• Oposição não tem estratégia para o dia seguinte
- Valor Econômico
Em conversas com tucanos mais próximos, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso recomendou que, em caso de impeachment ou renúncia da presidente Dilma Rousseff, o PSDB ajude, mas não participe de um governo do vice-presidente Michel Temer. A preocupação é preservar o projeto político e eleitoral do PSDB.
Apesar da orientação, não há decisão tomada. A oposição está tão perdida na definição de estratégias quanto estão os petistas. E quase tão dividida quanto. Há divergência, por exemplo, em relação à votação dos vetos presidenciais, especialmente à do reajuste salarial de servidores do Judiciário. Parte da bancada do Senado se opõe à derrubada, preocupada com o impacto nas contas públicas.
Levada a ferro e fogo, a orientação do ex-presidente da República para o comportamento do PSDB em eventual gestão de Temer transformaria o pós-Dilma em algo bem diferente do que foi o governo de Itamar Franco, quando todos os partidos que fizeram o impeachment, à exceção do PT, se uniram para assegurar a transição até a eleição seguinte, vencida pelo próprio FHC.
A estabilidade congressual do governo Itamar, apesar do temperamento instável do ex-presidente, deu condições políticas, entre outras coisas, para Fernando Henrique deslanchar o Plano Real.
Há no PSDB quem pense exatamente o contrário de FHC, como há os que consideram outras soluções mais adequadas que o impeachment. O grupo mais ligado ao presidente do partido, senador Aécio Neves (MG), acha que a cassação de Dilma e Temer pela Justiça Eleitoral, por irregularidades no financiamento da campanha, seria mais vantajoso.
Para esse grupo, em uma eleição antecipada Aécio seria o favorito, mas em 2018 a vez poderá ser do governador Geraldo Alckmin.
Mas essa possibilidade também preocupa tucanos experientes, porque, para recolocar a economia nos trilhos, serão necessárias medidas duras e impopulares. E é esperada uma guerra por parte do PT. O cenário com Temer na Presidência, resultante de impeachment de Dilma, causa outros receios. O PSDB vai ficar atrelado ao projeto do PMDB? O vice não seria contaminado pelo desgaste de Eduardo Cunha? O presidente da Câmara já avisou que, se morrer afogado, leva muita gente.
Só há uma certeza comum a integrantes da oposição: se Dilma cair, ninguém sabe o que fazer no dia seguinte. Não há estratégia traçada nem um grupo suprapartidário de lideranças políticas discutindo permanentemente a crise. O que se vê é gente sendo atropelada pelos fatos e batendo cabeça nas reações.
"Os acontecimentos fugiram do nosso controle. Da oposição e da situação. Não é possível controlar a Operação Lava-Jato, o dólar, os problemas na economia e uma Moody's que vem aqui para avaliar o risco de investimento no país. Um dia tem surpresa no TSE e outro, uma decisão histórica do TCU", diz o senador, empresário e ex-governador do Ceará Tasso Jereissati. "Precisamos de um plano A e B no médio prazo. Tem que haver um momento de serenidade para que os homens com responsabilidade, seja no Executivo, no Judiciário ou no Legislativo, tomem uma atitude para não deixar o barco à deriva."
De outro lado, no PT, há indisfarçável irritação de parlamentares que precisam sustentar um governo que (até eles) consideram arrogante, que acumula trapalhadas e não ouve as sugestões de aliados politicamente mais experientes.
Petistas esbravejam contra a intenção de setores do Palácio do Planalto de enfrentar o presidente da Câmara. E criticam a demora em montar uma força-tarefa para enfrentar a tentativa do impeachment. Um aliado de Dilma desabafa que o governo só sabe empurrar os problemas com a barriga e, quando age, é inábil e desastrado.
Nesse ambiente de "zorra total", segundo um petista, as medidas de ajuste fiscal estão empacadas, a "agenda Brasil" de Renan Calheiros para animar a economia não anda, ninguém fala do orçamento, e o parecer técnico do TCU pela rejeição das contas de Dilma de 2014 virou mais uma ameaça no Congresso.
Há quem diga que o ideal para todo mundo -Dilma, Cunha e Aécio-, em meio a tanta confusão, seria mesmo empurrar tudo até 2016, em que a pauta será eleitoral.
A crise levou o deputado Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE) ao Palácio do Jaburu. Ex-senador, ex-governador de Pernambuco, há dez anos discordando da cúpula partidária, Jarbas se reaproximou de Temer, presidente nacional do PMDB. Há cerca de 40 dias, reuniu-se em um jantar com Temer. Levou apoio e o aconselhou a começar a se desvencilhar do governo, se distanciar da presidente e deixar de ir a reuniões da coordenação política e a eventos com Dilma.
Jarbas aposta em duas saídas para a crise: o impeachment ou a renúncia da presidente. Ambas levariam Temer à Presidência. Para ele, o vice deveria começar a se preparar para o cargo e para montar um governo de coalizão nacional, para conduzir o país na "travessia" até 2018. E, para isso, deveria chamar o PSDB e até o "PT sadio".
Jarbas não revela o que ouviu de Temer. Mas os fatos mostram que a conversa não evoluiu. Dias depois, Jarbas foi convidado a participar do programa partidário, transmitido em cadeia nacional de rádio e TV. Estava pronto para gravar, quando viu no noticiário declaração de Temer em Moscou, garantindo que Dilma completará o mandato. Jarbas desistiu do programa. "O que é que eu ia falar na televisão depois dessa?"
Com o nome lembrado para presidir a Câmara em substituição a Cunha -a quem chama de "psicopata"-, o pernambucano defende a necessidade de as lideranças políticas conversarem mais sobre a crise e possíveis saídas. Critica a posição defendida no PSDB de ajudar eventual governo Temer sem participar da gestão. Para ele, significa "apoiar pela metade".
Os tucanos mais experientes sabem que vão sofrer pressão de todo lado, especialmente do setor produtivo, para participar de um governo Temer, num apelo pela "salvação nacional". Como a situação não está colocada e ninguém sabe que surpresas estão por vir, não precisam decidir nada agora. Cada dia com sua agonia. E as agonias não têm sido poucas, para oposição e governo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário