Para sair da crise, o governador Pezão foi visitar o colega Sartori, do Rio Grande do Sul, que parcelou salários e enfrentou greve até na área de segurança. Estado do Rio já cogita aumentar ICMS.
• Em crise, estado cogita suspender pagamento de dívida com a União e até aumentar ICMS
Waleska Borges - O Globo
Diante da aguda crise financeira que atinge o Rio, o governador Luiz Fernando Pezão admitiu ontem, um dia depois de ter suspendido todos os pagamentos aos fornecedores, que podem faltar recursos para pagar o serviço da dívida do estado com a União, estimada em R$ 8,5 bilhões anuais. Para contornar os problemas, ele já cogita medidas impopulares, como aumento de ICMS. Enquanto o governo busca uma saída para equilibrar as contas, os cortes já afetam serviços na área da saúde e educação. O pagamento da segunda metade do 13º salário dos servidores públicos ainda é dúvida, e a Secretaria de Fazenda corre atrás de cada centavo de receita para conseguir pelo menos R$ 3 bilhões que permitirão fechar as contas no azul até o final do ano.
— Pagaremos o que der, eu dependo da arrecadação — disse Pezão ontem, reconhecendo a gravidade da situação, durante encontro com o governador do Rio Grande do Sul, José Ivo Sartori, que também atravessa problema semelhante em seu estado.
Esforço para manter obra do Metrô
No encontro em que discutiram a crise em seus estados — o Rio Grande do Sul, entre outras coisas, reajustou a alíquota de ICMS —, Pezão disse que busca alternativas num cenário desfavorável, tendo como pano de fundo a crise econômica do país:
— Há um déficit que precisamos cobrir. Tenho atrasos no repasse do governo federal. Empresas informaram que iam recolher R$ 7 bilhões (dívidas de ICMS), mas não recolheram. Se eu conseguir R$ 2 bi, R$ 3 bi desses recursos, atravesso o ano tranquilamente — afirmou o governador, pela manhã, à Rádio CBN.
Sobre a possibilidade de as obras da Linha 4 do metrô serem paralisadas caso o BNDES não libere empréstimo de R$ 1,2 bilhão, conforme publicado na coluna de Ancelmo Gois, Pezão garantiu que tem sido feito um grande esforço para manter as obras dentro do cronograma.
— Estamos conversando com o Levy (ministro da Fazenda, Joaquim Levy), com a Dilma, que também tem problemas de fluxo de caixa. Os pagamentos do metrô estão todos em dia. Nenhuma fatura está atrasada — afirma, lembrando que tem defendido o aumento da capacidade de endividamento do estado junto ao governo federal. — São recursos super justos. O governo federal não aportou um centavo nas obras do metrô.
É justo que a gente tenha recursos do BNDES para tocar a obra.
Ao comentar a suspensão dos pagamentos de todos os fornecedores para não comprometer cerca de R$ 900 milhões necessários para os salários de aposentados e pensionistas no início de dezembro, Pezão assegurou que não dará calote e que retomará os repasses no dia 30.
O diretor-executivo da Associação das Empresas Prestadoras de Serviços do Rio (AEPS-RJ), José de Alencar, que representa cerca de 50 empresas com quase 20 mil funcionários, prevê um “colapso” em vários serviços:
— E se todas as empresas resolverem suspender os serviços neste fim de semana? São fornecedores de alimento para presídios, maternidades, hospitais, segurança e vigilância, coleta de lixo, entre outras. O que farão o Ministério Público do Trabalho, a Justiça do Trabalho e a Auditoria Fiscal do Trabalho nessa situação? Estamos às vésperas do 13º salário.
Além dos serviços já comprometidos e outros que poderão ser afetados, a questão do pagamento do serviço da dívida da União será, na visão de Pezão, o próximo desafio para o estado. De acordo com ele, a negociação foi feita num outro cenário de inflação no país. Nos bastidores, comenta-se que o governador vem tentando negociar junto à União o pagamento de apenas a metade do valor total.
— Se a atividade econômica não melhorar, é uma das questões que vão bater à nossa porta — observou Pezão, acrescentando ser urgente um debate sobre um pacto federativo envolvendo todos os estados com dificuldades de caixa.
Pezão chamou atenção para o fato de as despesas no Rio crescerem entre 8% e 9% ao ano, sem que as receitas acompanhem a alta. A previsão de receita para o estado este ano era de R$ 82 bilhões. Mas, até o mês passado, estava em R$ 49,7 bilhões — o equivalente a 60% do esperado. O resultado é consequência da redução de ICMS, de cerca de 9%, e de arrecadação dos royalties do petróleo, cuja previsão de recuo até dezembro é de 37%.
Dívida será quitada, diz governo
O secretário estadual de Fazenda, Julio Bueno, defende o aumento do ICMS, mas Pezão se mantém reticente.
— Ele (o secretário) pede isso desde o início do governo, mas até agora ainda não me convenceu — afirmou, ressaltando que, antes, é preciso melhorar os mecanismos de cobrança vigentes.
Pezão definiu a visita ao Sul como uma discussão das “angústias que os estados têm passado”. O Rio Grande do Sul também já suspendeu pagamento de fornecedores, parcelou salários de serviços e atrasou o pagamento da dívida com a União — o que gerou um bloqueio nas contas estaduais. Desde que teve início o revés financeiro, uma crise se instalou na saúde, e o estado teve que lidar com greve de professores e até na segurança pública.
Segundo o secretário estadual de Fazenda, Julio Bueno, foi adiado para o final do mês o pagamento de R$ 88 milhões a 7.600 fornecedores. Mas assegurou que a dívida será quitada:
— O problema é que fomos atropelados por uma crise que tem a imprevisibilidade como uma das principais e mais perversas características.
Bueno disse também que os salários dos servidores ativos e inativos do estado estão rigorosamente em dia.
— O Rio de Janeiro não é uma ilha e tem sido severamente afetado pela forte desaceleração da economia brasileira. O forte peso do petróleo na economia do Rio agravou esses efeitos, já que houve uma queda significativa nos preços do barril, além da crise do setor de óleo e gás. A arrecadação no estado caiu 16%, em termos reais, só em outubro. Os servidores são nossos principais fornecedores, e o pagamento dos salários é prioridade absoluta do governador — avaliou.
Para o professor Istvan Kasznar, da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da FGV, o governador Pezão deve adotar medidas impopulares para enfrentar a crise.
— Ele deve tentar arrecadar mais, intensificando a fiscalização, e apoiar o Joaquim Levy na aprovação da CPMF. O governador está sentindo o mesmo que o contribuinte, com seu orçamento em petição de miséria. O que importa não é o primeiro ano da grande recessão, e sim a sequência das recessões dos anos que vêm.
Colaborou Luiz Gustavo Schmitt Arthur Viana
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