Valor Econômico
• Hoje empresários dão apoio às medidas de Levy
Um acordo instável no Senado, a bem-sucedida pressão sobre o Tribunal de Contas da União (TCU) para adiar a votação das contas do governo de 2014, a provável recondução de Rodrigo Janot à Procuradoria-Geral da República e a esperança de remover o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) da presidência da Câmara deram oxigênio à presidente Dilma Rousseff.
Experientes parlamentares contaram e recontaram os votos contrários a um eventual processo de "impeachment" da presidente e estão certos de que há mais de 200 votos em defesa do seu mandato. Somados aqui e subtraídos ali, é forte a convicção desses parlamentares de que o risco de impedimento está, por ora, sepultado.
Falta, para compor o quadro de sobrevida do governo, uma manifestação de apoio do setor privado ao ministro da Fazenda, Joaquim Levy, que virá hoje de um encontro na Câmara de Comércio Americana (Amcham). Organizada para dar suporte às principais medidas que Levy negociou com o PMDB do Senado, a reunião pretende ser um primeiro passo para persuadir o Congresso a votar as propostas. São elas: as reformas do ICMS e PIS/Cofins, a reoneração da folha de pagamentos das empresas preservando o setor exportador, a repatriação de capitais.
Há uma outra, que não consta do pacote mas é de extremo interesse do setor privado: a flexibilização do mercado de trabalho.
Por iniciativa do movimento sindical, um anteprojeto de lei foi enviado em setembro de 2011 para a Casa Civil, onde permanece engavetado. Pelo anteprojeto, o Acordo Coletivo de Trabalho com Propósito Específico (ACE) regulamentaria a criação de Comitês Sindicais de Empresa (CSE) - as antigas comissões de fábrica - nos locais de trabalho, dando segurança jurídica às negociações dos comitês diretamente com a direção das fábricas. O acordo não poderia, porém, cortar direitos trabalhistas como férias e 13º salário.
A expectativa é que, agora, o ex-presidente Lula ajude na discussão da flexibilização - que daria ao negociado nas fábricas a primazia sobre o legislado na CLT - junto aos sindicatos e ao Congresso.
Essas são as hipóteses sobre as quais se constrói a tese de que Dilma seguirá no comando do governo até 2018. E, conforme o raio de apoio político a seu governo, seria possível até consolidar a reforma da previdência social, com a instituição de idade mínima para a aposentadoria.
Se uma das hipóteses falhar, a equação não fecha. E há muitos "ses". Por exemplo, a aproximação do Palácio do Planalto com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), pressupõe que os dias de Cunha à frente da Câmara estão contatos e que não há motivos para Renan se preocupar com as investigações da Operação Lava-Jato.
Para confirmar a primeira presunção, falta comprovação de que o presidente da Câmara recebeu R$ 5 bilhões da Toyo Setal, no âmbito do "petrolão", conforme declarou o ex-consultor da empresa Júlio Camargo. Quanto a Renan, é cedo para o governo lhe conferir atestado de bons antecedentes.
O Executivo considera, também, que terá a ajuda do senador José Sarney (PMDB-AM), no pressuposto de que sua filha, Roseana, ficará de fora da lista de Janot.
A tese ainda conta com a expectativa de que as manifestações de protesto no dia 16, domingo, serão moderadas, com participação aquém da primeira grande mobilização deste ano, em março, que juntou cerca de 1 milhão de pessoas na avenida Paulista. Se essa perspectiva não se confirmar e a manifestação for devastadora, as coisas podem mudar.
Há muitas incertezas no meio do caminho. Ontem, o mercado se surpreendeu com o voto do ministro Gilmar Mendes pelo prosseguimento da ação do PSDB, no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), com pedido de cassação de Dilma e do vice-presidente, Michel Temer. Com dois votos contra um pelo arquivamento da ação, o julgamento foi interrompido diante do pedido de vistas do ministro Luiz Fux.
"Não podemos permitir que o país se transforme em um sindicato de ladrões", disse Mendes, sobre a possibilidade de os desvios de dinheiro da Petrobras terem financiado a campanha pela reeleição.
O apoio dos empresários, que são também financiadores das campanhas eleitorais, pode ser de grande valia para dissipar os primeiros sinais de desconfiança que começam a surgir junto a parlamentares da base aliada de que Levy - que conduz o ajuste fiscal - não seria o nome mais adequado para comandar o projeto de retomada do crescimento econômico.
Enquanto Levy tenta, por todos os meios, consolidar um programa mínimo de ajuste para este e para os próximos anos e trabalha em várias frentes, os deputados e senadores querem que o governo vire o disco da austeridade nas contas públicas e passe a vender esperanças e sonhos para que eles possam embalar as eleições de 2016. Demandam a agenda "pós ajuste" sem que o ajuste propriamente dito tenha sido feito.
Todos os elementos para formar a percepção de que Dilma ganhou fôlego foram construídos no último fim de semana, mediante atuação de Temer e do senador Romero Jucá, já munidos da contagem de votos que afastaria, pelo menos por enquanto, a possibilidade do "impeachment" de Dilma.
A partir do acordo com o Senado, "melhorou muito a chance do ministro da Fazenda arrancar a aprovação de três ou quatro medidas que podem funcionar", avalia uma fonte do setor privado. Afastado, ainda que temporariamente, o risco de impedimento da presidente, os empresários se sentiram mais à vontade para organizar, fora das entidades patronais, uma manifestação de apoio, hoje, às medidas propostas por Levy.
"O acordão dá alguma esperança, mas o desemprego que já está aí é só um aperitivo para o que virá", disse um dos organizadores do evento na Amcham, dando a dimensão da crise econômica em curso.
O eventual enfraquecimento de Eduardo Cunha seria um alento para o Palácio do Planalto assumir o protagonismo do governo. Mas, como disse um experimentado político, "isso pode ser apenas um sonho!"
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