O rebaixamento da nota de crédito do Brasil pela empresa de rating Standard & Poor's era uma questão de tempo - e um precioso tempo foi desperdiçado pela indecisão do governo em relação ao ajuste fiscal. Agora, não há mais como tergiversar a questão. A Moody's colocou o país em perspectiva negativa e, de novo, se nada for feito, o Brasil terá "downgrade" duplo e perderá grande parte dos recursos de investidores institucionais, que são obrigados a se guiar pelas avaliação pelas empresas de classificação de risco. Não só investimentos deixam de vir. O cenário macroeconômico, pelos movimentos dos mercados financeiros ontem, se deteriorou significativamente, com juros futuros e dólar em alta, inflação caminhando de volta para o teto da meta em 2016 e mais recessão.
O comunicado da S&P menciona duas fraquezas básicas já apontadas por grande parte dos analistas brasileiros. A primeira é a "redução na convicção quanto à política fiscal no gabinete da presidente". Depois, os efeitos da Lava-Jato prejudicaram as "dinâmicas de coesão e coalizão de curto prazo". Dessa forma, mesmo com um meta fiscal mais frouxa, o "enfraquecimento das dinâmicas de coalizão entre o PT e o PMDB representa um fraco prenúncio de aprovação de medidas".
Assim, o governo não conseguirá evitar estragos maiores aos já feitos à economia sem definir um rumo claro, ter uma equipe coesa e determinada a perseguí-lo e persistente em sua execução. Da mesma forma, papel primordial caberá ao Congresso, em cujas mãos também está a responsabilidade por apontar soluções para a crise e respaldar, no que considerar justo, as medidas que o Executivo enviar para sua apreciação.
No primeiro ponto, a entrevista da presidente Dilma Rousseff ao Valor, na edição de ontem, a questão parece encaminhada. A presidente disse claramente que é importante cumprir a meta de superávit de 0,7% do PIB, que o ministro da Fazenda conta com seu apoio para tanto e que a forma de fazê-lo conterá um esforço adicional de corte de despesas, inclusive obrigatórias, e outro do lado das receitas, com aumento de impostos.
Com o aprofundamento da recessão, e a perspectiva de sua continuidade por tempo prolongado, é igualmente imprescindível que o Congresso dê os meios ao Executivo para retirar o país da crise que provocou. Pautas-bomba na Câmara, desorientação da coordenação política do governo e irresponsabilidade da oposição, que votou projetos prejudiciais à nação contra seus princípios é uma combinação perfeita para o desastre. É possível mudar essa situação com sinceras e amplas negociações.
As lideranças das duas Casas, sob controle do PMDB, têm relutado, refletindo sentimentos de seus pares, a assumir a cota do sacrifício que um aumento de impostos, a esta altura inevitável, trará. A legenda e os partidos que eram aliados ao governo, querem, e com toda razão, que o governo indique antes os cortes que pretende fazer, mostre um esforço genuíno nessa rota, para depois examinar a elevação de tributos.
O ministro Joaquim Levy sugeriu ontem a necessidade de uma "ponte fiscal" para a travessia de volta do crescimento, e os partidos deveriam, em negociações claras, se o programa de ajuste for razoável, construir com o Executivo uma "ponte" de governabilidade. Não se trata de abonar os erros do governo e do PT nem de, com isso, supostamente garantir a competitividade do partido no poder nas próximas eleições. A esta altura parece certo que a presidente passará os quatro anos de seu último mandato consertando os desacertos do primeiro - e é importante para o país que consiga.
Há tempos muito difíceis pela frente e o Congresso precisa estar à altura dos desafios. É necessário que ele negocie e busque consensos em uma situação de emergência. É urgente restaurar o equilíbrio das contas públicas, com cortes profundos nos gastos. Se o aumento de impostos é um mal inevitável, devem vir na menor dose possível. Além disso, o governo acena com reformas de mais fôlego, como a do ICMS, simplificação do PIS-Cofins e nas regras de aposentadoria que merecem apoio. As linhas gerais do programa oficial de ajuste não são estranhas à oposição. Boa parte das medidas seria tomada por um governo do PSDB, se tivesse vencido as eleições.
Dar uma chance ao governo de realizar um ajuste razoável, significa abreviar a recessão e os grandes sacrifícios que ela traz. A responsabilidade por sua execução, e sucesso ou fracasso, são inteiramente do Executivo.
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