domingo, 20 de setembro de 2015

João Cabral de Melo Neto - A Carlos Pena Filho

(Nos vinte anos de sua morte)

Todos os verdes que há no verde
sabia (não mais os exerce):

tinha-os da luz de Pernambuco
que se traz dentro como um pulso,

e nos pernambucanos age
como se fosse seu sotaque.

Todos os verdes desse verde
estão vivos, maduram, crescem:

do caldo-de-cana que o tempo
vai azedando e escurecendo,

aos dessas praias do Recife
que mudam segundo o arrecife,

ao verde dos sapotizeiros
que por noturno dá morcegos.

Sabia o da cana quando nasce
que é um verde lavado, de alface,

e faz-se ácido, adolescente,
e envelhece amarelamente,

no amarelo que murcha em palha
e onde, ainda núbil, se amortalha:

com medo que a dispam, se enluta
(mas a foice logo a desnuda).

De tais várzeas horizontais
de estupradas, cada ano mais,

e onde o verde joga seu jogo
de ser amarelo, azul, roxo,

Pena sabia o verde base
que dava a luz à sua frase,

incapaz de não ter leveza,
de não fazer leve e acesa.

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