Mais um desastre foi adicionado à coleção da presidente Dilma Rousseff, com o rebaixamento dos títulos brasileiros à condição de “junk bonds”, isto é, papéis lixo, pela Standard &Poor’s (S&P). Essa foi a primeira agência de classificação de risco a elevar o Brasil ao grau de investimento, em 2008. Agora é a primeira a rebaixá-lo. Se mais uma reduzir o País ao grau especulativo, muitos fundos estrangeiros ficarão proibidos de aplicar dinheiro em títulos da dívida brasileira. Mas consequências bem ruins virão antes disso, como já prenunciou o novo salto da cotação do dólar ontem. Como era previsível, o cenário de mais esse fracasso petista foi abrilhantado por um notável comentário do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O corte da nota brasileira nada significa, disse ele em Buenos Aires, onde participava do – quem diria? – Terceiro Congresso Internacional de Responsabilidade.
Vale a pena citar a nova declaração de Lula especialmente porque em 2008 ele celebrou, no Nordeste, o ingresso do Brasil na faixa dos países considerados confiáveis. “O Brasil foi declarado um país sério”, disse ele. “O povo brasileiro”, acrescentou, “esperou por este momento anos e anos.” Lula também comparou o novo status do Brasil ao de um chefe de família responsável, em contraste com quem desperdiça o dinheiro em jogo e cachaça. A julgar por essa imagem, a atração da cachaça e do jogo acabou prevalecendo e o governo está de novo na gandaia.
A seriedade durou quase nada. A política anticrise iniciada em 2008 e mantida de forma justificável em 2009 alongou-se, virou gastança e degenerou num festival de favores, de estímulo irresponsável ao consumo e de endividamento, num ambiente de tolerância à inflação e de maquiagem de contas e de preços. A orgia de corrupção desvendada pela Operação Lava Jato e os desmandos na gestão da Petrobrás e de outras estatais completaram a catástrofe.
A presidente Dilma Rousseff teria de enfrentar no segundo mandato as consequências dos erros cometidos no primeiro – inflação bem acima dos padrões internacionais, recessão, indústria emperrada, contas públicas em frangalhos, déficit público muito maior que a média encontrada nos países europeus e dívida avançando velozmente para 70% do PIB. Oito meses depois da posse a presidente enviou ao Congresso um projeto de Orçamento com R$ 30,5 bilhões de déficit, um retrato da incompetência, da bagunça e da fraqueza política e gerencial de Dilma Rousseff.
A explicação da S&P para a decisão de cortar a nota brasileira resume esses fatos. O relatório distribuído pela agência menciona as dificuldades políticas do governo, a proposta orçamentária com nova mudança do resultado fiscal (seis semanas depois da última alteração da meta) e o risco de novo rebaixamento. Há uma chance em três, segundo o documento, de um novo rebaixamento em consequência de uma nova piora da posição fiscal e das condições políticas. As pressões internas no gabinete presidencial são citadas entre os fatores de incerteza.
Enquanto a S&P divulgava a reclassificação do Brasil, a presidente dava entrevista ao jornal Valor (ver editorial abaixo) e prometia medidas para garantir em 2016 um superávit primário equivalente a 0,7% do PIB, necessário ao pagamento de pelo menos uma pequena parcela dos juros da dívida pública. Dois dias antes, na Europa, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, havia lembrado, em contato com a imprensa, o risco de rebaixamento e da nota e as consequências disso para a retomada do crescimento econômico. Em Brasília, a presidente e seus auxiliares próximos, incluído o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, pareciam haver esquecido ou menosprezado esse perigo. Foram lembrados disso, da maneira mais penosa, ao anoitecer de quarta-feira.
Mesmo sem rebaixamento por outras agências, o estrago é considerável e impõe à presidente dois desafios bem maiores que o de elaborar um programa de ajuste. O primeiro é o desafio de entender o tamanho da crise. O segundo é o de assumir de fato o governo.
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