de grandes somas desviadas dos cofres públicos, como ocorre agora durante a Lava Jato, conduzida de Curitiba pelo juiz Sérgio Moro, com inestimáveis contribuições do Ministério Público e da Polícia Federal. A sensação é de que “Yes, we can”: sim, nós podemos acreditar nas instituições.
Como tudo o que é novidade – ou, pelo menos, novidade em grande escala e para a opinião pública –, a delação premiada tem sido fundamental para desvendar a roubalheira política na maior empresa brasileira, mas gera polêmica: atrai a defesa de uns, a condenação de outros. E, como quase tudo na vida, a melhor posição está no meio do caminho.
Falando não só como lulista, ministro dilmista e uma das boas referências do velho PT, mas também como advogado e professor de direito da PUC-Minas, o ministro do Desenvolvimento Agrário, Patrus Ananias, considera que a delação premiada está sendo instrumento de condenação, o que é antidemocrático: “A partir do momento em que aparece o nome citado pelo delator, ele já está condenado”, disse recentemente ao Estado.
Já o criminalista Pierpaolo Bottini, advogado de réus tanto do mensalão quanto do petrolão, se posiciona com o bom senso que tantos defendem, mas nem sempre praticam. Em conferências e entrevistas, diz que a estratégia da delação premiada pode ser relevante, mas sugere cautela e alerta que não pode ter poder de prova: “O que importa são documentos que ele traz, ou as pistas que dá para a elucidação de questões relevantes”.
Pois é. Na sua primeira sentença – contra dez acusados, inclusive o delator Paulo Roberto Costa –, o juiz Moro fez nada menos que 17 menções a laudos de peritos criminais federais. Ou seja: houve cruzamento da narrativa dos delatores com as provas e documentos que Bottini devidamente cobra.
Assim, enquanto se multiplicam os delatores da Lava Jato, cresce um antigo movimento para separar as coisas. Hoje, os peritos respondem às polícias, mas eles querem acompanhar uma tendência mundial de independência, sob um argumento bem razoável: um não pode contaminar nem induzir o serviço do outro. Ou seja: o perito não pode atuar só para comprovar a tese da polícia.
A discussão, esquentada pela Lava Jato, está sendo levada a sério no Congresso. E, além do debate sobre a autonomia dos peritos e a eficácia da delação premiada, há um foco importantíssimo sobre a repatriação de recursos pilhados de estatais e do setor público – quer dizer, do meu, do seu, do nosso bolso.
A PF reclama que o MP precipitou-se no processo do mensalão, sem esperar que a polícia concluísse seu trabalho, e por isso nenhum dos banqueiros, publicitários e políticos condenados devolveu nada ao povo brasileiro. Pagaram as multas, ponto. Desta vez, além dos R$ 157 milhões já disponíveis, mais R$ 300 milhões estão sendo repatriados e outros R$ 500 milhões dependem de decisão judicial, mas devem ser liberados também.
Então, vamos ser otimistas. Os mandachuvas estão indo para a cadeia, os envolvidos tremem e fazem preciosas delações, provas bem colhidas corroboram as narrativas e parte do dinheiro começa a retornar para onde nunca deveria ter saído. Ainda é uma parte pequena, mas será cada vez maior. Os bandidos de colarinho branco que ponham as barbas de molho.
Teatro. Em dia de sabatina de Luiz Fachin em Brasília (ele, aliás, se saiu bem), quem roubou a cena foi a doleira Nelma Kodama, em Curitiba: “Brasil é movido pela corrupção”.
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