- O Estado de S. Paulo
O momento é difícil, os nervos à flor da pele, todos prontos para acreditar que qualquer mudança só pode ser para melhor. Por óbvio, os dados do governo de Dilma Rousseff, sobretudo desses que, provavelmente, foram seus últimos dezessete meses no poder, alimentam a esperança de que o porvir será melhor do que aquilo que não foi a lugar algum. Contudo, o momento pede cautela e ressalvas. Muitas ressalvas.
Na política econômica, há poucas dúvidas de que os pouco mais de 24 meses do provável governo Temer haverão de superar os 17 meses de desgoverno do segundo mandato de Dilma Rousseff. Os desafios são enormes. Os rombos fiscais, desconhecemos seu tamanho. Afinal, há dívidas estaduais e municipais a renegociar, injeções de capital em estatais a providenciar, recapitalizações e auditorias de bancos públicos a fazer. No entanto, há esperança de que o governo liderado por Michel Temer siga as diretrizes traçadas em A Ponte para o Futuro, documento do PMDB publicado no ano passado delineando agendas e medidas.
Mantidas as premissas elaboradas nesse documento, é de se esperar que haja ao menos um caminho para a política fiscal, além de olhar diferente sobre a necessidade de reinserir o Brasil no mundo. Não é pouca coisa depois de tantos anos de desmandos e desvarios capitaneados pela presidente-economista, que, delegar, jamais soube.
No entanto, ainda que a restauração de rumos seja motivo para alívio depois de tantos abusos cometidos contra o País e a população brasileira, o “novo” não tem cara de “novo”. O “novo” é formado por grupo de pessoas que fazem parte da política nacional há décadas. O “novo” chama novamente aos Ministérios pessoas capazes, mas que já deram a sua contribuição ao menos algumas vezes durante outros governos. O “novo” tem ranços da distribuição pegajosa de cargos que marcou os anos do lulopetismo – afinal, o “novo” foi parte integrante do lulopetismo. No “novo”, não parece haver lugar para gente com ideias novas, para a diversidade, para o mosaico que é o Brasil. Tal situação incomoda. Tal estado de coisas deixa gosto amargo depois do trauma de um afastamento presidencial que se arrasta por tanto tempo. Tal arranjo remete, inevitavelmente a Don Fabrizio, o sábio de Lampedusa: “Para que tudo permaneça igual, é preciso que tudo mude”.
Cabe ao “novo” o desafio de mostrar para a sociedade brasileira que o objetivo final não é a manutenção do status quo na política e na estrutura de nossas lideranças. Cabe ao “novo” servir de fato como a “ponte para o futuro” que almeja ser. Há esperança. Mas o risco de decepcionar quem apostou na “ponte” é grande. Grande demais.
Avante.
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