Michel Temer assumiu ontem um governo de transição que terá como principal missão - e o maior critério pelo qual seu desempenho será julgado - reverter os desequilíbrios econômicos herdados de sua antecessora, a presidente afastada Dilma Rousseff. É uma árdua tarefa para o pouco tempo de que dispõe, para cuja resolução conta, de largada, com alguns pontos a favor: apoio no Congresso e expectativas rebaixadas. Contra si, tem o passado do PMDB, que presidiu até há pouco, marcado pelo fisiologismo e pelo descaso com as contas públicas - agora um desafio vital a ser vencido gradativamente.
O sucesso do governo poderá ser medido pelas metas que se colocar e for capaz de executar. A agenda maximalista da "Ponte para o Futuro", que reúne algumas boas ideias, não é um guia aplicável a uma transição delicada e possivelmente não seria acolhida nem pelo próprio PMDB. Da mesma forma, o governo não tem mandato popular claro para perseguir simultaneamente várias "reformas estruturais", quase todas polêmicas. Se conseguir colocar contas públicas rumo ao equilíbrio e dar algum dinamismo a uma economia combalida, terá cumprido seu objetivo.
Temer terá de escolher poucos alvos imediatos, factíveis e inadiáveis. Em seu primeiro discurso, deixou claro que seu governo atacará primordialmente os desajustes das contas públicas, impulsionará concessões e parceiras público-privadas e dará atenção especial ao comércio exterior.
A arrumação das contas públicas deverá consumir boa parte das energias iniciais da nova equipe. Será um feito inicial se ela conseguir obter uma robusta desvinculação das receitas, já que possivelmente não há suporte político para o fim de todas as amarras orçamentárias. Em algum momento, a reforma da Previdência, necessidade quase unânime para deter a trajetória montante das despesas públicas, terá de ser encaminhada ao Congresso.
A fixação de limites para os gastos públicos, aventada pelo governo Dilma, e cogitada pelo novo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, é outro fator importante para melhorar as expectativas e abreviar o caminho da volta ao crescimento. A redução do número de ministérios para 23 é ato inaugural relevante, que mostra a intenção de austeridade a ser buscada - há poucos meses, o governo tinha 39 pastas. Temer ontem citou seu desejo de fazer redução significativa dos cargos comissionados.
O governo sinaliza com a negociação para elevar o déficit previsto para o ano, de quase US$ 100 bilhões, e não para diminui-lo. Mas terá fatalmente de apontar uma curva declinante para ele, se quiser recuperar a confiança dos investidores.
Resolver o nó fiscal leva tempo e pode trazer resultados mais imediatos para a economia se a pauta fiscal for acompanhada de um esforço sério para deslanchar concessões e privatizações - a primeira Medida Provisória de Temer, editada já ontem à tarde, cria o Programa de Parceria de Investimentos. Para executá-lo bem é preciso revigorar as agências reguladoras, eliminar indicações políticas e reforçar sua capacidade técnica, como era o objetivo quando foram criadas. Como Temer receberá de Dilma um canteiro de obras iniciadas paradas ou atrasadas, será possível iniciar o programa de melhoria da infraestrutura logo e, talvez, acelerá-lo.
Se não tropeçar no início, em breve o governo poderá reduzir os juros e encolher o enorme déficit nominal dos últimos dois anos. A promessa de Temer, feita ontem, de que chegou a hora da "democracia da eficiência" poderia servir de um bom mantra para as ações nos ministérios, em especial na educação e na saúde.
Foco e disposição política permitirão a travessia até as urnas em 2018, mas não estão dados. Tanto o núcleo político de Temer quanto as forças partidárias agraciadas com ministérios não se destacaram no passado pelo interesse em conter gastos públicos ou impulsionar um esforço modernizador da economia. Será preciso uma ruptura com o passado, sem a qual a aura da mediocridade rondará o governo interino.
No novo ministério, a área econômica foi blindada com Henrique Meirelles e o loteamento da maioria das pastas visou o apoio dos partidos no Congresso - os mesmos que estavam lá com Dilma. A âncora será a Fazenda, que terá de zelar pela austeridade em meio a um duro ajuste, e contar com o apoio ativo do presidente.
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