Por Camilla Veras Mota e Robson Sales - Valor Econômico
SÃO PAULO e RIO - Os números mais negativos do mercado de trabalho relativos à ocupação que há meses se repetem nas seis principais regiões metropolitanas, acompanhadas pela Pesquisa Mensal de Emprego (PME), começam a se espalhar para o restante do país. O volume de postos de trabalho contabilizados pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, que abrange cerca de 3,5 mil municípios, registrou no trimestre encerrado em setembro a primeira variação negativa da série, que começa em 2012, e encolheu 0,2% sobre o igual período de 2014. Com 179 mil vagas a menos, o total de empregados caiu a 92,1 milhões.
A retração aconteceu a despeito do avanço expressivo do emprego por conta própria, destaca o economista da LCA Consultores Bruno Campos, de 3,5% em relação ao mesmo trimestre do ano passado. Outras modalidades também precárias do emprego, às quais os trabalhadores costumam recorrer em momentos de desaceleração da economia para garantir algum nível de renda, também cresceram - o emprego doméstico, por exemplo, subiu 0,6% em relação a julho-setembro de 2014.
O avanço, contudo, não compensou a perda de 1,2 milhão de vagas com carteira assinada, um corte de 3,4% no estoque. A terceira queda consecutiva no indicador reduziu o espaço do emprego formal de 39,7% para 38,5% do total da ocupação de um ano para outro. "E a tendência é que ele continue perdendo participação", pondera o economista, ressaltando que o ajuste pelo qual passa o mercado de trabalho deve se estender ao longo de todo o próximo ano.
Para o coordenador da pesquisa, Cimar Azeredo, os dados reforçam uma tendência de mudança na estrutura do mercado de trabalho. O escasseamento dos postos com carteira induz o aumento do contingente de trabalhadores por conta própria, ele diz, e empurra trabalhadores inativos de volta ao mercado na tentativa de recompor parte da renda familiar perdida.
Ao contrário da PME, que deve ser substituída como indicador oficial de emprego pela Pnad Contínua a partir do próximo ano, o levantamento segue mostrando uma procura por vagas bem mais intensa do que nas seis regiões metropolitanas. No trimestre até setembro, a força de trabalho avançou 2,1% em relação ao mesmo período de 2014 e acumula alta de 1,9% no ano - mais que o dobro do apurado pela PME, 0,8% até setembro. Assim, mesmo com a contração menor do total de vagas, o desemprego da Pnad Contínua aumentou 2,1 pontos percentuais sobre igual intervalo de 2014 e chegou a 8,9% em setembro, atingindo 8,9 milhões de pessoas.
A taxa continua avançando mais entre os mais novos, destaca Thaís Zara, economista-chefe da Rosenberg Associados. Nas faixas de 14 a 17 anos e de 18 a 24 anos, ela subiu de 21% para 26,5% e de 15,3% para 19,7%, nessa ordem, de um ano para outro. E a tendência, ela afirma, é que a procura por trabalho avance ainda mais entre esses grupos, diante da redução dos subsídios à educação superior, relacionada à menor disponibilidade de crédito pelo Fies, e da desaceleração da renda familiar, que pressiona aqueles que antes se dedicavam apenas à qualificação a contribuir com as contas de casa. Nesse sentido, a alta do desemprego entre aqueles de 25 a 39 anos - de 6,4% para 8,6%, na mesma comparação - é considerada preocupante, já que inclui a maior parte dos chefes de família.
Tanto a Rosenberg quanto a equipe do Fator chamam atenção para o comportamento menos negativo da renda na Pnad Contínua. Para eles, ela pode ajudar a explicar a resistência da inflação, em especial a de serviços, que se mantém alta a despeito do aprofundamento da recessão.
No trimestre encerrado em setembro, o rendimento médio, que chegou a R$ 1.889, e a massa salarial caíram 0,1% sobre o mesmo período do ano passado, contra uma retração de 7% na renda e de 10,3% na massa apurada pela PME em setembro, na mesma comparação. A renda real de todos os trabalhos oscila bastante desde o início da série da Pnad. Só nos três trimestres anteriores ao encerrado em setembro, a variável subiu 1% (outubro-dezembro), manteve-se estável (janeiro-março) e cresceu 1,4% (abril a junho).
A tendência, contudo, é de aprofundamento da queda, com posterior efeito sobre os preços. "Como a ocupação está caindo mais rápido entre os empregos com carteira assinada, a deterioração do mercado de trabalho prossegue e sugere efeito claro sobre a inflação adiante", avalia o Fator em relatório.
Campos, da LCA, acrescenta que a contaminação das expectativas, o nível alto de indexação e a alta expressiva dos preços administrados também têm tido papel importante na resistência dos índices. Sua expectativa, entretanto, é de continuidade do ciclo de deterioração do mercado de trabalho observado desde o início deste ano - processo que levaria o desemprego da Pnad Contínua a 8,6% neste ano, contra 6,8% em 2014, e a 11,4% no próximo ano. A Rosenberg tem estimativa semelhante para 2015 e é um pouco mais otimista para o próximo ano, com taxa média de 10%.
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