- O Estado de S. Paulo
No ritmo que novas declarações a favor do impeachment de Dilma Rousseff têm sido registradas no placar atualizado pelos jornalistas do Estado, não será surpresa se a oposição superar os 380 votos no domingo. Algo como quatro dúzias de deputados além do necessário para enviar o processo da Câmara ao Senado, e - se ratificado pela maioria simples dos senadores - provocar o afastamento da presidente dentro de provavelmente um mês.
Essa margem pode aumentar ainda mais no dia da votação, caso se repita o “efeito manada” que ocorreu no impedimento de Fernando Collor, em 1992. À medida que percebem o placar se aproximando dos 342 votos fatais, deputados trocam de lado ou descem do muro - para não ficar mal com o futuro presidente e aumentar a chance de cavar uma boquinha no novo governo. É mais forte do que eles.
Contando-se que Dilma manterá a palavra e não renunciará, Temer se muda do prédio anexo para o 3.º andar do Palácio do Planalto em quatro semanas como interino. A presidente afastada permanece morando no Palácio da Alvorada, ganhando metade do salário - embora haja o risco de despejo judicial. A precariedade dos dois presidentes, do provisório e da futura ex, durará até o Senado julgar o impeachment em caráter definitivo. Pode levar 180 dias para Temer levar a mulher Marcela do Jaburu para o Alvorada.
Enquanto isso, a partir de 11 de maio, uns dias a mais ou a menos, o que sobrou do PT estará livre para voltar a ser oposição, e tentar acordar sindicatos e movimentos sociais de uma dúzia de anos de sonambulismo bolsista. Antecipando-se a esse retorno, há dias Lula trocou os bastidores pelos palanques, já em campanha para a próxima eleição, seja ela quando for.
Do outro lado, PMDB, Temer e associados sairão das sombras dos anexos para a exposição permanente na vidraça do governo. À sua frente, uma crise econômica só equivalente em tamanho a seu apetite pelo poder. Invertem-se os papéis, segue a novela.
Na Esplanada dos Ministérios, uma operação de salvatagem estará em curso. Enquanto milhares de petistas esvaziam as gavetas e desocupam cargos que lhes pareciam permanentes, outros tantos de apadrinhados pelo PP, PSD, PR e até pela banda minoritária do PMDB tentarão convencer o futuro ministro Eliseu Padilha que sempre foram temeristas, e não temerários. Seus padrinhos lutarão para manter o que já tinham, o que conseguiram nas últimas semanas, mais as sobras de quem está de saída. São 21.765 cargos de confiança federais, dos quais 5.680 para não concursados.
Não longe dali, outro resgate estará em andamento, no Tribunal Superior Eleitoral, onde Gilmar Mendes e seis ministros julgarão a cassação da chapa Dilma/Temer por financiamento ilegal na campanha eleitoral de 2014. Bastam quatro deles para abreviar o mandato do presidente interino, ou, alternativamente, salvá-lo - caso engulam a tese de que Temer se elegeu vice sozinho, sem os votos nem os reais de Dilma. Em último caso, basta um deles sentar indefinidamente sobre o processo, como já fez antes.
No Congresso, outra operação de salvação já está em curso, com Eduardo Cunha no timão. Envolve dezenas de deputados e uma penca de senadores citados, denunciados ou réus na Lava Jato - fora outras operações policiais menos rumorosas. Com Dilma na galeria de ex-presidentes, esperam que a pressão popular diminua, para que a Justiça possa voltar ao seu ritmo habitual, e eles ganhem o tão sonhado direito ao esquecimento judicial.
Assim, de salvação em salvação, o futuro governo começa a se organizar. A atrapalhá-lo, o mesmo problema que tem tudo para impedir Dilma: a economia. Quando o eleitor deixa de ser consumidor, ele se lembra da corrupção e de todas as mazelas que afligem o seu dia a dia. Ou Temer dá um jeito de melhorá-la e logo, ou vai descobrir que nem Cunha salva.
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