Por Cristiane Agostine – Valor Econômico
SÃO PAULO - Sem perspectiva de barrar o impeachment no Senado, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva aconselhou ontem o comando do PT a partir para o ataque contra o vice-presidente Michel Temer e apostar em uma estratégia para deslegitimar um provável governo do PMDB. A ideia é impedir a aprovação de medidas propostas pela futura gestão pemedebista para inviabilizá-la, de forma a ajudar a um eventual retorno da presidente ao cargo.
Em reunião com o diretório nacional do PT, em São Paulo, o ex-presidente orientou também o partido a não defender a antecipação da eleição presidencial para este ano e disse que a iniciativa da proposta deve ficar a cargo da presidente Dilma Rousseff.
Na avaliação de Lula, reforçada por petistas e lideranças de movimentos sociais, é "quase impossível" o governo impedir a aprovação da admissibilidade do impeachment da presidente Dilma Rousseff pelo Senado. Com isso, a presidente terá que se afastar do cargo por até 180 dias. Depois de deixar o Presidência, "dificilmente" Dilma voltaria ao cargo, afirmou Lula a petistas, segundo relatos de dirigentes do partido.
O retorno, segundo lideranças do PT, só se viabilizaria diante do desgaste e da impopularidade da gestão Temer. Um dia antes da reunião com o diretório nacional do PT, em São Paulo, Lula fez avaliação semelhante a lideranças de movimentos sociais e sindicais em seu instituto, na capital paulista, e pediu ânimo à militância para continuar nas ruas contra o PMDB.
Em sintonia com Lula, o presidente nacional do PT, Rui Falcão, disse que o governo Temer será ilegítimo e não terá paz, estabilidade nem tranquilidade. Além disso, afirmou que o partido fará a " deslegitimação permanente" da gestão pemedebista. "O PT não vai permitir, se depender de nós e do conjunto dos movimentos, que ele [Temer] ponha em prática seu programa. Não podemos permitir que depois de anos de avanço venha um cara sem voto, traidor, retirar direitos que foram conquistados com muita luta nesse país. Não vamos permitir", disse Falcão, depois de reunir-se com o ex-presidente.
"Caso essa hipótese [de derrota no Senado] venha a ocorrer, se implantar o governo antidemocrático, ilegítimo, ilegal, não será reconhecido por nós. Não haverá trégua nem estabilidade", disse o presidente do PT. "E se por acaso o golpe se consumar, vamos ter um período de transição pela frente para nos prepararmos", afirmou Falcão.
No encontro, Lula falou por mais de uma hora, apesar da voz rouca, e fez parte da plateia chorar. O petista relatou que chorou por algumas vezes durante a votação do impeachment pelos deputados. Ao seu lado no domingo, a presidente Dilma parecia "aérea e anestesiada", segundo relato de Lula a petistas. O ex-presidente falou que não tinha "digerido" tudo o que aconteceu e lembrou da ex-senadora Marina Silva (Rede), que, quando ministra de sua gestão costumava falar isso quando estava chocada com algo do governo.
O ex-presidente xingou os "traidores" que votaram pelo impeachment e articularam contra Dilma, e citou, entre outros, o ex-ministro Gilberto Kassab (PSD) e o deputado federal Paulo Maluf (PP-SP).
Um petista resumiu o clima do que foi falado no encontro: "Nós estávamos preparados para colocar os traidores em um pequeno barco, mas tivemos que pegar um transatlântico".
A reunião foi fechada à imprensa e o petista ficou cerca de quatro horas na sede do partido. Pela manhã, além de dirigentes petistas, participou o líder do MST João Paulo Rodrigues. À tarde, o líder do MTST, Guilherme Boulos.
Depois do encontro, o presidente nacional do PT seguiu orientação de Lula e afirmou que o partido não defenderá a antecipação da eleição presidencial, que resultaria na redução do mandato de Dilma. Segundo Falcão, essa decisão terá de partir da própria presidente.
Em resolução política aprovada no encontro o PT manifestou "irrestrita solidariedade" a Dilma e recomendou uma mudança ministerial imediata. Na reunião, o PT aprovou também o rompimento da aliança com o PMDB no Rio e determinou a saída de petistas dos governos do prefeito Eduardo Paes e do governador Luiz Fernando Pezão, ambos pemedebistas. O partido defendeu aliança com a deputada federal Jandira Feghali (PCdoB) ou com o deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL) para disputar a Prefeitura do Rio, descartando acordo com o deputado federal Pedro Paulo (PMDB), que votou em favor do impeachment.
Apesar do ceticismo em relação ao Senado, o ex-presidente disse que é preciso lutar até o fim. O petista pediu ânimo à militância, defendeu mais empenho do PT nas negociações com os senadores e disse que é preciso manter as ruas cheias. O próximo grande ato nacional deve ser feito no 1º de maio.
Hoje Lula se reunirá com dirigentes de partidos de esquerda e das Frentes Brasil Popular e Povo Sem Medo para discutir a estratégia de resistência e as próximas mobilizações.
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