• Dilma e Temer não querem perder, mas têm medo de ganhar
- Valor Econômico
As enquetes preliminares sobre a votação do impeachment no Senado Federal apontam a confirmação da admissibilidade do processo, por duas votações de maioria simples e, já estaria garantida, a aprovação do mérito por dois terços, 54 votos, em plenário. Contudo, o governo, mesmo ciente da débâcle, recusa-se a morrer de véspera e traçou um plano agressivo para tentar mudar a sua sina.
Nele, há lugar de destaque para dois instrumentos de tortura, travestidos de propaganda negativa contra o vice-presidente Michel Temer, sucessor natural se a presidente Dilma Rousseff vier a sofrer o impeachment.
A borduna que mais preocupa as forças favoráveis ao impeachment, o staff de Temer e, sobretudo, os responsáveis por decisões na área de política externa, é a propaganda voltada para o exterior, conduzida pelo governo e elo PT, com ideias em parte já compradas pelas mídias internacionais e seus representantes no Brasil que resultam, em resumo, na seguinte versão: está havendo no Brasil um golpe de Estado; o impeachment está sendo conduzido ilegalmente, por vingança de um presidente da Câmara réu em processos de corrupção; o vice-presidente é um traidor que decidiu tomar o atalho por uma eleição indireta que de outra forma não conseguiria.
Como é retórica, desmentida pelos fatos, pelas leis e pelas decisões do Judiciário, a presidente Dilma não se dá ao trabalho de complementar as explicações e dizer por quais razões, então, não toma providências institucionais, policiais e militares contra tal golpe. Não diz que cabe ao presidente da Câmara, investido no cargo que ainda não perdeu, coordenar a admissibilidade do processo, e que a sucessão do presidente impedido de continuar é feita constitucionalmente pelo vice-presidente. Não diz, também, que, se nada disso é aceitável, por que não transfere a gestão da crise ao Supremo Tribunal Federal, que todas as vezes em que foi convidado a analisar o processo autenticou-o sem restrição.
O discurso, porém, fica crível, entre outras razões, porque é difícil para a cultura estrangeira compreender os crimes fiscais da legislação brasileira, como as pedaladas. Também não é fácil para outras culturas entender que há ainda tantos parlamentares pendurados na Justiça, ainda não condenados, que enquanto não o são seguem desempenhando sua função. Não é para estrangeiro entender, também, que no Executivo, quanto mais é denunciado, mais o ministro é puxado para perto da presidente da República.
Dilma continuará martelando essas ideias associadas ao "golpe" até que algum organismo internacional, alguns governos ou qualquer braço de fora venha em seu socorro nesse momento em que precisa sensibilizar o Senado e o Supremo, as duas instituições pelas quais ainda pode tramitar seu destino próximo. A equipe de Temer está tentando formular um programa de contrainformação, sem sucesso.
A outra borduna do governo nessa fase de tramitação do impeachment no Senado tem poder de causar grande confusão, mas no futuro governo Michel Temer.
Os apelos à regionalização da política, no final das negociações na Câmara, deram à presidente Dilma e seus assessores a ilusão momentânea de que alguns governadores aliados haviam conseguido reverter votos a favor do impeachment nas bancadas estaduais multipartidárias. Os da Bahia, Ceará e Piauí parecem ter conseguido algo, mas não fizeram diferença no resultado final. Porém, no Senado, espera a equipe de Dilma contar com outra realidade. É uma casa de ex-governadores, com uma ligação muito estreita com a política estadual, onde é mais fácil trabalhar votos a partir da política local, cujos meandros se chocariam com o governo que Michel Temer faria, tanto em equipe quanto em programa.
Querem ver? Nesse quesito o terror maior está associado ao senador José Serra, cotado para o Ministério da Fazenda do governo que substituirá o de Dilma, ou para um superministério da Infraestrutura. Serra é desagregador, relembram, será um ministro fortíssimo ainda que lhe caiba a pasta da Pesca (dá-se como exemplo um lugar que se imagina desprovido - e é - de poder e charme). Seu partido, o PSDB, decidiu não participar do governo, o que o deixaria sem votos para as medidas necessárias.
Exploram-se, ao máximo, as disputas da cena principal pelo PMDB, especialmente de Renan Calheiros, o presidente do Senado, notório adversário de Temer. Sua sina na Operação Lava-Jato não há Cristo que possa modificar, mas ele segue a vida, outra jabuticaba que deve estar intrigando as mentes estrangeiras. E manuseando uma lista de senadores, o governo identifica os que, nos Estados, são adversários do PMDB, a quem mostra que certamente não vão querer o estrondoso sucesso nacional do partido para se anularem na política local.
Temer não conseguirá dar respostas imediatas necessárias para acalmar o país e os agentes econômicos, e o PMDB dissidente, ligado à presidente, já está a anunciar que, não dando certo o governo, até setembro o Senado irá buscar Dilma de volta.
Têm certeza que não vai dar certo, especialmente pelo fato de que o PMDB é um partido desenvolvimentista, adepto do gasto e não do ajuste e não vai querer matar os prefeitos de inanição em ano eleitoral.
Por tudo isso, o PMDB teria medo de ganhar a disputa. Mas não quer perdê-la.
Dilma também não quer perdê-la, por isso luta, mas como Temer, está com medo da vitória, se der certo a nova estratégia para o Senado. Mas sabe que, pior que Temer, não tem equipe, não tem base aliada no Congresso, e o país está falido.
O ambiente social está cheio de esperança de soluções, mas o ambiente político está inquieto.
Rollemberg
O governador de Brasília, Rodrigo Rollemberg (PSB), venceu o mau humor do ministro da Justiça, Eugênio Aragão. Acertou cem porcento de seu plano de segurança para a votação do impeachment, da organização dos acampamentos dos movimentos sociais à divisão espacial dos torcedores de cada lado da disputa. Não houve mortos, nem feridos, como previa o terrorismo engendrado nos solenes arcos de Niemeyer. Foi uma festa cívica, vermelha e verde-amarela, com choro e alegria. A polícia, que perfilou-se ao longo dos espaços reservados aos manifestantes, foi aplaudida. Discreto, o governador não faturou devidamente a proeza.
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