• Bumlai fez carreira com o ex-rei da soja e é visto como supersticioso
Bela Megale, Mario Cesar Carvalho e Ricardo Mendonça
SÃO PAULO - É o próprio José Carlos Bumlai, 71, que costuma contar como foi sua aproximação com o PT. O episódio-chave foi em 1998, quando um desconhecido Zeca do PT foi eleito para comandar o Mato Grosso do Sul, na primeira geração de governadores petistas.
Sem experiência e sem poder contar muito com ajuda federal, já que o tucano Fernando Henrique acabara de ser reeleito presidente, Zeca procurou o engenheiro que fazia uma bem-sucedida carreira na Constran do "visionário" Olacyr de Moraes (1931-2015), também conhecido na época como "o rei da soja".
Bumlai foi prestativo. Na frente de Zeca, ligou para o mais improvável colaborador do PT, o economista ultraliberal Roberto Campos (1917-2001, parente de sua mulher morta precocemente), e pediu apoio para conseguir recursos junto ao Banco Interamericano de Desenvolvimento.
Apesar do estranhamento inicial do petista, Bumlai conseguiu viabilizar uma viagem de Zeca e Campos a Washington, investida que resultaria na liberação de US$ 250 milhões para projetos do Estado.
Na volta dos EUA, o governador teve que explicar a inusitada pareceria com Campos num congresso da sigla. Pendengas ideológicas à parte, o fato é que a encomenda feita a Bumlai havia sido entregue.
Quatro anos depois, Zeca do PT intermediaria a aproximação de Bumlai com Lula, que naquele ano disputava a Presidência pela quarta vez.
A empatia foi imediata. Lula gravou um programa numa fazenda do pecuarista em Rio Brilhante (MS) e o transformou em conselheiro/interlocutor para assuntos relacionados ao agronegócio.
Sete anos depois, numa entrevista à revista "Istoé Dinheiro", Bumlai definiu esse primeiro encontro como "um marco histórico". Disse que o petista passou quatro dias em sua fazenda e o comparou a Getúlio Vargas e JK. "Ficávamos conversando até as três, quatro da manhã [sobre como fomentar a agricultura]."
A ligação ficou mais evidente após a vitória de Lula. No início do governo, Bumlai foi um dos escolhidos para integrar, com sindicalistas, ativistas e outros empresários, o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social. Envolveu-se com grupos de trabalho de bioenergia, pecuária, infraestrutura, reforma tributária e previdenciária.
Bumlai parecia ter algo mais que os outros 91 membros do Conselhão. Ainda no primeiro semestre de 2003 ele financiou, com o empresário José Alberto de Camargo (CBMM), a instalação da hoje esquecida ONG Apoio Fome Zero, que tinha a primeira-dama Marisa Letícia como presidente de honra e disparava cartas a empresários pedindo doações proporcionais ao faturamento de suas empresas.
Desde então, sua proximidade com Lula foi alardeada em variadas situações. Ora como fornecedor de churrasco para o arraial de São João que o petista promovia na Granja do Torto; ora como primo do empresário que cedeu ou alugou um escritório para montagem de uma firma por parte de filhos de Lula, Glaucos Costamarques.
Entre os amigos, Bumlai é visto como alguém muito religioso e supersticioso. Devoto de Santo Antônio, é do tipo que faz novena, vai à missa todos os dias e carrega uma imagem de Nossa Senhora na lapela –presente do ex-governador do Mato Grosso Blairo Maggi. Também tem mania com o número 9, presente na placa de seu carro, no prefixo do avião, no celular.
Eclético na vida profissional, foi sócio de figuras como o narrador Galvão Bueno, o deputado Beto Mansur (PRB-SP), o ex-piloto de Fórmula 1 Emerson Fittipaldi e o piloto Hélio Castro Neves, este último na primeira franquia do Burger King em São Paulo.
A Lava Jato não é o primeiro caso em que ele ou firma de seu grupo aparece sob suspeita. Em 2010, funcionários de sua Usina São Fernando e de uma empresa de segurança foram apontados pela Funai e pelo MPF (Ministério Público Federal) como responsáveis pelo ataque um acampamento indígena guarani-kaiowá em Dourados (MS).
Barracos foram incendiados e um indígena de 62 anos foi ferido à bala. Os citados negaram envolvimento.
No ano seguinte, um inquérito mirou na desapropriação de outra fazenda de seu grupo no Estado, a São Gabriel. Entregue ao Incra por R$ 21 milhões (2005), era avaliada em R$ 14 milhões em perícia.
Em seguida, Bumlai foi acusado de atuar como distribuidor de propina pelo delator de um esquema de corrupção na Prefeitura de Campinas. Grampeado, um dos investigados do caso disse que o pecuarista estudava virar delator para "proteger Lula".
O Ministério Público paulista chegou a pedir a prisão de Bumlai na época, mas o juiz do caso rejeitou sob o argumento de falta de elementos mais consistentes.
Nesta terça (24), quando a notícia de sua prisão e embarque para Curitiba começou a circular na sede da Polícia Federal, um dos presos da Lava Jato voltou a especular sobre uma possível delação de Bumlai. "Ele é tão medroso que pode começar a delatar ainda no avião", disse.
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