- O Estado de S. Paulo
O Poder Executivo já esteve na situação de água de ladeira abaixo quando ficou claro que a presidente Dilma Rousseff perdia as condições objetivas para governar. Agora, o cenário é de fogo de morro acima no Congresso Nacional, onde nada parece segurar a corrida de deputados – e até de senadores – em prol do impeachment da presidente.
O resultado a ser exposto no placar eletrônico após a votação nominal marcada para o próximo domingo já não é mais de total imprevisibilidade. Muito menos de tendência favorável, conforme o governo desenhava dias atrás e a presidente, certamente por dever de ofício, continuou desenhando na entrevista de ontem em que a única ideia que apresentou para o caso de escapar do impedimento foi a proposição de um pacto nacional.
Nada do que Dilma fez até agora deu certo. Nem o abandono de qualquer pudor na negociação da partilha do Estado que um dia quis convencer as pessoas de que estaria disposta a “faxinar”, nem a abertura das portas do armazém para uso do ex-presidente Luiz Inácio da Silva.
Mais que sintomático, é um indicador da direção dos ventos o fato de o Palácio do Jaburu atrair quantidade crescente de parlamentares, enquanto a visitação aos Palácios do Planalto e da Alvorada praticamente se resume aos convidados a aplaudir os discursos de Dilma dia sim, outro também, e ao cada vez menor número de políticos engajados na organização da resistência.
Os últimos moicanos, partidos médios e governistas do PMDB que tinham jurado fidelidade eterna vêm mudando de ideia em ritmo acelerado desde a aprovação do pedido de impeachment na comissão especial da Câmara. E quando notórios interesseiros nas benesses publicadas (ou não) no Diário Oficial viram as costas a quem ainda detém a posse da caneta é sinal de que o descrédito, a desconfiança e o cheiro de chicote queimado tomou conta do ambiente.
É surpreendente que a presidente que trata a todos de maneira ríspida – mesmo e até mais agora quando senta praça na beira do abismo –, que vocifera no Palácio, que não viu problema algum na campanha eleitoral agressiva e desleal para com os adversários e os eleitores e que sempre fez questão de falar sozinha, é de cair o queixo que ainda se imagine em condições de comandar o diá- logo nacional e apresentar soluções para a crise econômica, política, social e moral.
Se fosse capaz disso – nessa incapacidade inclua-se Lula – não teria deixado as coisas chegarem ao presente ponto. Ou melhor, não teria ela construído o desacerto fenomenal que se instalou no Brasil. Ademais, a presidente propõe um pacto sem agenda. Não diz no que consistiria pelo simples motivo de que não é a reconstrução da normalidade o intento real. Trata-se, antes, de falácia semelhante àquelas ditas na campanha para se reeleger.
Agora repete o truque na tentativa de “pacificar” os que querem o impeachment, convencê-los a dar ao PT a chance que o partido tanto desperdiçou. Na campanha deu certo. Agora Dilma Rousseff conta com a desvantagem de ter suas palavras desmentidas pelos próprios gestos. Por essas e todas as outras, a proposta soa como um desejo de que a sociedade compactue com a incompetência, a corrupção como método de financiamento de sustentação no poder, a incúria e o desapreço à ética.
“Se ganhar, proponho um pacto; se perder, sou carta fora do baralho”, disse a presidente, talvez sem notar que a rainha está fora do jogo em qualquer das hipóteses.
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